sábado, 30 de outubro de 2010

Dia de cão na Fonte Nova


     

Galdino Antônio Ferreira da Silva
Financista, desportista e colaborador dos blogs História do Futebol, Futebol 80 e Memórias da Fonte Nova.                                                                                       
                              
Sabe aqueles dias que nada dá certo? Que tudo que nós fazemos não fica do jeito que desejamos e tudo vai por água abaixo? Vou contar aqui o que aconteceu com um jogador chamado “Guerreiro”. Atuava em 1978 como zagueiro e capitão de um clube pouco conhecido, a Associação Desportiva Guarani, mas que em 1946 conseguiu seu único título de campeão baiano.
Era um domingo e dia dois de julho, data da verdadeira independência do Brasil conseguida na Bahia 155 anos antes ás custas de muitas vidas. Nesse dia, iria acontecer o grande jogo Bahia e Corinthians pelo campeonato brasileiro, e que foi ganho pelo tricolor baiano por um a zero. Estávamos no tempo em que o público aguardava o jogo assistindo uma “preliminar”, e nela peleavam Guarani e Fluminense de Feira. Disputava-se na ocasião um torneio criado pela Federação Baiana de Futebol-FBF, pra manter em atividade os clubes que não disputavam o brasileiro. Este reunia equipes como Galícia, Ypiranga, Leônico, Redenção, Jequié e outras.
O jogo valia a classificação para as semifinais do torneio. Em Feira de Santana o Fluminense havia derrotado o Guarani por 3×2 e uma simples vitória por um gol de diferença dava a classificação ao time do bairro do Barbalho, apelidado assim por ser onde ficava a sede do clube.·.
Antônio Guerreiro é da família do musico Cid Guerreiro que fez como cantor e compositor. Além de ser jogador de futebol era também funcionário do Hospital Juliano Moreira, onde foi colega de meu pai. Assim, ele me convidou pra assistir o jogo. Disse que em Feira que ele não tinha podido ir, mas que neste domingo ele jogaria muito na Fonte Nova e levaria o Guarani para as semifinais.
No dia do jogo eu e meu primo Salvador chegamos mais cedo no estádio. O sol estava “a píno” por volta das 14 horas. Estavam presentes ainda outros amigos e parentes de Guerreiro que ele tinha convidado pra vê-lo jogar pela primeira vez na Fonte Nova. Apenas uma hora depois os times entram em campo. Vi em campo alguns jogadores que conhecia. No Fluminense jogava o lateral Edinho “Jacaré” e o ponta esquerda “Touro”. O primeiro veio a ser campeão brasileiro pelo Bahia dez anos depois, e o segundo ex-jogador do Vitória. No Guarani além do colega de meu pai Guerreiro, eu reconheci seu colega de zaga Berto (que hoje é revelador de jogadores, como Dante Bomfim, com passagem pelo Lille da França e Bélgica) e o atacante “Quizomba”.·.
O jogo começou “quente”. O Guarani partiu logo “pra cima” do Fluminense. Era muita pressão, mas nada de gols. À medida que o tempo passava os nervos dos jogadores iam ficando a flor da pele. E foi ai que começou o dia de cão do nosso amigo Guerreiro. Em um contra ataque do tricolor feirense Touro passa por ele aplicando um “drible da vaca” e abre o placar. Meu amigo tinha uma cabeleira parecida com a de Valderrama, o futuro craque da Colômbia, e estava muito afoito e nervoso com a situação. Gesticulava e gritava muito. Mas, perto do fim do primeiro tempo o Guarani consegue empatar o jogo.
Após o intervalo, mais animado, o Guarani voltou a ir “pra cima” do Flu, no entanto deixava espaços na defesa para os ataques de Touro, que era muito rápido. Num desses ataques Guerreiro entra duro no ponta esquerda e leva cartão amarelo. A partir daí nada mais deu certo para o nosso amigo que, com medo de ser expulso, era driblado com facilidade, errava passes e lançamentos.
Mesmo assim, lá perto dos trinta minutos, o time consegue “virar” o jogo marcando o segundo gol. A torcida do Bahia, que já enchia a velha Fonte para o jogo principal, comemorou, pois estava torcendo pro Guarani. Nos minutos finais os “touros do sertão” foi quem vieram “pra cima” a todo vapor. Mas num contra ataque do Guarani sua defesa comete pênalti. É delírio na Fonte Nova, pois todo mundo havia chegado.
                                      
Enquanto o time discute quem bate o pênalti Guerreiro não quer. Coloca a bola debaixo do braço e põe na marca de cal. É ele quem bate e pronto! O juiz apita e ele chuta a bola lá no Dique do Tororó, a léguas do gol de Mundinho. Deve ter sido o pior pênalti batido na Fonte Nova em 60 anos.
Mas o pior ainda estava por vir, acreditem! No lance seguinte ele segurou Touro na área e o juiz marcou outro pênalti, agora para o Fluminense. O tricolor feirense não tem pena convertendo a falta máxima. Agora a partida está 2 a 2. O resultado classificava os “touros do sertão”. Havia ainda alguns minutos desse jogo “emocionante”, mas nada dava mais certo para o Guarani.
Logo depois Guerreiro sai como louco para evitar um contra ataque do Flu e não vê o goleiro Doda fora do gol fazendo um gol contra. É o fim da picada e a “virada” do tricolor feirense! Pra completar o desastre, o Guarani dá a saída e o time perde a bola, quando Guerreiro entra duro no atacante Tatá do Fluminense sendo expulso de campo.
Era o dia de cão da vida de Antônio Guerreiro, o “xerife” da zaga e capitão do Guarani em sua estreia na Fonte Nova. Muitos anos depois ele ainda não conseguia esquecer-se desta partida.
Depois desse fiasco ele ainda conseguiu ser contratado pelo Redenção onde jogou até 1980, indo no ano posterior para o Botafogo local onde pendurou as chuteiras. Há, no entanto, amigos que quando o veem vem logo com aquele papo do jogo daquela tarde infeliz onde Guerreiro conseguiu:
tomar um “baile” de Touro, perder um pênalti, cometer outro, marcar um gol contra, e ser expulso
Este Record de ruindade nunca foi quebrado na Fonte Nova. Realmente, um dia pra esquecer!

*  Agradeçemos pelas imagens aos blogs copadomundo.uol.com.br e copa2010.ig.com.br.

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