domingo, 19 de dezembro de 2010

A Fonte Nova na era da "virada de mesa"

                                        
Quarta feira próxima estarei indo com minha companheira Cybele para Buenos Aires passar as festas de fim de ano. Acho que temos direitos a umas feriazinhas não? Já fomos lá duas vezes e gostamos muito, ao contrário daqueles que falam mal dos hermanos. Mas o pessoal que já está viciado em acessar o meu blog não se preocupe. Preparei vários artigos pra ir colocando diariamente. Bem, mas vamos ao assunto de hoje, a “virada de mesa”.
Meus leitores de outros países certamente nunca ouviram falar nisto. Acho que fora do Brasil não deve ter estas coisas! Como já são mais de trezentos acessos do exterior tenho que explicar que no Brasil ocorre de tudo no futebol(e também na política!). São resultados estranhos, juízes encomendados, descumprimento dos regulamentos, maracutaias na tabela, jogos debaixo do sol ou na madrugada, entre outras cositas mas. Aqui, durante muitos anos, prevaleceu a prática de “virar a mesa” quando os resultados em campo não atenderam aos grandes clubes do Sul-Sudeste.
O artigo de hoje é da “última” virada de mesa (vamos bater na mesa!)do futebol brasileiro, em 2000, beneficiando o Fluminense, o EC Bahia e outros menos votados.  Na época vigorava um acordo para que os clubes só apelassem para a Justiça Desportiva sem recorrer a Justiça comum. Ou seja, no país um clube podia ser punido se recorresse a própria Justiça(sic!). Queiram desculpar o patriotismo, mas é mais uma contribuição inédita do nosso país para a civilização.
Mas voltemos ao “campeonato brasileiro” de 2000. Nos anos anteriores haviam sido rebaixados clubes como o Gama(BSB), o Bahia e o Fluminense. Este último chegou a cair para a terceira divisão mas havia conseguido no ano anterior subir para a Segunda. O clube de Brasília porém, decidiu quebrar o pacto informal entrando na Justiça. Aí foi a maior confusão pois sofreu toda sorte de punição, inclusive da FIFA que decidiu banir o clube do futebol(!). Mas o Gama não estava nem aí, inclusive pelo respaldo que tinha do conservador Partido da Frente Liberal-PFL. O processo durou meses e agitou os rebaixados nos últimos anos que se moviam nos bastidores esperando tirar proveito da situação.
                                                   Um dos muitos protestos na ocasião
A brecha veio pouco antes de começar o certame em julho daquele ano, quando a CBF(preocupada com a possibilidade da vitória do Gama e de que outros clubes seguirem o exemplo) transferiu o certame de malas e bagagens para o Clube “dos Treze”, outra criativa invenção brasileira. Esta “entidade”, finalmente de posse do nosso maior campeonato, promoveu todo tipo de bandalheira e politicagem visando se fortalecer politicamente. Nunca se viu tanto desplante em um campeonato! Pra vocês terem uma ideia, nem a ditadura do almirante Heleno Nunes na CBD  conseguiu empurrar tantos clubes num certame, 116.
O “Campeonato Brasileiro” de 2000 foi um escândalo, tendo o “regulamento” esportivo mais desmoralizante da história mundial. ´Como não se podia falar em divisões dividiram os clubes em “módulos”, azul, amarelo, verde e branco. E o mais absurdo é que se fez regras, número de clubes, e fases diferentes dentro do mesmo campeonato.
Imaginem que o módulo azul tinha 25 clubes, que disputavam uma só fase onde se jogava todos contra todos classificando doze diretamente para as finais. Já o módulo amarelo tinha 36 clubes subdivididos em dois grupos(!), jogando apenas dentro desses para classificar um número diferente, oito!
                                                   Será que "rolou grana"?Não acredito!
Vá conferindo os absurdos. Com os módulos verde e branco a situação era ainda mais esdrúxula. Havia 28 clubes em um e 27 em outro. No verde eram quatro grupos de sete e um de seis clubes, mas no branco eram três grupos de sete  e um de seis. O pessoal só jogava dentro do grupo mas, diferente do primeiro grupo, em turno e retorno. Está conseguindo acompanhar? Enquanto o grupo azul só tinha uma fase(!), esses grupos tinham quatro. Durma-se com um barulho desses!
Mas o mais inusitado ainda viria nas finais, quando se revelava a “armação” que mostrava que os módulos amarelo, verde e branco eram só pra constar. É que, enquanto se classificavam para aquelas doze do módulo azul, tinham o mesmo direito apenas três clubes do módulo amarelo. Sobrava uma vaga pra ser disputada pelos módulos verde e branco(sic!). Nesta fase mudava-se totalmente o critério, passando-se de pontos corridos para o “mata-mata”, nas oitavas, quartas, semi finais e final. Para “puxar o saco” de João Havelange, brasileiro que foi um histórico dirigente da FIFA, deram seu nome a esta esculhambação.
Os clubes baianos participaram de todas essas maracutaias e até se beneficiaram dela. A dupla BA-VI seria incluída do módulo azul(uma espécie de primeira divisão oficiosa). Foi o único ano que o Juazeiro participou de um campeonato brasileiro da Primeira Divisão.  O tricolor, que contava disputar a segunda divisão em 2000, acabou ficando junto com os melhores clubes do país e reforçando o seu caixa.
                                                         A mesa literalmente virada
A Fonte Nova sofreu com tanta falta de ética e predomínio de interesses menores que envergonharam o futebol brasileiro. Nesse ano foram realizadas ali treze partidas pelo “campeonato brasileiro”, ficando as restante para o “Barradão” e o estádio de Juazeiro. Por coincidência o Clube dos Treze colocou os beneficiados Bahia e Fluminense na rodada de abertura do certame. O Bahia começaria mal fora de casa, perdendo no Maracanâ para o tricolor carioca por dois a zero.
O resultado é que um publico de apenas seis mil pagantes compareceu no dia 2 de agosto a Fonte Nova para ver a estreia vitoriosa do Bahia contra o Atlético Paranaense. Na época jogavam no tricolor figuras como Emerson, Jorge Vagner, Jajá(lembram-se?) e Bebeto Campos e seu técnico era Evaristo de Macedo, que venceriam com gols de Luís Caros Capixaba e Dedé, contra o marcado pelo meia Perdigão.
Após conseguir um bom empate sem gols contra o Atlético Mineiro fora de casa o tricolor voltou a jogar em casa, agora contra o Grêmio Porto Alegrense, empatando em um gol.  Na ocasião o público já foi o dobro. O esquadrão de aço, que ainda não havia convencido a sua torcida, conseguiria uma boa vitória fora de casa contra o famoso Gama por um a zero com gol de Jajá. No mesmo embalo de viagem colheria outro bom resultado ao empatar com o tricolor paulista no Morumbi.
                                                          Oh entidade respeitável!
Desta maneira uma boa expectativa cercou suas duas próximas partidas, que seriam realizadas na Fonte Nova, contra Cruzeiro e Santa Cruz. À primeira acorreram dezesseis mil torcedores para ver um dia infeliz do esquadrão de aço. Dedé assinalaria o gol tricolor mas Jackson, Ricardinho e o baiano Oséas liquidariam a fatura para o time estrelado. Já o tricolor do Arruda vinha mal das pernas, ficando neste ano com a lanterna do módulo azul já antevendo a maior crise de sua história que lhe levaria para a Quarta Divisão. Mesmo assim o time de Renê Simões vendeu caro a derrota para o tricolor baiano, que acabou vindo por três a dois com gols de Dedé dois e Jorge Vagner contra dois de Robson.
Após outra boa apresentação fora de casa a torcida acorreu em massa a Fonte Nova onde seriam realizados dois clássicos seguidos, contra o Vasco da Gama e contra o Flamengo. Estes registrariam o melhor momento do tricolor no certame quando derrotaria os cariocas por 3 X 1 e 4 X 1. Felipe Alvim, Capixaba e Jajá marcariam contra Felipe do Vasco, e Jajá endoidaria, fazendo três gols e levando o tricolor a um resultado histórico, completado pelo zagueiro Jean. Para o Flamengo de Petkovic, Adriano e Edilson marcou Denilson.
A nova saída do tricolor, porém, seria um desastre, caindo para o Sport na Ilha do Retiro por três a zero. Isto levou apenas 64.000 pagantes para a Fonte Nova, mas que veriam a vitória tricolor por um a zero, graças ao gol de Iranildo. E olhe que o rubro negro na ocasião era dirigido pelo técnico Ricardo Gomes e contava com jogadores como Fernando(que jogou no campeonato deste ano), Sinval, Juninho Petrolina e Bebeto. 
Após nova saída e empate em Campinas o tricolor venceria o Corinthians no nosso histórico estádio por dois a um, com gols de Jean e Marcos Chaves contra o de João Carlos. O certame entrava em momentos decisivos e o Bahia lutava pela classificação. No entanto perde em casa para a Ponte Preta, dirigida por Nelsinho Batista, por dois a um, assinalando os gols da “macaca” Hernani e Claudinho contra o gol solitário tricolor de Jorge Vagner.


Mas logo após viria uma vitória sensacional no “alçapão” da Vila Belmiro contra o Santos pelo escore mínimo. Parecia então assegurada a classificação do Bahia, particularmente em função de apenas um dos cinco jogos restantes se realizar fora de casa. Mesmo assim o tricolor iria “ralar” pelo 12º lugar. O Botafogo cairia sem maiores dificuldades por dois a zero(gols de Jefferson e Jorge Vagner), mas o América Mineiro deu mais trabalho. Num jogo muito disputado, onde ocorreram três expulsões, o Bahia venceria por dois a um, marcando Wagner e Dedé contra Zé Afonso. Justifica-se, naquela época os mineiros eram dirigidos por Jair Pereira e tinham jogadores como Wellington Amorim, Sorato e Pintado.
A partida contra o Palmeiras deveria garantir a classificação para a fase final, por estar o “verdão” concorrendo com o tricolor pela vaga. Assim pensando, acorreram ao estádio mais de 45 mil torcedores. Mas o Bahia jogaria a chance fora perdendo por dois a um para a equipe de Marco Aurélio, pontuando de novo Jorge Vagner contra Juninho e Tuta. Este e o goleiro Sérgio vestiriam mais tarde a camisa do Vitória.
O resultado colocava novamente em discussão os dois últimos classificados do “módulo azul” entre Bahia, Palmeiras e Guarani. O Bahia precisava de pontos. Conseguiu um fora de casa contra o Juventude e todos esperavam o carimbo do passaporte no jogo contra o Goiais na Fonte Nova. Deve ter sido um dos maiores públicos do clube goiano em certames nacionais, 42.000 torcedores.

                                                            Nós merecemos mesmo!
O esquadrão de aço jogava de olho no jogo de São Paulo entre Palmeiras e Guarani onde, para o cúmulo da sorte, ambos precisavam do resultado, criando dificuldades para as conhecidas “malas” entrarem em campo. Mas os goianos não podiam ser desprezados, vinham com o técnico Hélio dos Anjos(aquele que acaba de participar da maior “lambança” do Internacional em Abu Dabi)e com um ataque onde pontificava Fernandão e o campeão brasileiro Evair. O “verdão” ganharia por dois a zero, ainda bem, pois o Bahia conseguiria perder para os goianos em plena Fonte Nova, com um gol de Araújo.  No final o Palmeiras ficaria com 37, o Bahia com 35 e o Guarani com 34. O Vitória ficando apenas com 31 pontos, o que lhe deixaria em decimo oitavo lugar.
Um “campeonato” desses só podia acabar mal. Não deu outra coisa nas finais quando jogaram Vasco da Gama e São Caetano. A primeira partida realizada em São Paulo tinha acabado em empate em um gol. Já a segunda partida foi estranhamente transferida do Maracanã para São Januário prejudicando o clube paulista. Na ocasião enfiaram gente além da capacidade do estádio e que se acotovelaram pra ver o jogo decisivo. O resultado é que com vinte minutos de jogo cedeu parte da grade das arquibancadas causando pânico e levando a invasão de campo e a centenas de feridos.
O regulamento era claro. O time que desse causa a tal tipo de situação teria que perder os pontos. Mas isso é aí no exterior onde vocês estão e não no Brasil! Aqui se reuniram dirigentes, federações, CBF, e o diabo e se resolveu com outro jogo, agora no Maracanâ, onde o São Caetano conseguiu  perder o título por três a um. O Vasco ganhava assim seu quatro título nacional e o terceiro torneio com o nome de João Havelange(sic!).
Quanto a Copa ou Torneio João Havelange se extinguiria. Nunca mais teríamos o desprazer de ver o malfadado Clube dos Treze organizar outro campeonato, embora Fábio Koff esteja aí até hoje. Como disseram dirigentes esportivos na época o torneio “nasceu condenado”. Quanto ao Gama voltaria para a Segunda Divisão, o mesmo não acontecendo com os também rebaixados Fluminense e Bahia que ficaram no certame do próximo ano.

·         Agradeço as informações da Folha on line, dos sites do Flamengo, Wikipédia e netvasco, e do blog futipédia.globo.com. Sou grato ainda as imagens dos blogs forumetelevisão, lanceactivo,pensamentosequivocados,wp.clicrbs.com.br,spsegunda.bmp e racazulavai.futblog.com.br.

Nenhum comentário:

Postar um comentário