sábado, 9 de abril de 2011

Diário de uma paixão



Diário de uma paixão é o nome de um livro que está dando o que falar. Fala de um amor que sobreviveu ao próprio tempo e as intrigas da família. A história não é nenhuma novidade, mas seu autor Nicholas Sparks sabe conta-la de modo a suscitar emoções dos leitores. Fala de dois jovens que se conhecem num parque de diversões e se apaixonam. Mas a família dela não quer o namoro e acabava mandando a filha pra longe.

A partir daí tem início uma conspiração para esconder as cartas que Noah envia durante sete anos. A resistência de Allie só é quebrada, pois pensa que foi esquecida.  A moça reconstrói sua vida e, quando se encontra sob a aparente segurança de uma nova família, eis que volta a encontrar sua primeira paixão. Não vou contar o final, mas vocês podem imaginar a difícil escolha de Allie.

Mas o que Sparks não sabe é que houve uma história parecida na Bahia há muito tempo, em 1966, quando tentaram separar o Vitória da sua amada bola, e eu, mesmo sem o seu talento literário, vou conta-la. Nesse ano a crise do futebol baiano ainda se arrastava. Só que os torcedores rubros negros estavam muito motivados. Pudera, o EC Vitória era o inimigo público número um, estando contra ela à imprensa, a federação e os demais clubes.

                         
                                                     Allie e a bola era a mesma coisa!

O Diário de Notícias representava a família de Allie que boicotava o nosso futebol. Só pra vocês terem uma ideia começou o ano sem sequer ter página esportiva. No dia 19 de janeiro divulga que Lomanto Junior apoiaria Luiz Viana Filho pra governador. Só no dia 27 é que voltaria a falar de esporte, mesmo assim tratando de voleibol infantil, é que a seleção baiana ia disputar o III Campeonato Brasileiro da modalidade e, mais que tudo, haveriam eleições na FBF onde disputariam o oficialista Degrimaldo Miranda e o presidente do Galícia Graça Lessa. Quatro dias depois divulgava uma atividade do Botafogo... um grito de carnaval. Por sinal, no mesmo dia em que Castelo Branco decide fazer eleições indiretas para governador.

        Mandavam embora Noah mas ele voltava, pois era rubro negro!

Em dez de fevereiro o jornal publicaria uma manchete onde afirma que
Continua sem solução a crise do futebol baiano.
Entendam, é que o candidato apoiado pela empresa, que pertencia à família/cadeia Diários Associados, havia perdido a eleição. O veículo acusa Degrimaldo de ter sido eleito graças aos votos dos clubes amadores. Enquanto isto Bahia, Leônico, Fluminense, Galícia e Botafogo são favoráveis a uma solução conciliatória. Nos próximos dias o Bahia conseguiria a façanha de perder em 24 horas para o Galícia (1 X 2) e para o Náutico (0 X 1) enquanto o Diário de Notícias publica a “morte” de Che Guevara que estaria na República Dominicana. No penúltimo dia de fevereiro o Bahia faria um amistoso contra o time suburbano do Periperi vencendo-o por escore de baba, sete a três.
                                                       O Noah rubro negro e Allie

O jornal reedita em março o seu caderno esportivo, mas só publica matérias sobre a seleção brasileira e o Torneio Rio-São Paulo. Ignoram inteiramente as cartas, digo os jogos do rubro negro contra o Fortaleza. O Vitória perdeu por três a um no dia três e seis e pediu revanche, quando em meio a todo boicote da família de Allie, venceu os cearenses por quatro a dois. Quatro dias depois foi à vez de o Bahia trazer o Ceará, perdendo por dois a um.
O boicote da imprensa baiana não fez apenas mal ao nosso Noah/Vitória, influenciou na própria convocação da seleção brasileira, que, no dia 28 chama 45 jogadores, só incluindo, além de jogadores do eixo Rio-São Paulo, mineiros, gaúchos e pernambucanos.  Começa nesse tempo no Brasil à discussão entre manter a estabilidade dos trabalhadores ou eliminá-la criando o FGTS.
O campeonato do ano anterior seria decidido no mês de abril, e foi um dos melhores da história. Imagine que houve um tríplice empate no primeiro turno, ganho pelo Botafogo. E, outro empate, entre Vitória e Galícia no segundo turno. A decisão foi feita entre o rubro negro e os diabos rubros, em condições precárias. Nenhuma partida conseguiu dez mil torcedores. Pra saber do jogo tínhamos que telefonar pra sede do Vitória ou ficar andando pela rua até encontrar o pessoal que ficava anunciando as partidas pela rua. Era assim que nós, as Allies da vida, Só o Esporte Jornal, de Luiz Eugenio, divulgava, mas não era vendido em todas as bancas.
                                               E olhem que tinha várias "famílias" contra!
As duas primeiras partidas terminaram empatadas sem gols. O título só saiu de pênalti batido pelo zagueiro Tinho. Mesmo assim o rubro negro tomou um sufoco danado sendo o goleiro Ouri o melhor jogador em campo. No final quase o atual médico Lapão empata o jogo.
Os próximos meses nada haveria sobre o futebol baiano no jornal. No entanto, Vitória e Náutico empatam sem gols no Dia do Trabalho na Fonte Nova. Em sete de junho Ademar de Barros deixa o país para não ser preso pelo regime. E, oito dias depois, não tem como deixar de dar publicidade á decisão do governo baiano que fecha a Fonte Nova através da portaria 63623, editada pelo diretor de educação e cultura Davi Mendes Pereira.
Foi nesse mês que o nosso Noah, o Vitória, continuou lutando pra falar com a sua amada bola. O campeonato de 1966 começou e ser jogado nas precárias arquibancadas de madeira do campo da Graça. Pra piorar a situação quatro clubes decidiriam não participar, e entre eles o EC Bahia. Este realizou nesta época dois jogos amistosos, empatando sem gols com o Leônico e ganhando do Galícia por dois a um.
                                                    A imprensa escondia as cartas!"

Um dia após a data magna da Bahia o tricolor de Salvador perderia pro tricolor feirense pelo escore mínimo.  E, uma semana depois começa a Copa do Mundo onde o Brasil terá uma participação vergonhosa. Começou até ganhando, da Bulgária, por dois a zero. Mas depois perderia da Hungria e de Portugal pelo mesmo escore, três a um, voltando logo pra casa. Os jornais baianos de julho só tratam de seleção, e em agosto da Olimpíada Baiana da Primavera, patrocinada pela Fratelli Vita.
Em agosto, contra tudo e contra todos, o rubro negro de Noah foi campeão do primeiro turno. No dia 20 de setembro o prefeito Nelson Oliveira resolve aumentar o preço das passagens de ônibus, das kombis e dos elevadores, recuando mediante pressão popular. Alguns dias depois o jornal dá divulgação, também á Frente Ampla. E, em 12 de outubro, Castelo Branco cassa vários mandatos, seis deputados federais, um estadual e um prefeito, todos, naturalmente, do MDB.
O Bahia faz um amistoso chinfrim em oito de outubro contra uma equipe de bancários, embora vença com dificuldade por um a zero. E, duas semanas depois, contra a ADESG (?), vencendo por dois a um.  Foi em volta da data da chamada proclamação da república é que se resolveu a crise em nosso futebol.
                                                                 Oi Nicholas!
Dois dias antes o Vasco da Gama jogou em Feira de Santana inaugurar o estádio municipal. Na oportunidade ganhou, a duras penas, do Fluminense local por um a zero, gol contra aos 43 minutos do segundo tempo. A crise também foi resolvida no “apagar das luzes” através de um acordão promovido pelo coronel João de Souza Carvalho enviado pela CBD. Mas Allie não saberia deste acordo.
Não faltou, na ocasião, o “puxa-saquismo” de praxe, com a realização, no dia 27, de um “Quadrangular Coronel Souza Carvalho”, só que, mais uma vez, sem convidar o Vitória. Galícia e Ypiranga e Bahia e Botafogo, no entanto, jogaram para “as moscas”, proporcionando uma arrecadação de 3.602,00.
O azulino acabaria vencendo o Bahia na final desse lúgubre torneio por dois a um no dia doze de dezembro. Nelson e Vadinho marcariam para o demolidor de campeões, enquanto Hamilton faria o “gol de honra” do tricolor. No dia vinte de dezembro ocorreria o último amistoso da Fonte Nova, o interessantíssimo jogo onde o Bahia venceria a FUBE no sufoco por três a dois. Pouco antes do Natal começaria o segundo turno do certame baiano.  
O nosso Noah, entretanto, só produziria quando da sua exclusão do seio da família dos clubes baianos. Logo que isto acabou perdeu o “tri” para o Leônico. O reencontro com Allie demoraria muito mais de sete anos. Na verdade só viria vinte anos após quando inauguraria o Barradão e se tornaria independente, passando a jogar em seu próprio estádio e casando com sua torcida.

·         Agradeço as informações do Setor de Periódicos raros da BCE e do Almanaque do Futebol Brasileiro. Sou grato as imagens dos sites adoro cinema e Imbatíveis.

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