quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Carnaval, futebol e guerrilha


     

No início dos anos oitenta, quando começávamos a obter as primeiras vitórias contra a ditadura militar (haveriam eleições para governador nesse ano) e se iniciava o fim da hegemonia praticamente absoluta do EC Bahia no futebol baiano, foi criado, em 1982, o Conselho Municipal do carnaval. Como não poderia deixar de ser, o Sindicato dos Músicos que eu presidia e que havia obtido a sua carta sindical naquele ano, entrou de cabeça na proposta.

Durante os anos que esperaríamos a reativação da carta (1979-1982) não havíamos ficados parados e foi por isso que a entidade se credenciou a disputar uma vaga no conselho. Atuando em conjunto e pressionando esses órgãos do Estado e Prefeitura pudemos realizar diversas iniciativas importantes para a categoria, como o aumento das vagas, das verbas disponíveis e da aceleração do recebimento dos recursos da Fundação Cultural.



Outro fator foi à aproximação com produtores musicais mais abertos e com iniciativa como Humberto Augusto e do carnavalesco Alberto Tripodi. Em troca do apoio ás produções do primeiro conseguimos com que fossem contratados vários artistas emergentes. A aproximação com o segundo iria trazer frutos em promoções em trios elétricos, em especial quando foi coordenador do carnaval. Assim, emergiriam os talentos de Zelito Miranda, Jorge Papapá, Silvia Patrícia, Helson Hart, Grupo Pulsa, e muitos outros.

Ainda enquanto Associação dos Músicos, no final de 1981, havíamos começado a participar da seleção dos músicos para o carnaval de Salvador. Nossas bandeiras principais foram o retorno do Carnaval dos Bairros e um modelo democrático de contratação de bandas, e levariam a categoria a obter conquistas históricas.

                             Ainda haviam as fantasias!


O futebol ainda demoraria a pegar. Meu EC Vitória havia voltado a ser campeão no ano anterior, depois de oito anos. Mas, o EC Bahia havia voltado pras cabeças, de onde só saiu quando terminou a ditadura militar em 1985 e o rubro negro construía seu estádio, o Barradão.
  
A atuação no carnaval demorou para pegar. Começamos no fim do governo Manoel Castro, quando a responsável pela área de turismo era Eliana Dumet. Na ocasião, percebi que as contratações para o carnaval não tinham qualquer transparência sendo a escolha feita na  base do compadrio. Os músicos eram estimulados a enviar propostas e o órgão selecionava conforme o “Q.I”., como se diz na Bahia, quem indicou.

                 Não havia chuva que atrapalhasse a festa!


Imaginamos assim, outra sistemática, que resultasse em ganhos para a categoria abrindo inscrições para as bandas que desejassem tocar no carnaval pelo sindicato. Nas reuniões aprovamos a cobrança de 3% do valor bruto recebido em prol da assistência ao processo de negociação. Como não admitíamos o critério grupista de “seleção” pelos próprios burocratas, fizemos aprovar um concurso público para selecionar as bandas conquistadas na negociação com a SUTURSA, depois EMTURSA.

A maioria das bandas nem se abalou, preferindo adotar o caminho costumeiro de mendigar as verbas do órgão. Mas a proposta agradou em cheio as bandas que apareceram (doze),em sua grande maioria discriminadas da festa.

                     A confusão era a mesma do futebol!
        

A iniciativa foi vitoriosa, tendo a presidente do órgão Eliana Dumet apostado no processo por dispensar, inclusive, os custos de seleção, aceitando cinco bandas do sindicato para o carnaval de 1982. Mas aí também, descobri que ninguém aceita o julgamento alheio. Aqueles mesmos colegas que participavam entusiasticamente das assembleias e que iam em comissão pressionar a EMTURSA, ficavam profundamente irados quando da seleção da Comissão Julgadora (escolhida por eles mesmos em assembleia!), voltando-se contra o sindicato e passando a denunciar armações.

A iniciativa, porém, havia vindo pra ficar, crescendo a cada ano particularmente na medida em que existia conflito de interesses entre o prefeito e o governador. Mas, para que o movimento crescesse havia que ampliar o número de músicos que se apresentavam no carnaval de Salvador. O caminho escolhido foi o do Carnaval nos bairros.

                      Ah, como sofríamos com o leão!


Havia desde os anos 40 este instituto, porém ele se reduzia a incorporar alguns bairros tradicionais no circuito do carnaval. Compreendi que a reivindicação da ampliação das apresentações musicais não interessava apenas os músicos mas também ás empresas de som, vereadores, trios elétricos, outros segmentos carnavalescos, e as novas associações de moradores que vinham sendo criadas.

Assim, passamos a fazer uma enorme articulação com todos esses segmentos buscando apoio para pressionar a prefeitura a aumentar os bairros onde seriam realizados espetáculos para a população local. Fazíamos uma romaria aos gabinetes dos vereadores pedindo-lhes indicações de bairros para a realização do carnaval, solicitávamos á FABS e as associações à mesma coisa, envolvendo institucionalmente a própria Câmara de Vereadores.

                       A galera musical não era brincadeira...


Articulávamos-nos com as recém- criadas Associação das Empresas de Sonorização e a associação dos trios elétricos com este objetivo. Apoiados neste processo fazíamos propostas para a Coordenação do Carnaval obtendo, no ápice do movimento, durante o último ano da gestão da prefeita Lídice da Mata,  34 bairros, a contratação de 4.200 músicos, e a representar um orçamento de U$ 1.200.000.

O Conselho Municipal do Carnaval foi criado durante a coordenação de Oto Pippolo do Bloco Papa Léguas e nossa participação nele contribuiu pro nosso esforço em prol dos músicos. Atuei nele, representando o sindicato, por oito anos. Sua principal ajuda foi a de ampliar as pressões sobre a prefeitura e EMTURSA em relação á festa carnavalesca e envolver o Estado na sua organização.

                        Foi pouco depois que ele se foi!


No entanto, durante todo esse tempo, sempre tivemos na contramão dos interesses dos grandes blocos (empresas) carnavalescos que não viam com simpatia o aumento do poder do sindicato na festa, particularmente por aumentar o cachê dos músicos que para eles trabalhavam, e pela concorrência às verbas governamentais.

Mas a entrada do Sindicato no Conselho Municipal do Carnaval não foi nada tranquila, e exigiu um ato de “guerrilha”. O órgão foi criado durante o primeiro ano de mandato do prefeito, e atual candidato á Prefeitura, Mário Kertész, sendo que no decreto constava apenas a famigerada Ordem dos Músicos como “representante da categoria”.

                              Valia tudo no carnaval!


Inconformados com a decisão e sabendo da solenidade da instalação do conselho compareci com alguns colegas ao prédio da Boa Vista onde funcionava a prefeitura. Encontramos ali a sala cheia, com a presença de quase todas as entidades designadas, jornalistas e representantes da prefeitura.

Dalí a pouco chegou o próprio prefeito. Logo após o seu discurso anunciando a criação do novo órgão, tomei a palavra sob os flashs dos jornalistas e, afirmando que os músicos estranhavam a falta do sindicato da categoria na sua composição, pedi a correção da injustiça.

Mario Kertész não se fez de rogado e, numa atitude hábil, aceitou a reivindicação mandando na hora “substituir a OMB pelo sindicato na lista dos participantes”, o que, naturalmente, agradeci. A ação “guerrilheira” rendeu á entidade à presença na mídia local que parecia pressentir o surgimento de um novo ator no carnaval baiano.

                       E a Fonte Nova estava em plena forma!


O movimento dos músicos no carnaval durou entre 1982 e 1995. Enquanto as elites locais não haviam se sensibilizado para as potencialidades da festa e se manteve a disputa politica estado X prefeitura, a categoria pode melhorar o seu nível de vida e condições de trabalho e a entidade contar com uma estrutura respeitável de atuação.

O ato de “guerrilha” na sede da Prefeitura no bairro do Engenho Velho foi apenas um dos vários que empreendemos ao longo desse tempo inesquecível onde os músicos, além de serem um dos principais protagonistas da festa, passaram a ter influência nas suas decisões. No auge desse processo chegaram a receber cachês que ultrapassaram o que pagavam a maioria dos blocos e trios.



sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Na mesa com Danuza

 

Conheço Danuza Leão há mais de quarenta anos. Não pessoalmente é óbvio mas da TV e de ouvir falar dessa irmã de Nara que enveredou pelo jornalismo e foi até fundadora do jornal Ultima Hora. A primeira vez que ouvi falar dela foi nas fofocas sobre o que rolava no apê da musa da bossa nova. Quando a TV Itapoá começou a transmitir o festival da Record ela ficava lá pelos bastidores. Basta pegar a gravação da Era dos festivais que você a vê ali pelas coxias.  
Depois que entrei na Escola de Música e passei a trabalhar e fazer política levei muitos anos sem vê-la até que ela deu pra ser escritora. Confesso que esse negócio de etiqueta nunca me sensibilizou, mas acabei dando uma folheada em seus livros quando enveredou de maneira inovadora pela crônica do cotidiano das pessoas, digamos, com mais posses, do Rio de Janeiro. Até então as colunistas eram formais, de linguagem empolada, e só faziam puxar o saco dos poderosos. Com Danuza isso não acontecia. Ela falava de tudo o que acontecia no high society, inclusive dos podres.
                                                   Olhem a musa como estava jovem!

Algum tempo mais tarde peguei o hábito de olhar a sua coluna no jornal. Algumas mais felizes e outras nem tanto, mas todas sinceras. Além do mais qualquer grã-fina ignorante podia ler. Há umas duas semanas passadas li uma que reflete fielmente o que encontrei nas minhas (poucas) viagens para a Europa.
Durante 58 anos não meti a cara fora do Brasil. Mas nos últimos cinco anos tirei à forra, fazendo duas viagens á Espanha e Portugal, uma a Itália, e outras à França e Grã Bretanha/Irlanda. Sem contar as que fiz á América do Sul. E não é que acabei gostando do troço? Agora quero ir todo ano e lá em casa já tem planejamento até 2022!
                              Ela viu Sérgio Ricardo quebrar o violão e jogá-lo para o público! 

Mas apesar de gostar a beça dessas viagens confesso que uma coisa me decepcionou profundamente, e especialmente na Itália, França e Inglaterra: a comida. Em Paris até que as coisas não foram tão mal. Fui lá no segundo semestre de 2008, ganhava bem quando a FTC pagava, e conseguimos almoçar em alguns restaurantes tradicionais. Mas, mesmo lá, quando chegávamos no trivial, o negócio apertava encontrando o maior “grude”.
Na Inglaterra e Cia, onde passamos 21 dias, só encontramos quatro restaurantes decentes, o Sergius, o Calamares e um turco em Londres, e uma churrascaria brasileira em Liverpool. E olhem que não fomos num único restaurante inglês preferindo os italianos, brasileiros, gregos, turcos, etc. Neto de italianos, freguês de carteirinha dos diversos pratos daquela gastronomia, nunca poderia esperar que comesse tão mal naquele país, onde passei em Roma, Veneza, Florença, Sorrento, Napolí, Siena, Assis, San Gigminiano, e até na Ilha de Capri.
                                                           Ah, isso só na Bahia!

Passávamos o dia passeando por locais inesquecíveis, indo a tudo o que nossa imaginação permitia. O café, apesar de ruim, ainda dava pra tirar de letra. Sempre há um pão, uns queijinhos, e uns sucos pra tapear. Mas quando chegava a hora do almoço e do jantar era um Deus nos acuda. Ao passar das onze e meia e dezoito horas começávamos a ficar tristes, nem precisava perguntar por que, era hora de comer.
Aí, nos dirigíamos para o primeiro restaurante que tinha cara de decente, e, depois de nos enrolarmos com o cardápio, pedíamos o trivial, pizza, lasanha, spaghetti, e otras cositas más. Ah, e o serviço era outra porcaria. Das mesas onde comíamos (dizendo melhor tentávamos comer) podíamos ouvir o baticum de pratos arremessados contra a pia. Dos garçons, então, nem é bom falar. Havia um ou dois para atender um monte de gente e não lhe davam nem trinta segundos pra fazer o pedido. Cybele, que é de ficar pensando com o cardápio á mão, passava mal pois o garçom saía e só voltava no outro dia.

É claro que quando voltamos “sentamos a ripa” na comida e no serviço europeu de restaurante, não esquecendo de livrar a cara de Portugal e Espanha que, pelo menos, tem uma culinária mais próxima á nossa. Mas, quando externávamos a nossa opinião em rodas de classe média sempre algum deslumbrado discordava não achando qualquer defeito naqueles países, especialmente na sua gastronomia, a não ser uma queixa ou outra da agência da excursão.
Só fui entender o que houve nesses anos e que eu estava certo quando li a crônica de Danuza. Ela diz que muitas coisas estranhas estão acontecendo em Paris no terreno da gastronomia. É que, como nós fizemos, frequenta bistrôs simples da cidade e pede sempre pratos tradicionais. Nada como a sua voz de experiência com Paris. Afirma que os cardápios estão mudados, não se encontra mais coisas que se faz na hora, como ovos, e um Steak tartare vira um montinho de carne moída, com um bolo de batata saído das micro-ondas.  

                                 Olhem o meu tempo de festival com a mana Lena cantando!

A explicação dada por Danuza é convincente, o culpado é o miserável do capitalismo. É que muitos restaurantes da Europa aderiram á comida pret-a-manger (pronta para comer). É simples, como os encargos sociais da França são muito altos o restaurante economiza coloca um garçom pra atender trinta pessoas e dispensando o chef.
O dono do restaurante elaboram o cardápio tirando tudo que precise ser feito na hora. Encomendam as embalagens com os produtos e o caminhão faz a entrega de madrugada indo diretamente para o freezer.  Assim pode eliminar as perdas pois só vem uma porção média na embalagem.
Danuza fala da gravidade desta situação que fere fundo a famosa gastronomia francesa. Já eu penso que se o pessoal que tem um mínimo de paladar perceber essa mudança não tardará para que isso tenha influência sobre o movimento turístico da França.  Termina a crônica dando a quem vai pra Paris o mesmo conselho que meu sobrinho Tiago me deu esse ano: escolher os restaurantes antes de ir procurando estabelecimentos tradicionais pra não ter que comer, depois de tanto dinheiro gasto pra viajar pra Europa, uma comida com gosto de comida de avião.

·         Agradeço as informações da crônica Paris de Danuza Leão.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Adeus não, me diga até breve


Zeca Araújo é desportista, poeta e musico.

O cancioneiro brasileiro registra diversas despedidas. Mas a maioria delas rejeita a palavra adeus, o que insinua a esperança de um reencontro. Muitos termos mais forram usados para substituição desta fatídica e definitiva palavra, como até logo, volto já e até breve. De todas ela a mais famosa foi a homenagem feita para Bob Marley pelo Bloco Carnavalesco Muzenza. O poeta Zeca Araújo mostra, no entanto, que este legado existe também na poesia, particularmente quando se fala em Fonte Nova.
ADEUS FONTE NOVA, VELHA FONTE.
ROUPA VELHA, ROUPA NOVA.
MORRE A VELHA COM ESPETÁCULO,
NASCE A NOVA, UM NOVO PALCO.
                                                 Dique do Tororó nos anos quarenta.

NÓS E O MUNDO VIMOS A POEIRA LEVANTAR,
OUVIMOS UM GRITO UNÍSSONO Ô Ô Ô Ô Ô Ô Ô...
E NÃO HAVIA FUTEBOL
NEM ERA UM GRITO DE GOL.
A VELHA ARENA VIROU PÓ.

FOI TÃO LINDA A IMPLOSÃO!
LÁGRIMAS INUNDARAM O DIQUE,
NO POVO, UM SÓ CORAÇÃO.
  Linha de bonde em 1945 ao lado de onde seria construída a Fonte Nova!

NAQUELA VELHA ARENA
VIMOS NOSSO TIME JOGAR.
VITÓRIA, BAHIA, YPIRANGA,
GALÍCIA, UM TÍTULO DOAR.

LEÔNICO, SÃO CRISTOVÃO,
BOTAFOGO DO VELHO SOTERO MONTEIRO,
IDEAL DE SANTO AMARO, SMTC,
ESTRELA DE MARÇO E O TIME DA  ABB.
                                 Caetano Veloso num BA-VI dos anos 60, com Zé Oto e Romenil.

MONTE LÍBANO E REDENÇÃO.
ATLÉTICO E CATUENSE,
DOCE CLÁSSICO DA LARANJA.

DO SERTÃO, O FLUMINENSE.
TINHA O BAHIA DE FEIRA,QUE VOLTOU COMO FEIRENSE.
O CRUZEIRO DE CRUZ DAS ALMAS, JUAZEIRO  E BARREIRENSE.
EM VITÓRIA DA CONQUISTA, O SERRANO E O CONQUISTA,
E, AO NORTE, O JUAZEIRENSE.
                Uma das decisões da Taça Brasil na fonte do futebol!

VITÓRIA DE ILHÉUS E COLO- COLO, A FORÇA AZUL  ITABUNENSE.
FLAMENGO DE ILHÉUS E POÇÕES,
PALESTRA, CAMAÇARIENSE E  SÃO FRANCISCO DO CONDE
BRILHARAM NESSA FONTE  BAVIENSE.

MUITOS TIMES, SELEÇÕES
BRILHARAM NO  PALCO QUE HOJE É PÓ,
DE GOL VIRADO PRA FONTE
E PRO DIQUE DO TORORÓ.
                            A Fonte Nova depois de interditada.
CHOREI NO EXATO MOMENTO QUE VOCÊ IMPLODIU,
A NATUREZA DEU O SOL, E TUDO VOLTOU A SER PÓ!
E ESSA POESIA NASCEU DO SOFRIMENTO,
PELO GIGANTE QUE DORMIU
NA GARGANTA, UM SÓ LAMENTO,
PELO FILHO QUE PARTIU.

SEI QUE NOVA FONTE VIRÁ,
MAS FICARÁ   A  SAUDADE
DAS BELAS  TARDES  DE  DOMINGO,
ALEGRIA DA CIDADE.
                        


fussballtempel.net
                             Virou só um pedaço da fotografia! 
ATÉ BREVE FONTE QUERIDA,
SEMENTE NO DIQUE PLANTADA.
SEJA BEM VINDA, NOVA ARENA,
PRA NOSSA CIDADE ENCANTADA.

DOMINGOS, VERÕES, CARNAVAIS,
SAUDADES DE TUDO QUE VÍ.
PERDÃO SE ESQUECÍ ALGUM TIME,
MAS ESSE POEMA REDIME
ESSE POETA  BAVI.

E SE ALGUÉM SE ACHAR LESADO,
QUISER SER INDENIZADO
  AO  SÃO JOSÉ  DE  CIMA,
DEIXE A TRISTEZA AÍ
CORRA E PEGUE   O  GUARANI.

SEI QUE VIRÁ NOVA FONTE
MAS, FICARÁ A SAUDADE
DAS BELAS TARDES DE DOMINGO
QUE ERAM A ALEGRIA DA CIDADE.




sábado, 14 de janeiro de 2012

O Brasil e a Copa de 2014

                                          
                            
Ninguém desconhece que o Brasil está organizando uma nova Copa do Mundo. O fato acontece depois da Copa de 1950, vencida pelo Uruguai em pleno Maracanã, e da Mini Copa de 1972, realizada nos anos de chumbo, mas ganha pela seleção brasileira. Todos esses momentos deixaram marcas físicas no futebol brasileiro.
No primeiro caso, possibilitando a construção do velho maraca, da Fonte Nova e outros menos votados. O caso da Mini Copa, feita para que a ditadura capitalizasse a conquista inédita do “tri” no México em ano de eleições municipais, coincidiu com a comemoração do sesquicentenário da chamada independência do país. Na oportunidade foram ampliados estádios como os do Morumbi, o do Arruda e a própria Fonte Nova que ganhou um anel superior, fazendo com que o Brasil entrasse na era de massas do esporte.
                
O projeto da Copa de 2014 também intenta repercutir nas eleições presidenciais daquele ano. Como não poderia deixar de ser, também é o paraíso das empreiteiras que além de abiscoitarem a construção de estádios novinhos em folha, ainda contaram com a insanidade de se destruir os existentes para construir outros na cidade ou no mesmo local onde haviam, caso da nossa Fonte Nova.
Após a operação de marketing que resultou na aprovação do Brasil como sede, a escolha política das cidades onde serão realizados os jogos, e a ainda mais politicagem da definição dos locais das partidas das quartas de final, semi - finais e finais, segue o processo de organização da copa em marcha batida, aqui e ali mais atrasado, mas certamente às custas da abdicação de nossa soberania para engordar as contas da entidade máxima do futebol mundial e seus gulosos dirigentes, constantemente denunciados por corrupção.
                                            Enquanto isso nada de metrô em Salvador!

Por falar nisso qualquer pessoa que se dê ao trabalho de examinar o resultado das licitações e os contratos as absurdas diferenças de preços da construção dos estádios. Porque os da Bahia e de São Paulo apresentam tal distorção? Qual a justificativa da entrega de patrimônios públicos como os do Maracanã e o da Fonte Nova durante décadas para a utilização de empreiteiras?
Recentemente, os Comitês Populares da Copa, que concentra a resistência de moradores, movimentos sociais prejudicados pelas obras e atitudes governamentais, assim como cidadãos, lançaram um importante documento onde fornecem uma visão certamente menos ufanista dos preparativos e providências. O trabalho, produzido coletivamente, é de consulta indispensável para quem deseja um olhar independente sobre a organização da Copa do Mundo de 2014. 
                                                      Só chamando Eliana Calmon!

Neste fim de semana tive a oportunidade de fazer-lhe uma leitura e confesso que me espantei com a abrangência das questões colocadas e que constituem um verdadeiro dossiê. Entre os relatos constam despejos de comunidades em processos ilegais e arbitrários “justificados” por obras da copa.
O documento estima que 150 a 170 mil famílias sofrerão esse problema até o término das obras e que a ameaça de desalojamento se estende também aos trabalhadores informais e comerciantes, que tiram o seu pão no entorno e nas vias de acesso dos estádios. A intervenção urbana propiciada pela copa sugere a realização de uma reforma concentracionista, na qual a valorização das áreas centrais e a expulsão dos seus atuais ocupantes agravará os problemas das nossas cidades.
                                                      Os caras não largam o osso!

Vocês sabiam que já houve inúmeras greves de trabalhadores das empreiteiras da copa desde o começo das obras? A quantidade desses movimentos nos faz refletir sobre certos assuntos. Será que o planejamento da copa no Brasil seguiu critérios elementares? Em outros países foi permitida tanta intromissão da FIFA no processo organizativo e decisório? Não serão os cronogramas de execução demasiadamente apertados? Quais as razões de tantos atrasos e as “justificativas” que estão propiciando tantas más condições de trabalho e super exploração?
Da leitura do documento depreende-se que a Copa de 2014 traz consigo graves precedentes que causarão danos ao meio ambiente do país. Por conta dela licitações ambientais tem sido “facilitadas”, regulamentações ambientais e paisagísticas tem sido modificadas, e foi até incluído, no novo Código Florestal, a possibilidade de desmatamento de Áreas de Preservação Permanente (APP)!
                                            Com esse já são dois ministros do esporte!

Preocupa seriamente os autores as providências para a segurança pública. Medidas de “ordenamento” urbano, restritas à decisão de burocratas de plantão, tem violado o livre acesso da população aos espaços públicos. Há sério risco de a segurança ser militarizada e de entrega a empresas de responsabilidades que evidenciam privatização.
Os comitês populares da copa questionam os próprios benefícios que trará o certame para a população. Afinal, as arenas esportivas estão sendo projetadas sob padrões que dificultam a cultura, os costumes, e as formas de se manifestar dos torcedores brasileiros. Estádios históricos estão sendo entregues por décadas para a administração de empresas particulares. E é ainda mais questionável a majoração dos preços dos ingressos, que certamente afastará vários contingentes da população dos estádios.
                                                   Os tubarões estão levando tudo!

Considero que muitos desses problemas poderiam ser minorados ou resolvidos nos grupos gestores, comitês, câmaras temáticas e secretarias especiais da copa. No entanto, muitos deles não saíram do papel, e outros tem agido sob a dependência das empresas, desestimulando a transparência e participação popular na Copa de 2014.  

·         Agradeço as informações do documento da Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa.

sábado, 7 de janeiro de 2012

Nunca aos domingos


                                 Ah que saudades de Melina Mercouri! 

·         Uma homenagem a Sócrates

Na minha adolescência vibrei com a comédia romântica Nunca aos domingos. Não por ter sido indicada ao Oscar em várias categorias, arrebatando o troféu da melhor canção. Nem mesmo por contar com Melina Mercouri ou ter Jules Dassin como diretor e ator mas pela filosofia de vida que destilava. Vivíamos um tempo em que o cinema divertia sem menosprezar o espectador e ainda se fazia filmes exaltando as classes baixas, a coletividade, pondo ênfase numa atitude libertária e numa vida voltada para o melhor dos sonhos epicuristas do comer, beber e amar. Era assim que podíamos ver uma alegre prostituta que não cobrava de quem tivesse simpatia e um filosofo sonhador que buscava restaurar valores da antiga civilização grega.
Os anos 60 não mais voltariam e, vinte anos depois, os tempos que receberam a genialidade de Sócrates eram bem outros. O Brasil ressurgia num mundo onde apareciam os blocos econômicos e a realidade virtual tomava corpo. O país entrava na reta decisiva para superar a ditadura militar, embora os caminhos seguidos não fossem o que eu e ele almejássemos. Entrávamos na era da informática e do computador pessoal, do disco compacto a laser (CD).

                                          Voce foi mas ficou meu amigo!

Uma nova estética começava a aparecer no rock onde, através de sua aproximação com a MPB num cenário da dance music, despertavam novos talentos musicais. Mas nem eram flores, a liberdade sexual entrava na defensiva com o uso politico da descoberta da AIDS e a indústria cultural engoliria talentos como Elis Regina, Raul Seixas e Cazuza.

Lembrei-me de tudo isso no domingo que Sócrates morreu e mesmo atrasado registro a homenagem. Os grandes jogadores não deviam morrer nos domingos, pois são consagrados a grande festa do futebol. Não me lembro de se Garrincha, Domingos da Guia, Frienderich ou Heleno de Freitas morreram num domingo, nem sei se isto vai acontecer com Pelé e Zico. Mas o que aconteceu com Sócrates foi uma sacanagem do homem lá de cima. E olhem que não morreu num domingo qualquer mas o do encerramento do Brasileirão onde o time que o notabilizou para o futebol iria disputar o título.
                                                Pô não é esse não!

Sócrates foi doutor de futebol e de profissão. Foi um daqueles raros jogadores cujo toque genial se sintonizava com a arte do futebol. Foi responsável pela incorporação do calcanhar ao esporte, consagrando esta parte do corpo num gol antológico contra o Santos na própria Vila Belmiro. Formou aquela inesquecível seleção brasileira com Falcão e Zico que só foi derrotada pela Itália. Nunca me importei com aquele pênalti que ele desperdiçou em 1986 contra a França. A pessoas como Sócrates, que tinha brasileiro no nome, o Brasil deve muito mais, a alegria do futebol, a campanha Diretas Já e o movimento conhecido como Democracia Corintiana.
Tudo isto veio a minha cabeça ontem quando fiquei entregue as minhas recordações dos anos sessenta e oitenta. E o pior é que nem tem futebol pra se assistir e agente passa o tempo vendo pela telinha o pessoal do Sub-17 da Copa São Paulo ou com as resenhas esportivas que só fazem especular quem vai mudar de clube pra no outro dia desmentir.
                          Pelo menos os Sócrates famosos morreram na cama!

O jeito foi consolar minhas mágoas com Jules Dassin e Melina Mercouri. Esta gostava dos domingos, mas não era por causa do futebol mas pelo papo casamenteiro. Ainda estou meio “retrô” querendo ficar no passado com os filósofos Sócrates e Jules Dassin. Custava nada levar o homem pro céu na segunda feira? Dizem que Ele escreve certo por linhas tortas mas com o grande jogador dos meus anos 80 agiu muito torto mesmo!

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Foi numa tarde de domingo!

                             

Danilo Pereira é desportista e professor.

Foi numa tarde de domingo
que alguém perguntando por ela chegou
deixando meu coração tristonho,
enciumado, morrendo de amor.   
Eu falei, eu menti, eu chorei dizendo...

                                                 Jorge Ben

Jorge, seja como Ben ou como Benjor, tem muitas musicas que falam de futebol. A do Fio maravilha, a Umaraúma, e tantas outras. Um artista que ame o futebol não pode deixar sequer de falar dos domingos, o dia consagrado ao futebol, e particularmente de um domingo especial de que falaremos hoje.

Um estádio é muito maior do que seu espaço geográfico, todos tem o tamanho das historias que se  construíram ali dentro, das lagrimas que foram derramadas e dos abraços apertados que ali foram trocados, vou contar a memória de um jogo onde a Fonte Nova foi muito maior do que era, ou do que querem que seja. Neste domingo á tarde ela foi grande, imensa, do tamanho do amor da torcida do EC Bahia.

                                  O pessoal gritou horrores!


É uma das principais memórias que tenho das minhas idas a Fonte Nova e guardo na lembrança até hoje. Fiz esta crônica para dividir com vocês, já que ela permanece viva em minha mente, não pelas arquibancadas cheias, barulhentas, coloridas. Nela não há uma Ladeira da Fonte lotada desde o início da tarde, com as pessoas felizes em meio ao cheiro de cerveja e das camisas à venda.

Não há nem os amigos que só encontro no futebol, nem a tradicional confusão da entrada com os gritos e a energia que vem das arquibancadas. É alí, na inesquecível Fonte Nova, que viveu neste ano a sua primeira morte quando o governo a interditou face o desabamento do trecho das arquibancadas que tirou a vida de sete torcedores. Mas, que seja como for, viveu em 2007 alguns dos mais belos espetáculos dessa terra.

                     Os torcedores estavam assim, largados!

Esse era o primeiro domingo do mês de outubro do ano de 2007, um belo dia de sol que nos convidava a um passeio pela praia e depois nos reservava um espetacular pôr do sol, mas estávamos alí em meio ao sofrimento ainda acreditando que o tricolor se classificaria mesmo que isso parecesse impossível. Muita coisa tinha que acontecer pra que isso desse certo, a começar com o empate entre ABC e Rio Branco, e a terminar com a vitória do Bahia contra o Fast Clube, no jogo daquele dia.

As horas demoraram a passar nesse dia, e o jogo só começou às 18 horas.Parecia penitencia, nunca rezei tanto, nem chamei tanto a Deus com promessas que até hoje são cumpridas. No ônibus, sempre lotado em dias de jogo, desta vez sobravam cadeiras, os poucos que iam tentando explicar o porquê de ir a tal jogo.

O pessoal estava mesmo na praia!


Um deles me disse “é sempre melhor sofrer perto de quem ama”. Falo sofrer mesmo, porque o Bahia vinha dando a sua torcida uma serie de fracassos que tornaram a imensa e feliz nação, então na terceirona,  numa espécie de romeiros penitentes que vagavam pelos estádios a suportar descensos, derrotas fragorosas e todo tipo de humilhação que só quem ama poderia suportar.
Esse ano talvez tenha sido um dos mais tristes da historia do Bahia, o segundo ano na Terceira Divisão do campeonato Brasileiro. E olhem que se iniciou até tranquilamente. Vínhamos como o melhor time, o acesso parecia certo, era só esperar. Chegamos à penúltima fase como o favorito do grupo, empatamos a primeira, vencemos a segunda e a terceira partida, somamos sete pontos. Faltava pouco pra chegar na fase final e a tristeza era rapidamente esquecida, as lagrimas secavam e brotava até mesmo um tímido sorriso. Mais quatro pontos e estaríamos lá.

                                         Até Ele apareceu!

O time vinha de didas nos devolveram a triste realidade que vivíamos, um time que vagava guiado pelas direções ultrapassadas e que tinha perdido todo o seu brilho, nem sua ingênua torcida acreditava mais, restaram poucos com coragem pra ir naquele fim de domingo.
“Todo sofrimento é pouco pra quem ama” . Como se  não bastasse o jogo em si, ainda tínhamos que torcer para que o segundo melhor time do grupo não fazer um gol dentro do seu próprio estádio, fato que até o momento ainda não havia acontecido, enquanto esperávamos uma goleada na Fonte Nova contra o Fast Club. É claro que contávamos com uma ajudazinha da "mala branca".

                               Tinha era torcedor protestando!


Lá dentro vimos um estádio vazio, pessoas rezando em silêncio, solitárias, dividindo uma com as outras a sua própria dor, confortando e sendo confortados. Lá fora poderíamos encontrar em qualquer canto, um radinho ligado com alguém calado do lado, olhar perdido, ouvido atento guiado pelo locutor que ao passar do tempo embargava mais a voz, era só emoção.
O tempo passava e nada de gol. Rolou o intervalo e mais sofrimento. Chegou ao fim do tempo regulamentar o Bahia atacava e nada.  Só aos cinquenta minutos é que o lateral do bahia foi à linha de fundo e cruzou pra Charles botar pra dentro do gol. A essa altura o locutor narrava o que nem ele acreditava, repetindo outras vezes pra se certificar que era verdade embalando aquele inicio de noite.

 
               Só o super-herói Charles pra resolver naquele dia!

Aí não interessou a pequenez do público pois a Fonte Nova se expandiu de tal ponto que coube toda a cidade nela, vendo-se nas ruas um pedaço daquele estádio, que não é só concreto e grama, é um pouco de cada um que perde sua identidade pra ser mais um ponto colorido na arquibancada. Coube um pedaço da Fonte Nova em cada abraço.
Já não se diferenciava cidade e estádio, naquela noite tudo foi uma coisa só, e mesmo na Terceirona, com uma direção que em nada engrandeceu o clube, a torcida provou nunca mudará, é fiel ao seu time  mesmo longe, acredita mesmo sem querer. Nesse doce dia de outubro, a memória mais marcante não ocorreu centro do estádio, mas fora dele.