sábado, 26 de janeiro de 2013

O casamento

                                                    
Gente, a semana passada fui convidado para outro casamento que, como vocês sabem, é uma cerimônia anacrônica que, infelizmente na nossa sociedade, ainda é recorrente, pelo menos ainda faz as delicias de toda família que esteja a fim de desencalhar uma filha ou queira “dar responsabilidade” a um marmanjo.
Desta vez não dava pra sair pela tangente. É que as pessoas marcam “em cima”. Os pais vem em casa convidar, deixam convite, telefonam, e, no caso de serem amigos que merecem a nossa consideração, agente tem de fazer as honras da firma. Só tem uma coisa pior do que casamento é uma formatura.
Essa é mesmo um horror. Primeiro, é a composição da mesa, onde se presta homenagem a tudo quanto é dirigente da faculdade, professores, assim como aos paraninfos que pagaram a conta. Depois se chama um inferno de formandos, um a um, e eles, ao invés de ficarem em fila esperando a chamada, levantam, se encaminham ao palco, colam o grau, apertam a mão de todos os que estão na mesa (argh!) e voltam aos seus lugares. Aí vem os discursos, cada um mais cumprido do que o outro, as placas entregues aos professores, e a saudação final, quando sobrevém a única parte que presta da formatura... o coquetel.
                                                                Ah a noiva era linda!

Mas voltemos ao casamento. Um dia desses vou reunir coragem pra dizer aos amigos “casem sem mim”. Tem até um filme de Arnaldo Jabor falando desta infeliz cerimônia, assim como filmes de Hollywood tratando do tema. E o pior dos americanos é que fazem uma mistura de casamento com formatura tirando desta a coisa mais sacal que são os discursos.
No casamento de Rachel, por exemplo, os “amigos” fazem mais de cinquenta discursos e agente tem que aguentar duas horas de problemas de família! Depois disso fiquei com o pé atrás de filmes casamenteiros, quando vou vendo que a coisa caminha para as núpcias mudo logo de canal. Os caras fizeram até o grotesco O casamento do meu ex. Imaginem, se o casamento já é um saco, quem vai se dignar a ir a um casamento da ex-mulher ou do ex-marido? Só se tiver o mal gosto de reatar a relação.
                                                                  O noivo Petkovic!

O primeiro problema do casamento é escolher o presente. Mas um consolo, antigamente era pior, pois se tinha que ficar telefonando para os noivos ou os pais pra ficar sabendo o que é que queriam. Agora a coisa está mais “civilizada”, ou, dizendo melhor, mais capitalista. Imaginem que agente recebe o nome de uma loja e vai lá pra pegar a lista dos presentes. Não é coincidência que os caras têm tudo ali e. pelos olhos da cara. Como as listas são meticulosamente preparadas pra você gastar o que não tem, não é fácil conseguir achar alguma promoção tipo um prendedor, algumas fraldas, uma bijuteria, cílios postiços, então tem que marchar no cartão mesmo.
A segunda coisa é o preparo para a cerimônia. Acho que hoje os convidados gastam quase tanto tempo como os noivos. Minha mulher passa o dia no salão, desde a véspera separa as roupas com que vamos nesta malfadada cerimônia, pede emprestado uma bolsa (pois as que têm nunca servem), e, o interessante é que não coloca nela coisa nenhuma, joga toneladas de pinturas no rosto, e me dá um monte de coisas pra fazer.
                                     Como não tinha banheiro o pessoal fazia alí mesmo!

Afinal, um casamento exige trabalho, e não só dos noivos, mas dos convidados. Eu tenho que engraxar os sapatos, escolher minha melhor meia, tentar achar uma calça que ainda entre em mim. Neste dia, o único terno que deu foi um bege, o que me causou o maior mico, pois era o único com roupa “esporte” num casamento que mais parecia um enterro, onde todos os homens estavam de terno escuro e me olhavam.
É nessas ocasiões que você se depara com uma das maiores desgraças que o Brasil importou da Inglaterra, a gravata. Suportei esse apetrecho durante anos por uma série de razões, geralmente de trabalho. Só quando tomei juízo é que passei a questionar essa coisa que nada tem a ver com nosso clima tropical, mas que é de “bom tom” se pendurar no pescoço, e aí procurei alternativas. A primeira foi comprar um sortimento de gravatas alegres no exterior. Mas isso não funcionou muito e até hoje eu tenho um montão lá em casa que não uso, pois imagina você chegar num enterro com uma gravata dos Beatles!
                                                 Por baixo o negócio estava ardendo!

Depois, entrei na onda do blazer. É que esse paletó é bem mais esportivo, não combina com gravata, e dá pra você não usar abotoar a camisa social e ainda desfrutar da glória de andar pela cerimônia com a mão nos bolsos. Mas o problema é o mesmo das gravatas alegres, só dá pra usar quando os pais não colocam lá bem em cima do convite a temível informação, “traje social”.
Aí descarei. O pessoal não me quer no casamento? Então tem que aceitar qualquer traje com que eu for. Sabem o que aconteceu com Einstein?  Não sei se é verdade, mas contam como se fosse. Ele teria recebido o convite para ir numa festa e foi com a roupa com que pesquisava. Quando chegou lá o anfitrião se dirigiu a ele e disse:
- Mas Doutor Einstein, essa roupa?
Aí ele perguntou com que roupa é que deveria vir e disseram que era a roupa social. O cientista nem pestanejou. Saiu da festa e entrou na primeira loja de roupas que achou aberta, comprando o tal traje e mandou um mensageiro entregar ao promotor da festa. Bem feito, na verdade o mais importante não somos nós os convidados, mas o traje com que vamos!
                                               As damas de honra quase roubam a cena!

Bem, agendamos o taxi que ia nos levar e, na hora marcada, nos empirulitamos para a missa. Quase que me esqueço de falar a vocês desse tormento. Fico invocado do fato da Igreja Católica ter a cada dia menos seguidores e todo mundo que eu conheço casarem nessa igreja. Quando chegamos lá estava quase cheio e foi com dificuldades que achamos um lugarzinho.
Tentei me concentrar nas musicas, mas não dava, pois até elas são um mix do casamento dos outros, não tendo em sua maioria a menor criatividade. Que diabo, será que esses filhos dos meus amigos não tem nenhuma musica deles, de quando se conheceram? Aí o jeito foi olhar em volta como todo mundo faz. A moda hoje é enfeitar a igreja de flores, e quanto mais rico mais há dificuldades de apreciar os móveis e obras de arte da igreja, devidamente coberto de rosas brancas. Mas será que não há outra flor pra usar?
                                                       Tem de tudo em casamento!

Num casamento que se preze as mulheres estão sempre olhando as vestes das outras, e os homens com cara de que estão enfadados e com pressa de sair dali. Eu não comento, só fico ouvindo, as críticas que rolam de todos os lados:
- Mas veja o tamanho desse sapato-plataforma?
- Esse vestido ela deve ter feito da cortina de casa, e deve ser promessa costura-lo tão cumprido!
- Minha nossa, que decote sem vergonha!
Minha expressão não muda ao ouvir esses comentários, mas uma coisa atraiu minha atenção, foi quando ouvi que tinha umas meninas que vestem a roupa de noite sem calcinha. Os homens tem esse que de tarado, e vire e mexe olham os peitos e os lances das senhoras nos casamentos. Quanto a mim, pra não fugir à regra, confesso que, desde então, olhei de soslaio pra ver se as roupas de baixo estavam ali, o que é uma tremenda bobagem, pois não dá pra ver nada, você fica só na imaginação.
                                         Não podiam faltar as musicas de Roberto Carlos!

Agente pensa em todas essas bobagens porque a noiva atrasa paca, nesse dia o casamento começou uma hora depois. E, enquanto estava em todas essas conjecturas, depois de ver gato e cachorro, digo as testemunhas passarem (dizem que se casamento fosse bom não precisaria delas), a porta da entrada da igreja fechou e começou a solene marcha nupcial. Rapaz, Mendelssohn deve estar se virando no túmulo. Ele nunca imaginou tanta pompa e circunstância em suas musicas. Agora fizeram um arranjo mais lento onde os trompetes estão pra lá do Handel das monarquias do Século XVIII, e nessa hora não há outro olhar que não seja pra noiva. Ou seja, o centro das atenções na liturgia do casamento atual não é pros nubentes mas só para a parte feminina da celebração.
Depois de muito discurso do padre e de juramentos dos noivos, começam a chamar as testemunhas. Nessa hora falei com a parte da minha família que3 estava presente para nos arrancar para o coquetel. É que eu estava desconfiado de que poderia não haver lugar pra sentarmos na casa de eventos, pois havia umas quinhentas pessoas na igreja. Mas, nem deram bola! O resultado é que só saímos quando tudo acabou.
                                                                 O beijo nupcial!

Pegamos o carro e todo o transito pra chegar à Avenida Tancredo Neves. Lá, enfrentamos outro engarrafamento pra entrar na casa de eventos. Na ocasião falei pro pessoal que iria sair pra conseguir um bom lugar na casa. Mais uma vez nem me deram bola. O resultado foi o previsto, quando chegamos não havia nenhuma mesa disponível e ainda tinha gente em pé.
Ficamos a noite toda em três lugares diferentes. Eu e minha mulher sentamos do lado de fora. Minha cunhada e o marido sentaram perto de uma mesa de salgados, e meu sobrinho e a companheira sentaram no miolo. Foi o único casamento que fomos que quase não nos falamos. Aliás, em nossa mesa só tinham políticos falando das suas peripécias e de como enganam o povo e melhoram a vida dos parentes no seu dia a dia.  
                                                            Agora é a lua de mel!

Conversamos um pouco, nos empanturramos e enchemos a cara. Que outras coisas se pode fazer na recepção de um casamento? Como sempre eu misturei a bebida, de sorte que depois da meia noite já estava trocando as pernas e pedindo uma cama. Lá em casa há sempre essa diferença de ritmo, pois minha mulher quer sempre aproveitar de todas as delícias do high society.
Nem sei dizer a hora que ela aceitou ir pra casa. Desculpem a confissão de idoso, é que já não tenho mais idade de ficar tarde em festas.  Nesse dia tive que andar pela casa umas quatrocentas vezes pra tirar os excessos, pois o mesmo casamento que é uma formalidade sacal tem de bom agente encher o bucho.

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