quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Um desastre baiano


Você sabia que a Bahia já esteve no Norte? Isso é coisa de antigamente quando no Brasil existia apenas Norte e Sul.  Até hoje ainda existe gente que diz, quando alguém viaja pro Rio ou São Paulo, que está indo pro “Sul”! As regiões do Brasil foram definidas somente na Constituição de 1946 como Norte, Sul, Nordeste, Sudeste e Centro - Oeste.  Ainda levaria, porém, algum tempo para retirar Minas Gerais (?) de sua companhia e o Nordeste ficar com a sua atual formação de nove estados. Foi por essas e outras que meu ex-professor Durval Muniz de Albuquerque escreveu o livro A invenção do Nordeste.
Bem, no futebol, como você sabe, acontecem coisas incríveis. Uma delas foi o Nordeste surgir antes de ser criado! Em 1923 organizaram tal de “Troféu Nordeste” que só contou com Paraíba, Alagoas, Bahia e Pernambuco. No entanto foram profetas ao escolher estados que só no futuro fariam parte da nova região. Quem ganhou este torneio foi o CSA de Alagoas. Quanto à Bahia, representada por Vitória e Botafogo, não foi nada bem. O segundo ainda se classificaria para as finais mas desistiria de disputar (sic!). Será que não gostou de ficar no Nordeste?
No mesmo ano em que foi aprovada a nova divisão territorial nacional foi organizada a Copa Cidade de Natal, mas aí só convidariam Rio Grande do Norte, Paraíba, Ceará e Pernambuco deixando de fora a Bahia. Sacanagem! Em 1948, no ano em que eu nasci, organizaram um Torneio dos Campeões do Nordeste a ser realizado em Recife. Agora chamaram a Bahia, mas os jogos aconteceriam em Recife. Na ocasião participaram ainda Paraíba (dois clubes), Rio Grande do Norte, Ceará e Pernambuco. O campeão EC Bahia seria quem iria representar os baianos. E se houve muito bem, ganhando do Treze (3 X 0) e do Santa Cruz (1 X 0) e levando o primeiro desses torneios para o estado. Neste ano também organizaram um Torneio dos Campeões dos Campeões do Norte onde, onde se ignorava a decisão constitucional, com a inclusão de clubes do Nordeste.
Quatro anos depois haveria uma nova edição do Torneio dos Campeões do Nordeste, só que no mesmo lugar. Desta vez quem iria representando a Bahia seria o Ypiranga, campeão do ano anterior. O time até se classificaria para as semifinais, passando pelo Ceará (3 X 2) mas esbarraria no Tuna Luso (0 x 1) que perderia a final contra o Náutico. Pronto, os pernambucanos haviam ganhou o torneio, que, estranhamente, acabou!
Depois deste seriam organizados uma série de torneios regionais, embora nem sempre levassem este nome e continuassem confundindo Norte e Nordeste. Mas o campo já estava começando a se definir em matéria territorial.
                                                          O beato Antonio Conslheiro
Ufa! Até que enfim cheguei ao assunto do dia de hoje, a Copa dos Campeões do Norte em 1966. O certame tinha como referência a Taça Brasil, torneio que antecedeu a Copa do Brasil, e sobreviveu entre 1959 e 1968. Nele participavam apenas os campeões estaduais, divididos por regiões, no que hoje chamamos de “chaves” e que antigamente chamavam de grupos. Havia, portanto, um grupo onde através do “mata - mata”, os clubes do Nordeste iam se eliminando para a segunda fase.
Participaram então o Bahia, único a ganhar o grupo por três vezes, em 1959, 1961 e 1963, (que coincidiu com às vezes em que foi finalista do certame) além de Fortaleza, Sport, Ceará e Náutico, que haviam ganhado o grupo apenas uma vez. A desvantagem era evidente e o torneio parecia uma verdadeira “barbada”. No entanto, as coisas não correriam como se esperava. Esquecia-se que o tricolor não estava em boa fase. No campeonato de 1965 que ainda transcorria, o clube havia ficado em quinto lugar nos dois turnos, e só ganharia cinco partidas. Um fator que eu acho decisivo foi à crise do futebol baiano que apresentava um boicote organizado da imprensa. Esta situação chegou ao ponto de não transmitirem as finais do campeonato de 1965, realizadas entre Vitória X Botafogo, onde o rubro negro se sagraria bicampeão.  
Mas também contou a disputa dos dois torneios, campeonato baiano e Copa dos Campeões, ao mesmo tempo. O esquadrão de aço começou o segundo desastradamente, perdendo para o Sport na Fonte Nova pelo escore mínimo. Dois dias depois já jogava e vencia o Guarany pelo campeonato. No dia 9 de fevereiro ganharia do Galícia parecendo que iria encetar uma reação no certame baiano. Quatro dias depois porém, nova derrota na copa, deste vez para o Náutico ainda por um a zero.
                                                     

Graças a Deus a copa pararia para o carnaval! O recomeço seria diferente com o tricolor honrando suas glórias na Taça Brasil, mas...não deu! E eis que, no dia 3 de março, perde para o Fortaleza por três a um na Fonte Nova. Agora a urucubaca se projetaria para o campeonato onde empataria com o Ypiranga por um a um três dias depois. Em mais três dias acumularia a quarta derrota na copa ao perder também para o Ceará por dois a um!
Era o caos! E este desempenho chamou a atenção de todos. Não era possível. Quatro jogos na Fonte Nova e quatro derrotas do Bahia! Não tinha cabimento nem precedentes! Pra piorar o clube jogaria agora somente fora de casa. Começa então a se formar uma corrente para a heroica reação. Por que não? O tricolor já tinha superado muitas situações adversas no passado, e esta seria apenas mais uma. O pessoal fazia as contas. Se o clube ganhasse as três partidas que faltavam seria campeão da Copa dos Campeões do Norte.
Aí o sofrido Bahia, sem qualquer divulgação, viaja para Recife para jogar com o Sport e... perde novamente, agora por dois a um. Agora não tinha conta que desse jeito pro Bahia ser campeão. O objetivo então mudou para uma “colocação honrosa”. Que lugar era isto seria o terceiro? Ninguém sabe! No retorno apresentaria melhoras, empatando com o Botafogo (1 X 1) que vinha então em fase extraordinária. Pelo menos tinha parado de perder no campeonato baiano.

Todas as expectativas se voltaram então para o Ceará, onde o esquadrão de aço iria disputar suas últimas partidas. Havia porém, um problema, a data da partida. Esta, havia sido marcada para 31 de março, para “comemoração” dos dois anos do golpe de 64. Teve solenidade e tudo constrangendo alguns jogadores do time tricolor! Talvez tenha sido por isto que o clube teve a sua maior derrota no certame, três a zero! Os jogadores ainda reuniriam energias para a despedida, três dias depois, ao empatar com o Fortaleza (1 X 1) ganhando seu único ponto na copa. Logo depois, um clássico pernambucano, Náutico e Sport, decidiria quem ficaria com o título, o alvi rubro dos Aflitos.  Quanto à “colocação honrosa”, vamos deixar pra lá, pois o Bahia acabou em último lugar!
Somente no final desta década é que começaram a organizar torneios nordestinos com muitos clubes e nos moldes do campeonato atual. Depois da Copa Norte veio a Copa Norte-Nordeste que sobreviveu a três edições, mas que não teria muito brilho dos clubes baianos. Ela foi ganha por Sport, Ceará e Fortaleza.  A Bahia não participou da primeira edição mas logo depois pelo menos o Galícia, que havia sido campeão do estado em 1968, se destacou, disputando junto com o Feira Tênis Clube (!). O azulino passaria por todas as fases só deixando de ir á decisão contra o Ceará porque o Sport teve melhor campanha em sua chave. Em 1970, em companhia de Botafogo, Vitória e Ypiranga, também se sairia bem ficando em quarto lugar.
Mas foi só quando as coisas se fixaram na região é que os baianos iriam melhorar. Foi o caso da Copa do Nordeste, ganha em 1973 pelo América de Natal e, em, 1976 pelo EC Vitória. Em 1994 teríamos um Torneio do Nordeste, vencido pelo Sport, e, três anos depois, começaria a Copa do Nordeste que antecedeu o Campeonato do Nordeste. Esta copa foi o certame que mais durou sendo organizada por sete anos seguidos, entre 1997 e 2003. O Vitória se constituiu como seu grande campeão, ganhando três títulos e ficando para a decisão em mais três. Logo depois vem o EC Bahia com dois títulos e o Sport e o América de Natal com um. Em meio à aguda discussão dos calendários obrigatórios da CBF a copa não resistiu e foi parar na justiça, quando, um acordo possibilitou que voltasse a ser organizada neste ano de 2010.
Escrevo este artigo comemorando a Vitória do meu clube na primeira vez que um torneio na região se transformaria num verdadeiro campeonato. Quanto a aquela Copa dos Campeões do Norte em 1966 é melhor apagar da história da Bahia.

·          Agradeço as informações dos sites sempre Bahia e granadeiros azulinos, do blog RSSF Brasil, e as imagens dos blogs panteracordelaria.blogspot.com, amunico.com.br, eduhistoriador.blogspot.com e oguiageografico.wordpress.com.

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