domingo, 30 de janeiro de 2011

Um ano de quadrilhas na Fonte Nova


Ontem fui assistir a um filme, O turista, que me trouxe muitas recordações. Pra não perder o costume, durante a estirada com Cybele e meus amigos Wellington e Raimundo, aproveitei pra colher subsídios pro artigo de hoje. Na verdade o filme não é lá essas coisas. É uma aventura de intrigas e romance onde o Departamento de Crimes Financeiros da polícia persegue o misterioso Alexandre Pierse, e seu roteiro inverossímil presta-se mais a enganar o público do que aos perseguidores. Segue a receita de outros como Comer, rezar e amar. Esta é muito simples: pega-se uma atriz famosa(no caso Angeline Jolie) e roda-se cenas em cidades muito visitadas. O de ontem tem sua parte inicial rodada em Paris mas o grosso se passa em Veneza.
Posso dizer que o modêlo funcionou conosco, pois o escolhemos justamente por ter seu pano de fundo na cidade onde estivemos por quatro dias em junho de 2009. E não nos decepcionamos com a bela fotografia do filme. É claro que fomos num trem mais “peba” que o de Angelina Jolie e Johnny Deep. Mas eles chegaram na mesma estação ferroviária do que nós, a Santa Lucia. Ao ver as suas escadas e os pontos de embarque dos vaporettis lembrei-me das dificuldades que tivemos com o monte de malas que Cybele levou.
Mas a gloria mesmo foi ver os protagonistas do filme chegarem no hotel. É claro que não ficamos no mesmo que não é pro nosso “bico”, mas ficamos alí pertinho, do outro lado da ponte de Rialto no Gran Canal. Adoramos ainda rever a Piazza San Marco, o cais do aeroporto, as lanchas(que não tivemos dinheiro pra pegar) e as gôndolas(onde morri de medo num passeio romântico),entre uma e outra perseguição nos telhados e em alguns canais da cidade. Foi realmente uma sessão saudade! Mas vamos ao que interessa, o artigo de hoje sobre o torneio realizado na Fonte Nova no período de festas importantes importantes para os cristãos.
                                                                  Ah que delícia!
As festas juninas estão no calendário ocidental desde a tradição pagã.  O período em que elas ocorrem sempre foi consagrado á Igreja.  Hoje está tudo diferente. Poucos lugares preservam as tradições, e já se esqueceram do São João de antigamente. Chega-se ao cúmulo de reunir o pessoal em volta de um palco ou de um trio elétrico e tocar um “forró” estilizado, adaptando as músicas da festa ao axé music.
Até a formação musical tradicional desapareceu. Primeiro foi-se o triângulo, depois o zabumba, substituídos pela bateria e percussão, e agora até o acordeon está sendo substituído pelo órgão. Nas barracas é a mesma coisa. Não se acha os alimentos e bebidas tradicionais comendo mesmo o que se compra nos supermercados. Proibiram os balões e os fogos são rigidamente controlados alegando questões de segurança.
É preciso falar de um tempo onde o São João era uma festa solidária e familiar. Era uma época onde se entrava livremente na casa de desconhecidos pra tomar licor e comer paçoca, pé de moleque, arroz doce, canjica, amendoim torrado, milho, rapadura e doce de abóbora. E ninguém tinha medo dos visitantes! Na ocasião não se servia cerveja mas nunca faltava jenipapo e os vizinhos competiam fazendo infusões com outros sabores. Minha sogra fazia o aluá porque não tomávamos quentão nem gostávamos muito de vinho quente.

Mas era na porta de casa mesmo que a coisa rolava. Não éramos muito de enfeitar a rua mas havia gente que se encarregava de colocar as bandeirolas. Fazíamos uma fogueira onde colocávamos o milho e o amendoim  pra assar, se tirava sorte (com umas mensagens bestinhas!), e se fazia simpatias casamenteiras. Algumas casas colocavam uma árvore no meio da fogueira onde havia prendas que o pessoal corria pra pegar quando o fogo apagava. Havia também o “pau de sebo” nestas ocasiões, embora este ocorresse também em outras festas. Funcionava assim, arranjava-se um pau grosso e grande, passava-se sebo de boi ou de carneiro, e depois se espetava no chão colocando no alto um bocado de presentes e doces. Aí o pessoal fazia de tudo pra subir pra tirar as coisas e não conseguia.
Meu pai comprava fogos nas casas que haviam em Agua de meninos, e tinha de tudo, cobrinha, chuvinha, busca pé, traques de massa, foguetes e adrianinos. Era uma festa lá em casa quando ele chegava com as caixas de fogos. Mas havia uma hierarquia no uso deles. Tinha os mais pesados, como fogos de artifício, vulcões, espadas, morteiros, rojões e bombas grandes só pra os adultos. Enquanto os meninos como nós só tínhamos direito aos e, ó máximo, aos adrianinos. Só fui comprar as mais pesadas quando fiquei mais velho.
Os balões eram uma festa á parte. Tinha dos grandes, dos médios e dos pequenos. De tudo quanto era material, seda, sacos de cimento e até papéis de embrulho. O espetáculo mesmo era botá-los pra subir tendo que acender a bucha que ficava na boca do balão e era feita de arame.  No meu tempo o trio que tocava era o trio nordestino. Dançávamos xote, xaxado e baião, dentro e fora das quadrilhas. Lembro-me que depois teve até concurso no “Balbininho” promovido pela TV Aratu onde os bairros participavam. 
                                                                 Olhe aí o culpado!
Sou do tempo em que se parava tudo pra comemorar o São João. Mas vi a descaracterização do São João começar também no futebol. É por isto que vou contar hoje o ano em que o futebol baiano desrespeitou estas conve4nções e marcou um torneio durante o São João de junho de 1960.
É claro que não era culpa da Fonte Nova. Afinal, não era ela que fazia a programação dos jogos. Dizem que ficou alguns dias sem dormir quando soube do certame que não tinha outro objetivo a não ser “caçar-níquel” antes da excursão da dupla BA-VI a Europa aproveitando que o Campeonato Baiano estava entre um turno e outro. Na ocasião foram convidados Bahia, Galícia, Ypiranga e Sport Clube Recife. 
O Galícia era o menos culpado dessa situação, apesar de na região da Galícia também se comemorar o São João. O torneio começou no dia 25 de junho, dia consagrado a São Próspero, e que cái logo após a principal festa de São João. Na rodada, entretanto, já se sentia o odor da bebida, no hálito da meia dúzia de fanáticos que compareceram. E, se isto havia nas arquibancadas, imaginem no gramado, onde houve jogadores que pronunciavam palavras sem nexo. Só não "rolava" os namoricos pois neste tempo quase não havia mulher na Fonte Nova.
Quando os times entraram em campo mas pareciam quadrilhas de São João. Só não dançaram muito juntos errando muitos passes. Na ocasião, os jogadores mais afetados com o clima joanino foram os do próprio azulino que acabaram “dando chabú” perdendo pro Bahia na preliminar por quatro a um, enquanto houve empate no jogo principal entre Ypiranga e o Sport. A segunda rodada estava marcada para o outro dia e a imprensa fez o possível pra divulga-la. Mas veio menos gente ainda embora houvessem dois clássicos nordestinos, onde Galícia e Ypiranga fizeram a preliminar de Bahia e Sport.
                                                     Agente vivia atrás desses fogos!
O Galícia continuaria em sua via crucis agora perdendo de três a zero do auri negro, enquanto o tricolor ganhava de forma convincente para os pernambucanos por três a um. O jogo terminou com o estádio praticamente ás escuras mais parecendo que Santo Antônio, São Pedro e São João fizeram uma combinação pra tirar a luz do firmamento, como observaram Herivelton Martins e Alcebíades Barcelos.
No outro dia, porém, estabeleceu-se a crise no torneio. Os pernambucanos, sem chances de levar a taça, não aceitaram fazer a preliminar com o ex-demolidor de campeões. A discussão acabou rendendo e o torneio acabou se encerrando apenas no dia 30 de junho, consagrado aos primeiros mártires da Igreja, que foram acusados do incêndio de Roma. O que era pra ser rodada dupla acabou se reduzindo a apenas um jogo, onde o tricolor só queria incendiar a sua torcida e o auri negro ganhar o primeiro título no estádio. A partida foi muito disputada, sendo que nas arquibancadas havia um duelo a parte de rojões morteiros e fogos de artifício. Mas no final o placar acusou Bahia dois, Ypiranga zero.

Teve gente que saiu “bebum”. A própria Fonte Nova teve que provar do licor que escorria da própria tribuna de honra. Mas, o outro dia era de branco e todo mundo tinha de trabalhar. Foi assim a festa do futebol e São João.

·      Agradeço aa informações dos sites RSSF Brasil, Luna e amigos, educação.uol.com.br e Cinepop e as lembranças de Wellington, Cybele, Thelma e Raimundo. Sou grato também as imagens dos blogs:lenilsonazevedo.com, cabenoseubolso.wordpress.com,acessa.com,blogalize.net,photoindustrial.com,revistadecifreme.com,prdagente.pr.gov.br e fashionbubbles.com. 

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