O histórico ginásio demolido por causa de um estacionamento
Franklin de Carvalho Oliveira é um desportista. Integrou times de “aspirantes”, profissionais e do remo do EC Vitória. Foi jogador de vôlei e basquete. Neste esporte teria sido um dos melhores juízes do Brasil, atuando ainda por onze anos como dirigente da federação, assim como nos times da FUBE, do Olímpico e do 19º Batalhão de Caçadores. Como remador ele e seu irmão Zé Carvalho conquistaram títulos nas raias dos Tainheiros. Como jogador de basquete conseguiu um vice-campeonato brasileiro e um terceiro lugar. Foi ainda técnico do Olímpico e da seleção baiana de basquete.
Já postei outro artigo sobre esta ilustre figura que, além de ser desportista e engenheiro, é ainda meu pai. Ontem fui a seu apartamento no bairro de Brotas, fazer outra entrevista, agora sobre suas recordações do Ginásio Antônio Balbino, o “Balbininho”.
Devo dizer que meu pai completará no ano que vem 90 anos. Desta maneira, mesmo estando ainda bastante lúcido é natural que tenha dificuldade em se lembrar de detalhes das coisas, e confunda datas e pessoas. No entanto, não há quem não fique admirado da sua impressionante memória, que tenho explorado para a preservação da memória do complexo esportivo e educacional que marcou a Fonte Nova.
A vida de jogador de meu pai está concentrada entre o final das décadas de 30, (quando veio morar com seu irmão José Carvalho numa pensão no Gravatá) e 40 (quando já estava casado com minha mãe e tinha iniciado a sua atuação como engenheiro). Nos anos 50 cumpriria seus últimos anos como dirigente da federação, embora intensificasse sua atuação enquanto técnico e juiz .
Como aperitivo pedi-lhe para relembrar a primeira década. A entrevista concentrou-se no basquete, pois seria este quem marcaria suas lembranças do ginásio. Lembrou que antes do “Balbininho” só havia praticamente três quadras pra se jogar, a do Baiano de Tênis, a da Associação Atlética, e a do Instituto Central de Educação Isaías Alves - ICEIA. Lembra que uns oito times disputavam o campeonato estadual, entre eles, o Olímpico, a Associação, o Itapagipe e o Brasil.
O Brasil possuía grandes times de basquete e muitos vieram jogar aqui. No Rio de Janeiro todos os grandes clubes mantinham boas equipes de basquete, o Flamengo, o Fluminense, o Vasco da Gama e o Botafogo. Já em São Paulo a maioria dos clubes de hoje ainda não existiam ou não mantinham boas equipes. Lembra-se do Paulistano (atual São Paulo), do Syrio Libanês, da Portuguesa e do Palestra Itália.
Nesta época meu pai teve grandes momentos no Olímpico, no 19º BC e na Federação Baiana Universitária de Esportes – FUBE, aonde chegou a levantar diversos campeonatos estaduais, militares e, na área universitária, foi vice-campeão (perdendo só pra São Paulo) e terceiro lugar no campeonato brasileiro (em Minas Gerais). “Naquele tempo tinha vários campeonatos. O colegial, o do interior, o estadual, o militar, e o brasileiro.”
Afirma que houve um tempo que “não dava nem graça” disputar os dois primeiros. No campeonato militar, “o Exército só tomava “surra, o que chateava o capitão (ou tenente?)Leitão que dizia que agente tinha sorte”!”. Viajava todo ano com a FUBE, lembrando que, apesar de não ganhar, disputavam sempre o torneio por ter bom times. Além de obter campeonatos estaduais o Olímpico fez grandes jogos contra equipes “do Sul”. Lembra que “nós perdemos de surra do Flamengo”. É que o rubro negro carioca tinha um pivô genial e colocaram logo seu irmão José Carvalho para marca-lo.
“Zeca” disse pra gente
- Pode deixar!
- O cara deu um show em Carvalho, que “comeu” o maior suor!”
Continua suas lembranças.
Descontamos no campeão carioca, o Botafogo. O jogo foi no ICEIA, e na nossa torcida só tinha mulher (inclusive minha saudosa mãe Helena). Demos uma surra! Nunca esquecerei. Eles tinham Álvaro e Ademo na zaga.
Era ainda constantemente convocado pro “escrete” baiano junto de astros como “Àrabe” e do futuro empreiteiro Nilton Simas. Ressalta ainda a presença nesses momentos dos irmãos Gilberto e Nilton Moura Costa e “Zezé” e “Betinho” Catharino. O penúltimo seria, alguns anos mais tarde, presidente dos “anos de ouro” do EC Vitória na década de cinquenta. Aponta também o zagueiro Umbelino, Heber, “Índio”, “Lulu” e Angelim, que morreu tragicamente afogado na Praia de Armação durante estágio no 19º BC. Naquela época a federação baiana de basquete tinha meu pai, como diretor-técnico, Hélio Jacques na presidência e Álvaro Soares na tesouraria.
Franklin se lembra da inauguração do Ginásio Antônio Balbino. Afirma que foi feita com um jogo de basquete entre a seleção baiana e uma do Sul, não se lembrando se do Rio ou de São Paulo. Lefebvre, o melhor árbitro da época, foi o juiz. Na época meu pai ainda apitava, sendo inclusive constantemente convidado a jogos no Rio, “embora só ganhasse hospedagem e comida”.
Eu tenho a maior dor desse dia e lhe perguntei de chofre:
- Porque você não levou a gente?
- Era um perigo levar! Tava entupido! Senão eu não fazia nada! Ou ficava com vocês ou com os outros (o pessoal do basquete! Maria Helena (minha irmã mais velha) queria ir mas não foi possível!Eu tinha medo de virar porrada!
Se realmente foi nesse dia, eu, minha mãe, minha irmã, e meu irmão “Toinho”, perdemos a inauguração do ginásio Antônio Balbino.
As informações posteriores sobre o ginásio foram muito rarefeitas. Lembra que foi uma nova época para o basquete e muitos esportes. “A maioria dos jogos (de vôlei e basquete) passaram pro “Balbino”! Não pode precisar o número de jogos onde trabalhou ali como juiz. A muito custo lembrou de alguns de clubes do Rio contra os baianos: do Botafogo contra o Itapagipe e a Associação Atlética, e do Flamengo contra esta última e o Baiano de Tênis. Lembra que nesses anos o rubro negro carioca “tinha um time f.d.p.”.
Como a cidade tinha poucos grandes espaços o ginásio acabou sendo usado pra muitas outras atividades. Meu pai ainda apitou alguns campeonatos ali mas os anos 60 foram de muito trabalho pra ele. Mesmo assim, lembra que quando os Globe-trotters vieram em Salvador enfrentaram no “Balbininho” a seleção baiana (numa sexta feira) e a brasileira (no domingo.
Os jogos foram de exibição mas a equipe americana deu uma “surra””! O primeiro jogo foi apitado pelo Mário Cruz, mas o segundo, o principal, o foi por mim e por Carvalho (seu irmão também juiz).
Na ocasião meu pai já era um empreiteiro de “mão cheia” e pegava obras importantes. Como ele diz: “não tinha tempo, vivia no interior”! Tio “Zeca” também o acompanharia nesta área mantendo os irmãos uma sociedade na Empresa Baiana de Construção Civil Ltda. – EMBACIL, que seria uma das que estariam presentes na obra de ampliação da Fonte Nova.
Nos anos 70 meu pai nos levou pra ver a luta onde Eder Jofre manteria o título mundial contra um mexicano, e, mais tarde, a uma luta livre que não me lembro quem participava. A última vez que entrou no ginásio, porém, foi sozinho, nos anos 90, em um jogo de vôlei feminino onde jogaram as meninas da seleção brasileira.
Encerrei a entrevista perguntando-lhe o que achou da demolição do Ginásio Antônio Balbino pra fazer um estacionamento para a arena da Copa de 2014. Ao que ele respondeu:
- Não havia necessidade! O “Balbininho” estava bem, integral, estava funcionando perfeitamente bem. Podia estar precisando de limpeza, mas isso sempre teve, manutenção. Foi o que não ocorreu na Fonte Nova! O que ocorre é que este moço (o governador Wagner) veio do Rio e precisou mostrar serviço. Aí derrubou o “Balbininho” e a Fonte Nova. Quem construiu (os governadores Octávio Mangabeira e Antônio Balbino) já morreu. Ele (ACM), apesar de ser um bom f.d.p., não deixaria derrubar, mas também já morreu! Ele (Wagner) ficou solto! Além disso ele é Bahia, e está protegendo o Bahia!”
Nesse instante meu pai lembra de todas as dificuldades que passou durante as obras do anel superior do estádio quando sua pequena firma demorava a receber o pagamento do governo do estado e teve que fazer desconto pra receber. Sabe que a obra agora está a cargo de grandes empresas como a OAS e a Odebrecht (esta desde a obra anterior), mas no entanto, faz um alerta aos seus antigos colegas:
Eu só quero ver quando chegar a hora das faturas, do pagamento das empreiteiras, pra ver se eles vão ficar como eu ficava. E aí os homens diziam que “não tinha dinheiro”. Agente tinha que correr pro banco. Nilton Simas morreu do coração pois estava devendo no BANEB. Foi a ACM pedir o pagamento da sua empresa, a Companhia Construtora Nacional, e lhe mandaram passar no caixa. Quando ele chegou lá embaixo o chefe de gabinete mostrou os títulos todos protestados.
Diz que chegou a conversar com o próprio governador Luiz Viana Filho na época. A audiência teve o acompanhamento de Artur Ferreira (membro da comissão de construção e engenheiro do Departamento de Educação do estado) e de Genar (diretor da COELBA e presidente da comissão de construção). Na ocasião o governador lhe perguntou se “sua firma aguenta tombo”. “Eu não sabia o que era isto, e disse: “Depende sua excelência”! Quando saí perguntei a Genar o que ele queria dizer com aquilo e este me disse que era “falta de pagamento”. Conclui que, na situação em que estava e com a raiva que sentia, “se eu soubesse disso, teria dito: Tombo quem aguenta é sua mãe!”
* Agradeço aos blogs atarde.com.br, semprebahia.com e 435eventos.com.
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