quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Abaixo o regime!

 
                                                     Por que ele pode e eu não posso?

Gente, apesar do título, juro que não vou falar em política hoje. A inspiração da minha crônica foi o jogo que eu assisti ontem à noite entre Os amigos de Zico e as Estrelas do Brasil que me despertou muita inveja. É que havia uma penca de gordos jogando. Ronaldo, que se aposentou outro dia, mal podia caminhar. O lateral Wladimir (lembram-se do Corinthians?) era outro que tinha o rosto deformado. O próprio Zico tinha muitos quilos a mais. Poucos mantinham a forma, como Djalminha, Zinho, Amoroso e o pessoal que ainda está na ativa. O resultado foi 7 X 5 pro time de Zico, com algumas jogadas brilhantes, muita gente paradona, em um jogo onde só correu mesmo a bola.
Mas aí vocês vão me perguntar: e porque eu tive inveja? É que desde 2008, quando apareceu uns trecos no coração, me obrigaram a fazer regime. Foi uma conspiração, que envolveu o cardiologista Carlos Augusto Souza, a nutricionista Mércia, ambos do Instituto Cardio Pulmonar, e, lá em casa, minha esposa Cybele e Cida. O resultado: três anos de miserabilidade total, quando tive que assumir novos hábitos e deixar de fazer a coisa que mais gosto: comer.
                                                          Ah a miserável da balança!

A receita pra emagrecer e tirar a barriga foi fogo: exercícios físicos e dieta. Os primeiros até que não são o fim do mundo. Tive que me matricular numa academia e utilizar ali tudo o que tinha direito. Aprendi a andar na esteira (e a correr), a alongar o corpo, a fazer abdominais (estão vendo como eu estou informado?), e até a levantar peso. A única coisa que me atrapalhava era o stress pois queria subir na balança todo dia para ver se estava realmente perdendo peso. Comprei até uma cadernetinha que levava comigo pra anotar o peso diário. Não aconselho isso a ninguém, o pavor na hora de subir na balança, a depressão de ter um peso maior do que no dia anterior, o escambau.
Parecia tudo muito fácil e até que não me dei mal com academia, mas aí aconteceu o pior: passei a ter dor nas costas e em todo lugar. No começo me disseram que era normal e se tratava de “dores musculares”. Acreditei piamente até que comecei a não poder dormir direito com as dores nas costas. Aí me queixei com o instrutor, com o chefe do turno e até com o dono da academia, e nada!
                                               Puxa, se é uma opção estou fora!

Saí da academia por causa das dores e por perceber que os “instrutores” que trabalham lá pouco instruem. Recebem por turno um “grande salário” e pagam aos clientes na mesma moeda, conversando aligeiradamente com eles e orientando de forma ainda mais ligeira. Até que são boa gente. Dá pra conversar sobre futebol, o sexo feminino, alguma política, e até sobre exercícios físicos. Mas, onde a coisa pega mesmo é quando se trata de observar como os pobres clientes estão fazendo os exercícios.
Por ficar fora da academia eu, que já estava feliz por ter avançado meu status de obeso para “sobre peso” acabei voltando para uma situação crítica. Ao invés de frequentar a academia passei a ir aos COTs da vida, em neurologistas, ortopedistas, e a fazer um montão de exames. Não tomei um só remédio. No entanto os médicos descobriram mais um montão de crecas. Sou um feliz proprietário de quatro bicos de papagaios e vários tipos de artroses.
                                                As vezes não dava pra dormir direito! 

Esta situação levou três meses, quando de repente, não mais do que de repente, as dores nas costas desapareceram e eu voltei às academias da vida. A diferença é que não fui mais sozinho, mas contratando o professor Luciano, um personal training, que me orienta sobre o que fazer e nunca mais voltei a ter dores.
Mas, quando comecei a fazer exercícios físicos tive que entrar também no diabo do regime. É aí que a coisa pega! Acho que adoro comer desde que nasci. Tive a sorte de viver com cozinheiras notáveis, minha saudosa mãe Helena, minha também saudosa sogra Dorinha, e a dobradinha Cybele/Cida. O regime a que fui obrigado abalou até os recônditos do meu ser (gostaram desta?).
                                                                  Ah que fome!

Mas não tinha jeito de escapar. Imaginem a miséria! De manhã uma vitamina, uma fatia de pão e uma xícara de café. E, pra vocês não pensarem que é fácil basta dizer que o pão é integral e o queijo é light. Vade retro! Como eu arranjei também a doença do refluxo passei a comer cinco vezes ao dia. Na verdade “comer” não é bem a palavra, pois na maioria das vezes é só um iogurte, OU duas (sic!) castanhas do Pará, OU uma barrinha de cereal, naturalmente light.
Mas vamos para o “almoço”. Este tem duas colheres de arroz, uma concha de feijão, uma carne magra do tamanho de metade de uma mão, e, pra consumar as torturas, um monte de verduras. Ou seja, literalmente, o fim dos fins da picada! Farofa, que como nordestino adoro, só uma vez por semana. E ainda nem se pode beber líquido às refeições. Como chorei e reclamei me deixaram beber dois dedos de suco. De noite é hora da sopa, mas não se animem não, são só duas conchas! A mesma xícara de café, embora tenha o “privilégio” de comer duas fatias de pão integral. Ficava com tanta fome que tinha que tomar agua enquanto esperava a barrinha de cereal das dez da noite!
                                                        É assim que eu ficava de noite!

Pra que eu aceitasse tal situação de penúria a nutricionista fez uma negociação comigo. Se eu seguisse rigorosamente o regime poderia ficar liberado aos fins de semana. Aí minha vida passou a se dividir em duas: o inferno, durante a semana, e o céu, aos sábados e domingos. No início tentei incorporar os feriados e as sextas á noite, mas não colou! O jeito foi a espera mesmo. Vocês imaginem como era a coisa. Eu comia(aliás nem comia) o pão que o diabo amassou, esperando, ansiando, e até sonhando com os fins de semana, onde iria desfrutar a alegria de estar vivo.
Desde que começava o sábado eu me esbaldava. De manhã tomava café ao triplo. No almoço comia três pratos e ainda saía à noite pra acabar de comer. No domingo era ainda pior indo nos melhores bufês da cidade e comendo tudo o que um cidadão decente tinha direito. A coisa funcionou durante certo tempo. Mas, nem passou três meses para que eu fosse parar numa emergência. Ficava ali umas horas, fazia exames, melhorava e era liberado. E ninguém conseguia diagnosticar o que eu tinha.

Em um ano fui parar sete vezes na emergência. Foi quando fui ao gastro Dr.Jecé Brandão. Ele foi na mosca me perguntando:
- Você prefere viver ou comer?
Aí ele me recomendou a comer mais no fim de semana mas sendo mais comedido. Disse-me que meu organismo não podia aguentar um regime durante a semana e o desmazelo total aos sábados e domingos. Aquilo bateu lá dentro e acabei seguindo (com evidente má vontade) as suas recomendações. Foi assim que sumi das emergências, reduzi de cento e seis para noventa e três quilos em dois anos e minha gordura no fígado sumiu.
                                                               Nem pesar em pizza!

Mas a rotina é uma desgraça. Confesso que quando pareci estabilizar em noventa e três comecei a me dar uma folga. Nem todo dia ia pra academia, algumas vezes caminhava perto de casa mesmo. Foi quando aprendi que caminhar pode fazer bem ao coração mas não adianta nada pra reduzir o peso. Passei a incorporar as noites das sextas ao meu fim de semana e as vezes não comprava os produtos light e integrais com a presteza necessária.
Pra encurtar a conversa voltei a ficar no limite do sobrepeso. A semana passada me peguei com 99 quilos, a última casa antes dos três dígitos. Justamente quando fiz exames de rotina...que deram de novo uma sobrecarga no coração.
                                                    Acarajé, nem passar por perto!

Não quero nem pensar o que vai acontecer agora! É voltar a este desgraçado do regime, estar cinco ou seis vezes por semana á maldita academia. O escambau! Êta vidinha, o que não se tem de fazer pra durar mais alguns anos!

sábado, 24 de dezembro de 2011

Os especialistas


Os especialistas é o novo filme de Gary McKendry com lançamento mundial há duas semanas. Quem conhece Robert de Niro sabe que ele não faz outra coisa do que filmes de ação. Nesta ele está nas mãos do inimigo Spike(Clive Owen) e cabe a sua salvação a Danny (Jason Statham), um ex-agente britânico que pensa desfrutar a sua aposentadoria.
No filme acontece de tudo e acho que muita coisa dele foi inspirada na Bahia. Todo mundo sabe que existe corrupção, suborno e malas de todo tipo no futebol, envolvendo jogadores, dirigentes e juízes. Mas quando acontece com os últimos é o que chama mais atenção. Juiz não é brincadeira nem na Bahia nem em lugar nenhum.
                                                  Tem juiz que não é brincadeira!

Só que tem uns macetes pra lidar com eles que só os macacos velhos e Gary McKendry sabem. Mas evitam a todo custo dar nome aos bois, pois poderão voltar a precisar deles. Nesta crônica vamos contar alguns casos envolvendo casos de árbitros que trabalharam na Bahia e que o filme não aproveitou.
Zago era um juiz pernambucano que pertencia ao quadro de árbitros da federação Bahiana de Futebol. Num jogo decisivo entre Vitória X Bahia circularam dois boatos, um de que havia se vendido ao rubro negro, e outro dizendo o contrário. Estabeleceu-se uma confusão só quando a coisa chegou à imprensa. Tanto foi assim que o TJD interveio, examinou o caso e eliminou o Zago.
                                                              Já acabou o jogo?

O outro caso foi o que envolveu o juiz Anivaldo Magalhães quando um torcedor do Galícia foi à sua residência oferecer-lhe quatro a cinco milhões para que ele desse o triunfo ao azulino. O árbitro, além de recusar, fez o maior escândalo, tentou agarrar o sujeito que teve que correr pra não apanhar. Mas só se soube por que ele fez a denúncia na FBF.
No livro Futebol, paixão & catimba, que traz as memórias do ex-presidente do EC Bahia Osório Vilas Boas, encontramos vários casos envolvendo os árbitros de futebol. Este, quando o clube disputou a Taça Brasil ameaçou vários deles de veto para todas as partidas em que atuasse no sentido de “coagi-los a serem honestos”.
                                Candidato estudando pra teste no quadro de árbitros da FBF!

Mas o próprio dirigente confessa que não era nenhum “santo” e fazia das suas. Conta que na excursão que o clube fez na Europa em 1957, ao chegar a Minsk na ÚRSS, procurou o juiz da partida através de uma intérprete, e lhe disse que “analisaria com muita calma e interesse a sua atuação, pois havia sido autorizado para contratar juízes estrangeiros para apitar prélios na América do Sul”. Nem precisa dizer que o juiz excedeu-se de simpatia com o time tricolor durante a partida...
No fim dos anos quarenta a Seleção baiana foi jogar em Recife pelo antigo Campeonato Brasileiro de Seleções. Durante muito tempo neste certame os pernambucanos haviam sido fregueses dos baianos. Mas, a partir de certo tempo, começaram a engrossar. Osório só assistia a partida. Ainda nem dirigia o clube nem tinha contato com os dirigentes esportivos baianos.
                                                   Sócrates sofreu na mão dos árbitros!

Mas mesmo assim conseguiu ficar no gramado junto à Polícia. O jogo foi muito conturbado. Houve um momento em que o atacante Siri, do EC Vitória, partir para agredir o juiz João Etzel, que no seu entender roubava escandalosamente para os pernambucanos. Aí a polícia do estado invadiu o campo e Osório foi no bolo, aproveitando a oportunidade pra xingar Etzel de cabo a rabo. Este porém, não se fez de rogado e afirmou:
- O segundo jogo não será lá em Salvador? Então, me aguente baiano!  
Aí o juiz mudou de lado e, segundo Osório, passou a roubar escandalosamente a favor dos baianos que foram campeões do Norte e Nordeste eliminando Pernambuco com o jogador Pequeno do Ypiranga fazendo o gol da vitória.
                                           Tem que ficar com o olho aberto Bial!

Osório conta ainda casos dos anos 60 e 70 quando o tricolor jogava fora de casa em certames nacionais. O primeiro foi em São Paulo contra o Corinthians e um juiz baiano, o Walter Gonçalves, dirigiu a partida. Mas pra Osório ele marcou um pênalti contra o clube tão absurdo que os próprios dirigentes esportivos daquele estado Mendonça Falcão, Wadih Helu e Paulo Machado de Carvalho ficaram horrorizados. Osório até hoje se pergunta por que ele agiu assim. Dinheiro? Acredita que ele se deixou pressionar pela torcida presente, que promovia uma gritaria infernal, e cedeu.
O segundo aconteceu em Porto Alegre com outro juiz baiano, o Nei Andrade. Esse viu que foi marcado contra o tricolor um gol feito com a mão mas não teve coragem de invalidar. Tanto assim que, quando acabou o jogo ele saiu correndo pra não ser linchado pelos jogadores baianos.  E à noite ainda escapuliu do hotel, com os cabides de roupa na mão, protegido pelo presidente da FBF Carlos Alberto de Andrade que lhe deu fuga.
                                                                   Virou até livro!

O terceiro foi no Ceará quando o Bahia disputava pra ver quem passava na Taça Brasil. Um locutor de rádio e também diretor do Fortaleza pressionou de cara dura o juiz baiano Alderico Conceição:
- Quantos filhos o senhor tem?
E, depois de ouvir a resposta, ameaçou:
- Marque direitinho, senão o senhor não vai mais vê-los...
Segundo Osório isso arrasou psicologicamente o juiz que prejudicou bastante o Bahia.
                                           Blatter e João Havelange juntos é demais!

Encerramos esta conversa com as máximas de Osório. Pra ele o Brasil está cheio de rivalidades regionais que se refletem nas arbitragens. Um juiz carioca, quando o jogo é entre baianos e paulistas, dificilmente deixará de ser simpático aos baianos. E, quando jogam baianos e cariocas com juiz pernambucano, a coisa fica feia para a chamada boa terra em face da rivalidade desta para com os pernambucanos.
No frigir dos ovos diz que, é o time que ganha o jogo, mas campeonato quem, ganha mesmo é a diretoria se souber “aplicar contra golpes” e olhem que não apenas em relação aos juízes. Só não conto o final do filme pra vocês verem.

·         Agradeço ao livro Futebol, paixão & catimba e ao blog Cine Pop.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Corra que a polícia vem aí!

                     
A comédia Corra que a polícia vem aí, é uma da série estrelada pelo incompetente detetive Frank Drabin(Leslie Nielsen). Esta trata da sua tentativa de interceptar um plano de assassinar a Rainha Elisabeth II (Jeanette Charles) da Inglaterra, em visita aos EUA. O mentor do plano é Vincent Ludwig(Ricardo Montalban), um magnata, que quer usar um jogador de basquete submetido a uma lavagem cerebral.
                                                      Esse Neymar não está com nada!

Logo se vê que não foi inspirado na Bahia pois aqui não há detetives incompetentes. O pessoal sabe muito bem onde as cobras se escondem, se não conseguem resolver algumas coisas é por outros motivos...A fama dos investigadores baianos ultrapassou a Polícia para se estender ao esporte. Houve até um que foi presidente do EC Bahia. Vamos falar um pouco dos métodos que levaram para o futebol.                       
No ano de 1954 os clubes baianos se reforçaram. Completava-se três anos após a entrada em funcionamento da Fonte Nova. O Bahia trouxe os atacantes Juvenal e Naninho, o goleiro Osvaldo Baliza, entre outros, contando com a ajuda de diretores como Nelson Pinheiro Chaves e Amado Bahia Monteiro elevando a sua folha de 35 para 85 contos de reis, uma fortuna para a época. O tricolor baiano começou o ano excursionando ao interior, mesmo recebendo dez a quinze contos por partida. Nas apresentações havia de tudo, inclusive recepções em prefeituras, discursos, e, também, algum futebol.
Já o Vitória, que havia no ano anterior quebrado o maior jejum de títulos da história do futebol brasileiro, contratava Gago, Vermelho, Hélio e Pinguela. Mas o Botafogo também estava quente, com sua linha de frente onde estavam Zague, Roliço e Lamarona. Nesse ano também se destacam Ypiranga, Galícia e Fluminense de Feira, sendo que seria a primeira vez que uma equipe do interior iria disputar o campeonato “baiano”.
                                                   O negócio era na base da porrada!

Mas quem pensa que o sucesso tricolor nesse ano se deve só a dinheiro engana-se. É que os métodos do investigador policial, futuro vereador, e presidente do clube Osório Vilas Boas, digamos...eram pouco ortodoxos. Com Osório não existia esse negócio de “carta branca” pra treinador. Sempre que achava necessário invadia o campo, a concentração ou até os vestiários pra dar um jeito nas coisas.
O caso do meia Mário, que no jogo contra o Galícia, abusava de fintar os adversários, foi resolvido mesmo nos vestiários durante o intervalo. É que Osório o abotoou pela camisa e o ameaçou de dar uns sopapos “se ele não jogasse como gente e insistisse em ser palhaço”. No segundo tempo o jogador jogou o que sabia e o tricolor ganhou o azulino com tranquilidade. Com o jogador Nilsinho Osório teve mesmo que chegar às vias de fato dando-lhe uns empurrões para que ele parasse de provocar os adversários.
                                                Pô, Leslie Nielsen é um medroso!

Bahia, Vitória e Botafogo ganharam cada um um turno obrigando a que houvesse um sensacional super turno para a decisão de quem levaria o caneco. Mas mesmo nessa fase o extra campo funcionou. É que, em um dos jogos contra o Botafogo, os alvirrubros haviam conseguido intimidar o jogador Nelson Curitiba, contratado no Rio de Janeiro. Pois não é que Osório desceu ao vestiário no intervalo pra resolver esse problema? No primeiro momento só fez ouvir, inclusive o disparate de que o espírito de sua mãe o aconselhara a não jogar mais. Aí mandou que todos se retirasse, e segurou o jogador pela garganta:
- Olhe aqui Nelson, você está com medo. Se você não apanhar lá no campo, vai apanhar aqui, e agora! Decida!
                          Foi assim que ele ficou quando viu os investigadores baianos atuarem!

O jogador hesitou e Osório o segurou com o braço nas costas como fazia com os ladrões na Polícia, e o empurrou pelo túnel que levava ao gramado, gritando :
- Seja homem, seja homem!
E não é que o jogador entrou correndo e acabou sendo um dos melhores jogadores em campo numa nova partida que o tricolor venceu?
                                                  Futebol naquele tempo era assim!

Mas a intervenção do presidente do clube não se limitava ao campeonato, agindo nos próprios amistosos, torneios ou excursões. Numa dessas, quando o clube jogava sua última partida do ano em Belém, notou que o zagueiro Hélio Clemente era condescendente com o ponteiro Santiago do Tuna Luso. O tricolor ganhava por dois a zero mas o cara era arisco e perigoso e dava muito trabalho também graças a essas “gentilezas” do jogador do Bahia. Aí Osório desceu no vestiário no intervalo e procurou o Hélio dizendo:
- Dê um pau naquele camarada, o Santiago, aperte ele!
Mas o presidente do clube, que achava que “futebol era pra homem”, não contava com a reação do jogador:
- Eu sou um craque, não faço esse tipo de jogo!
                                           Ah, o 007 sim. Deve ter sido inspirado na Bahia!

Osório então não caçou conversa emendando no ato:
- Tire essa camisa!
Como o jogador titubeasse, arrancou-lhe a camiseta tricolor no ato mandando, por cima do técnico, o jogador Tiago substitui-lo. Não deu outra coisa, Tiago foi lá, deu umas cotoveladas e joelhadas no tal do Santiago e este se apagou completamente em campo, em mais uma vitória tranquila do Bahia.
E assim o investigador da polícia baiana foi levando enquanto foi presidente do clube de 1954 a 1969, uma das épocas mais memoráveis do clube. Se estivesse à frente do Santos de hoje por certo este não amarelaria como fez na semana passada contra o Barça. 

·         Agradeço ao livro Futebol, paixão & catimba.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Investigação de um cidadão acima de qualquer suspeita

                                                   Lembram da Florinda Bolkan?

Lembro-me bem quando assisti em 1971 o drama político italiano Investigação de um cidadão acima de qualquer suspeita, dirigido por Elio Petri. Os protagonistas eram Gian Maria Volonté e a canastrona brasileira que adotou o horrível nome de Florinda Bolkan para fazer carreira no exterior.
A história deve estar entre os melhores filmes políticos de todos os tempos, e tem trilha sonora assinada por Enio Morricone. Gira em torno de uma mulher assassinada e que tinha entre seus amantes um jovem político de esquerda e um policial. O enredo surpreendeu a todos quando descobrimos que o próprio investigador, sobre o qual não pairava nenhuma suspeita, era o assassino.
Mas esses cidadãos, aparentemente acima do bem e do mal, como sabemos, não surgem apenas no cinema e na burocracia da máquina pública. Na nossa última postagem falamos das peripécias da primeira excursão dos clubes baianos ao exterior, comentando as aventuras da delegação do EC Bahia na Europa. Estas viagens abriram caminho para outras que viriam três anos depois.
                                      Foi num tempo em que nem tinha Amanhecer-Parte I!

A segunda grande excursão do tricolor baiano durou boa parte do ano de 1960 logo após a conquista em abril da I Taça Brasil e se deu novamente para o chamado Velho Mundo. Desta vez o empresário era português, o Zé da Gama. Mas, se não era desonesto pelo menos agia como um aventureiro.
O clube tinha outras propostas para excursionar mas acabou pegando a proposta do “Zé” que oferecia mil dólares, livres, por jogo. A autorização do CND – Conselho Nacional de Desportos, porém, não foi tranquila. O presidente do clube, Osório Vilas Boas, teve que viajar ao Rio de Janeiro e entrar em entendimentos com o órgão.  Conta ele que entrou em entendimentos com o secretário do então presidente Paula Ramos, tal de Dr. Sabá, e ele foi logo lhe dizendo:
- Meu filho, seu clube não vai viajar não!
                                               O tricolor jogou em tudo quanto foi lugar!

E foi logo lhe afirmando de que a FIFA estava agastada com os clubes brasileiros que excursionavam e não cumpriam os contratos. E ainda tinha como complicação o empresário escolhido. Zé da Gama não gozava de boa fama na entidade internacional pois ficou de organizar uma excursão do Madureira e sumiu com o adiantamento que pegara em Portugal.
Enquanto havia a conversa o próprio Zé da Gama ligou para o tal “Dr. Sabá” ouvindo a negativa. Então depois ligou para o presidente tricolor no hotel, informando-lhe que já tinham sido fechados vários jogos e a estreia seria na Rússia, e o autorizou a oferecer ao presidente do CND uma passagem de ida e volta para um representante do órgão.
Aí Osório voltou ao CND onde transmitiu a informação ao “Dr. Sabá”. O clima foi totalmente diferente, entusiasmando-se o tal secretário que pediu para que o presidente procurasse diretamente o Dr. Paula Ramos. Sugestão aceita o baiano foi ao escritório do homem e transmitiu o convite. Este também se entusiasmou e tratou logo de ligar para a esposa avisando que iriam à Europa. Só impôs uma condição, de que a excursão devia começar por Milão ao invés da Rússia que o assustava. Acordo feito foi só Osório ligar pra Zé da Gama e fechar.
                                                Rapaz, esse até que parece o Zé da Gama!

A autorização saiu rapidinho e o Bahia viajou em dois aviões, mas o destino final seria mesmo Kiev. Quando chegou a Lisboa Osório perguntou ao Zé da Gama se havia enviado a passagem do Dr. Paula Ramos, recebendo a seguinte resposta:
- Não vou mandar passagem nenhuma! Eu disse aquilo para você conseguir autorização.
A delegação almoçou no restaurante do aeroporto onde havia atendendo garçons gentis e trajados de smoking. Na ocasião o ponteiro Biriba, que nunca havia sido tratado por Vossa Excelência, comentou que o garçom lhe havia confundido com o presidente do clube.
Quando o time estava na cidade de Kiev, na Rússia, Osório recebeu um telegrama do Dr. Paula Ramos pedindo urgentemente as passagens.  Incontinenti, procurou o empresário Zé da Gama para mostrar a solicitação. Este pegou o telegrama da sua mão e falou que quando chegasse ao Rio iria mostrá-lo na TV. Mas o presidente do CND não se fez de rogado, enviando depois outro telegrama: ou receberia as passagens ou determinaria o retorno da delegação tricolor. Mais uma vez o empresário ficou com o telegrama e não respondeu ao solicitante.
                                                    E o pior é que não era só Felipão!

Em Kiev o material esportivo se extraviou fazendo com que o Bahia jogasse com chuteiras, meiões, calções e camisas emprestados pelos russos. Foram cinco jogos em 17 dias no país e logo de saída o tricolor tomou de quatro a um. Em Moscou, porém, venceu o Central do Exército (2 X 1) e empatou com o Spartak (1 X 1), vencendo, além disto, em Leningrado por um a zero. Mas o time desacertou completamente em Tibilissi,. Perdendo para o Dínamo local por quatro a zero.
Enquanto o Bahia ia a campo as dificuldades para receber as cotas continuavam. Zé da Gama só dava “vales” aos jogadores e o pior é que não era nos dólares previamente acertados mas em rublos. Aí Osório começou a apertar o empresário. Quando chegou a Milão declarou a imprensa que possivelmente o time não atuaria, abrindo o jogo para um dirigente do Milan que o procurou. Na oportunidade o italiano autorizou que fosse paga a cota de nove mil dólares diretamente ao tesoureiro do clube. E Zé da Gama nem piou! O que acabou acontecendo é que o tricolor conseguiu um histórico empate em um gol contra o Milan.  
Mas depois disto perdeu em Bologna para o time local por dois a um. O empresário continuava acompanhando a delegação e Osório começou a perceber que, mesmo não sendo desonesto, era um farofeiro, gastador e irresponsável. Tirava dinheiro do bolso para dar “bichos” aos jogadores. Foi aí que o presidente do tricolor começou a se preocupar com as passagens de volta, chegando a ligar para o Sr. Lasser, agente da Panair em Frankfurt, por sinal sócio de Zé da Gama.
                            
 O retorno de Lasser veio na hora do jantar e, como Osório não estava, ele se entendeu com Zé da Gama. Como Osório foi informado do contato perguntou diretamente ao empresário:
- Você falou com ele Zé?
- Falei.
- Ele disse o que sobre as passagens?
- O senhor não tinha nada que falar com ele. Quem tem que entregar as passagens sou eu e não vou entregar agora. Não quero que aconteça com o Bahia o mesmo que aconteceu com o Flamengo, cujo time foi embora me deixando sozinho aqui, quando tinha que realizar ainda cinco jogos.
- Se filho da puta! Então você pensa que pode me tratar como prisioneiro?
Como Osório tinha baixado o nível da conversa Zé da Gama pediu:
- Respeite pelo menos sua senhora.
- Quando minha mulher se casou comigo já sabia que eu era da Polícia e sempre tratei ladrão assim. 
A conversa aí engrossou de vez. Osório segurou o empresário sob as vistas de todos e levou-o para o quarto mantendo-o sob custódia. Preparou então um distrato para que ele assinasse. Aí foi demais para o empresário que acabou chorando:
- Eu estou na desgraça. Tudo meu, em casa, está penhorado. Minha mulher me escreveu...
- Não é problema do Bahia. Você vai assinar o distrato, e agora!
O documento era caceteiro. Nele, Zé da Gama, por não haver cumprido suas obrigações, renunciava a todas as vantagens outorgadas. Aí Osório mandou:
-Assine!
               
                          Nem pensar em andar em um metrô assim!

E não é que o cara assinou mesmo? Depois foi para o seu quarto embora Osório mandasse que fosse vigiado por ainda se encontrar com as passagens para a Escócia, local do próximo jogo. Estavam então num hotel de luxo nas montanhas da Bélgica, depois desceriam para Bruxelas, de onde, na manhã seguinte, embarcariam para Londres e de lá para Glasgow, local do jogo.
Vigiaram o quarto do empresário durante toda a noite mas este tentou sair lá pras cinco e meia da manhã. Osório desceu correndo a escada e ainda achou Zé da Gama no hall do hotel pegando-o pela gola do paletó. Mas ele estava telefonando pra acordar os jogadores para a viagem.  Aí ele pediu a Osório que o deixasse ir com a delegação para a Escócia para que não fosse desmoralizado. O presidente tricolor aceitou mas sem que recebesse dinheiro algum.
O jogo em Glasgow foi tenso pois o Flamengo tinha tomado lá de nove a dois com quatro jogadores expulsos nos primeiros quinze minutos de jogo. O Bahia perdeu pro Aberdeen de 3 a 2 e logo depois, jogou na própria cidade desse clube perdendo de novo por dois a zero. Mas pelo menos não havia sido nenhuma “lavagem”. Segundo Osório o juiz roubava tanto pro time da casa que ele correu atrás dele gritando xingamentos, mas não sabia xingar em inglês!
Da Escócia foram para a Holanda onde o tricolor ganhou do Anderlecht e do Standard de Liége, ambos por dois a zero.  Mas em Moterwell perdeu de três a zero para o time local. Mas, logo depois, veio o melhor resultado da excursão, quando o time, venceu a seleção holandesa que começava a treinar para a Copa do Mundo por dois a zero. E foi nesse país que recebeu o telefone do Sr. Lasser da Panair. Ele perguntou se o Zé da Gama ia ficar com a delegação ao que Osório desabafou com um monte de impropérios. Foi aí então que o agente, visivelmente nervoso, disse-lhe que iria mandar as passagens.
                                             Os baianos se esbaldaram na Itália!                                            

Momentos depois pareceu tudo certo. A secretaria do agente era brasileira e ligou pra Osório prometendo passar no hotel de noite, mas só levou brindes, passagens mesmo só no outro dia. Como o presidente tricolor ficou desconfiado mostrou a um dos integrantes da delegação que sabia falar inglês e esse disse que elas só tinham validade depois de passar pelo Departamento de Finanças da empresa. Aí Osório a chamou de brasileira descarada e vagabunda e mandou entregar as “porcarias das passagens de volta”.
Só em Bruxelas é que apareceu o próprio Lasser junto com Zé da Gama mas sem as passagens. Aí o primeiro disse que não tinha pagado as passagens por causa do Gama. Ao que Osório respondeu:
- E o que eu tenho com ele? Nada!
- Mas eu quero receber meu dinheiro, são 16 mil dólares!
- E o Bahia com isso? Primeiro vou cobrar todas as contas do Bahia, pagar todas as despesas, o que sobrar lhe entrego, e você que se entenda com o Zé. Cadê as passagens verdadeiras?
Enquanto continuavam essas desavenças o Bahia foi sozinho sem Osório para a Alemanha sob a supervisão de um empresário local. A vitória mais sensacional foi em Munich onde venceu o Bayern local por seis a um, depois foi a vez do Combinado Victoria-Berlim cair por dois a zero. O presidente tricolor arranjou em Lisboa dois jogos contra o Sporting e o empresário Agide mais alguns em Oran e Argel na África. Mas Zé da Gama era cara de pau e quando o time chegou a Paris lá estava ele no aeroporto.
                                                A turma morria de saudade da Bahia!

De Paris a delegação foi pra Lisboa onde novamente encontraram o enxerido...O cara pediu dinheiro adiantado a todos os clubes dos jogos acertados por articulação de Osório. Chegou a ter a cara de pau de pedir dinheiro a este. Em Lisboa porém, o time foi um desastre, apanhando de cinco a um do Sporting num jogo onde foram expulsos Vicente e Alencar. Osório propôs imediatamente uma revanche, com bolsa ao vencedor. Como o presidente do Sporting resistiu Osório insistiu dizendo que promoveria o novo jogo.
Em Oran o time ganhou do Racing por quatro a dois após uma situação constrangedora pois o presidente da federação local queria que entrasse com a bandeira francesa, e logo numa Argélia colonizada pela França...Depois da partida Osório acertou um jogo numa cidade próxima onde o tricolor lavou a alma, oito a zero...
De Oran foram para Argel numa semana de comemoração da revolução francesa e onde a guerrilha argelina estava a todo vapor. Na entrada do estádio todos foram revistados até a mulher do presidente tricolor. O jogo foi prestigiado pelo cônsul brasileiro e Osório teve que desautorizar o técnico Carlos Volante mandando os jogadores jogarem como sabiam, e não é que acabou vencendo por três a um?
Na volta para Lisboa a equipe porém passou por um sufoco. É que o avião velho que levou a delegação mudou a rota e acabou em Sevilha na Espanha. E o pior é que o avião foi invadido por soltados com armas dizendo que o país não tinha relações diplomáticas com a Argélia e que não poderia ficar ali. O fato é que demorou em liberar o avião e só chegaram a Lisboa perto das sete da noite. Jantaram no aeroporto e seguiram direto para o estádio onde o jogo se realizaria uma hora depois.
                                               De tanto jogar a chuteira ficou assim!

Osório quando chegou procurou logo o juiz e se apresentou como médico ameaçando logo a figura:
- Olhe aqui, nossa amizade, se roubar tiro o time de campo. Vou estar perto do senhor o tempo todo. Quem avisa amigo é.
Como era bolsa ao vencedor a pancadaria comeu à vontade. O próprio Osório mandou Vicente e Agnaldo “baixar o pau”. Mas, quando alguém do seu time caía em campo voltava a ameaçar que ia tirar o time de campo. O jogo estava empatado em dois gols, e se encaminhava para o fim quando o juiz deu pênalti de Henrique. O zagueiro logo partiu pra cima do juiz e o agarrou. Mas Osório entrou em campo e disse aos jogadores tricolores que o jogo tinha terminado. Henrique ficou estupefato mas o pressionado juiz acabou admitindo o encerramento.
Enquanto o juiz recebia vaias, vários assistentes jogavam assentos plásticos no presidente tricolor, uma rádio de Lisboa que transmitia o jogo dizia que quem havia acabado o jogo era o homem de capa preta (Osório). De noite a renda foi dividida e as passagens asseguradas num avião Constelation para o Brasil.
 Zé da Gama veio ao Rio e cumpriu a promessa exibindo o telegrama para autoridades e a imprensa. O resultado é que o Dr. Paula Ramos foi forçado a abandonar o CND e a nunca mais ocupar cargo nenhum na área esportiva.

·         Agradeço ao livro Futebol, paixão & catimba.

sábado, 10 de dezembro de 2011

O vigarista do ano

 

O filme O vigarista do ano do diretor Lasse Halstrom, é sobre o escritor Clifford Irving(Richard Gere) que procurando há muito tempo uma grande história pra contar resolve inventar uma. Ele escreve uma falsa autobiografia do milionário excêntrico Howard Hughes contando com que o isolamento e a falta de informações sobre o mesmo bastaria pra enganar os outros.
Assim uma grande editora aceita sua proposta e publica o livro que vira um best-seller. No resto do filme o escritor só faz se enrolar tendo que inventar uma verdadeira rede de mentiras pra sustentar a sua história. Só não conto o final pra vocês assistirem. Mas se Richard Gere estrela o cúmulo da vigarice o futebol baiano lidou com muitos vigaristas. Um deles surgiu na vida do tricolor aí perto do fim dos anos cinquenta.
Pô, o negócio era botar a mão na cota!


Os clubes baianos começaram nessa época a fazer excursões ao exterior, já bastante atrasados em relação aos clubes do Sul que já o faziam desde os anos vinte. Foi em 1957 que a dupla BA-VI estrou no exterior, e logo na Europa. Mas pra isso tiveram que comer o pão que o diabo amassou. Vejam o que o EC Bahia passou pra jogar no dito Velho Mundo.

A imprensa sequer acreditou não havendo poucos que tirassem gozação com o clube. O locutor Zé Athayde chegou a dizer que o roteiro tricolor se estenderia do bairro de Periperi (passando por Plataforma e Paripe) até a cidade de Juazeiro. Por outro lado, o radialista Cléo Meirelles, queria indicar o jornalista que acompanharia a viagem. Não foi fácil selecionar os jogadores que iriam. Carlito que foi como roupeiro acabaria como titular e artilheiro da equipe.
                                                        Ora, não é nada disso!

Lourival Lorenzi foi o organizador da excursão e, na última hora faltaram as passagens, tendo o Bahia sido procurado pelo empresário Roberto Faulisier por telefone:
- Seu Osório, está tudo pronto para a excursão, mas o sócio que iria financiar as passagens falhou, caiu fora. Porém, se o Bahia financiar as passagens eu pagarei mais 55 contos por jogo, ressarcindo as despesas.
Osório chegou a desconfiar que o “pé frio” era o governador Antônio Balbino, que tinha dado o nome à excursão, pois o jornal A Tarde, que lhe fazia oposição, espalhava essa história. Naquele tempo 27 passagens custavam uns 700 contos de reis e aí a diretoria tricolor decidiu ir ao governador. Foram ao palácio do governo e explicaram a situação.
                                              O time foi jogar em cada lugar desgraçado...

Se o Banco do Fomento (depois BANEB) emprestasse o dinheiro, com o aval do diretor Waldemar Costa, o clube pagaria em noventa dias. Balbino resolveu o impasse com um telefonema e 24 horas depois, saiu o dinheiro que Osório levou para Plinio Risório, superintendente da Panair do Brasil. Aí a imprensa confirmou a noticia:
- o Bahia vai mesmo à Europa!
                                       Querem mais vigaristas que Havelange e Blatter?

Osório ainda tomara quinhentos contos emprestados a Nelson Pinheiro Chaves empenhando seus subsídios na Câmara dos vereadores. A delegação fez escalas em Recife, Dakar, Madrid e chegou a Londres, onde encontraram com o empresário e ficaram hospedados em um bom hotel. Mas o presidente tricolor não gostou do jeitão do empresário achando que não tinha dinheiro nenhum e era um picareta.
A estreia foi três dias depois com o tricolor caindo por três a um. Mas se não fosse o goleiro Jair a conta seria ainda maior. O empresário não pagou a cota do clube depois da partida dando apenas “vales” pros jogadores sob a desculpa de que o restante seria empregado para financiar a viagem de navio para o porto de Le Havre onde o time venceu a seleção local.
                                                                   Reunião da CBF!

Depois seguiram para Paris a cidade luz, mas aconteceram coisas do arco da velha. O lateral Florisvaldo se perdeu na estação, roubaram dinheiro de Bacamarte, e o ponta Izaltino “encheu a cara”. Tudo isso e nada de dinheiro. Aí Osório teve uma conversa mais firme com o empresário Faulisier:
- O Conselho Deliberativo do Bahia só autorizou a viagem porque o contrato determina pagamento após cada jogo, caso contrário retorno imediato da delegação.
O empresário, porém, jogava agua fria na fervura pedindo calma, dizendo que estava “se virando” e levando a coisa no papo. Osório se controlou à custo, inclusive porque não queria encerrar a excursão de supetão. A próxima parada seria em Hamburgo quando o Bahia levou de quatro a um do clube local. Logo depois Osório voltou a procurar o empresário, que lhe respondeu:
- Você não me disse que o Conselho determinou que o time retornasse, na hipótese de eu não pagar? Podem voltar! Eu não tenho dinheiro. Você me traz um time vagabundo, perdendo pra todo mundo e ainda quer fazer exigências? Pode voltar!
                                                                 O velho Osório!

Osório engoliu aquela em seco nem conseguindo dormir direito à noite. Pra retornar tinha a vergonha, o consulado tinha que intervir para repatriar a delegação e havia ainda a divida com o Banco do Fomento. Aí engoliu o sapo. No outro dia quando o empresário picareta lhe telefonou perguntando se iriam prosseguir respondeu que sim e procurou saber para onde iriam. Bronswick foi a próxima parada onde ficaram hospedados num hotel em uma montanha com um frio de doer. No campo não deu outra com o tricolor apanhando de seis a três.
Depois, a escala rezava passar em Praga pra jogar contra a forte seleção da Tchecoslováquia. Aí Osório mandou o técnico colocar Carlito na ponta esquerda o qu4e levou a uma virada no time que ganhou da seleção e, logo depois, o fortíssimo Estrela Vermelha em Bratislava. Perderam na Hungria e ganharam em Pilsner e Coshita. Aí o empresário começou a pagar algumas cotas em moedas diferentes. Mas ao invés de converter em dólares o presidente tricolor mandou o dinheiro pra Bahia. Conta-se que quando chegou aqui ninguém sabia o que era...
                                                    Os baianos viajaram muito!

Enquanto isso o empresário mostrava-se um verdadeiro vigarista, fazia contrabando, sumia e entregava o time para um agente seu na cidade, etc. Acabou conseguindo jogos na Russia o que causava estremecimento da delegação com a FIFA num período de guerra fria. O tricolor viajou de Copenhagen a Riga em dois aviões e tiveram que passar pela alfandega russa. Mas apesar do pessoal estranhar foram bem tratados, receberam flores, tiveram dois interpretes e comeram á base de vodca e caviar.
Aí surgiu a oportunidade de vingança de Osório. É que um dos interpretes conhecia a picaretagem do empresário e disse que não gostavam de tratar com gente desonesta. Aí Osório pediu uma reunião com o responsável pelo comitê esportivo russo e disse que havia acompanhado os movimentos do empresário em Hamburgo e podia dizer que achava que era espião americano...
                                                     O mar não estava pra peixe!

É claro que esta acusação impressionou os soviético e Osório conseguiu que os dez mil dólares que receberiam pelos jogos fossem enviados diretamente para Salvador. Pediu ainda outros jogos no país mas os russos responderam que não. Mas desafiou, se ganhassem ou empatassem com o Torpedo Moscou (campeão do país) receberiam mais três jogos e ainda as passagens Moscou-Salvador com dez quilos de excesso de bagagem por pessoa.
O resultado é que o Bahia ganhou do time do grande goleiro Iashin no estádio Lenin e jogou ainda em Minsk e Leningrado. Só não jogou na Noruega por causa das trapalhadas do empresário. Os russos não pagaram a ele as cotas e sim ao chefe da delegação. E o cara ainda tentou convencer Osório lembrando o “contrato”. Osório não perdeu a ocasião:
- Quando você deixou de pagar as cotas na Inglaterra o contrato já estava roto. Aliás procure o tesoureiro do Bahia para ver quanto você ainda nos deve...
                                                 Olhem Richard Gere no Porto da Barra!

E, como o vigarista insistisse em arranjar novos jogos através de esquemas ele levou-lhe para um reservado do hotel e lhe deu uns sopapos tomando-lhe o passaporte. Mas os russos pediram para que devolvesse, o que fez, porém, após garantir que o cônsul do Brasil em Hamburgo pedisse a polícia local para lacrar a porta do apartamento onde estavam as bugigangas que a delegação tinha comprado na Europa.
Os russos cumpriram o compromisso, mandaram o dinheiro e as passagens. Mas chegando a Frankfurt, houve problemas com excesso de bagagem, e em Recife, a denúncia de que a delegação trazia contrabando. Foi preciso muito papo pra contornar essas coisas. Mas, chegando ao Brasil a imprensa pernambucana enalteceu os êxitos tricolores e o presidente da FPF, Rubem Moreira, ofereceu um almoço à delegação.
                                 O cara continua por aí enganando quem quer ser enganado!

Em Salvador novas homenagens, povo no aeroporto, e até uma medalha de ouro da Liga Bahiana de Desportos Terrestres. Duraram de cinco da tarde até uma hora da manhã pois teve desfile e tudo, saudação no Palácio da Aclamação do governador Antônio Balbino, e até um carnaval na Praça da Sé.

·         Agradeço as informações do livro Futebol, paixão & catimba e do site Adoro Cinema.