quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Assistindo ao Miss Bahia no “Balbininho”



Ninguém sabe bem sua origem, no entanto os concursos de beleza ”pegaram” muito bem na sociedade nacional-desenvolvimentista que se instalou no século passado no Brasil. Uns dizem que vem na mitologia grega do culto a Afrodite. Outros afirmam que tem origem no culto pagão á Primavera. Há quem vá buscar na escolha da imperatriz da China as antecessoras das misses.  O certo é que deve ser um mix de tudo isto, naturalmente, reforçados pelo machismo reinante que reconhecia nas mulheres papel de reprodução familiar.
Com o capitalismo as sociedades reforçaram a característica da mulher-objeto, com seus atributos físicos vendidos como qualquer outra mercadoria.  Os concursos de beleza surgiram no Século XIX ainda sem caráter oficial aparecendo ao mesmo tempo do surgimento da fotografia e da inserção desta na mídia escrita. Conta-se que nesta época foi eleita a primeira miss no Rio de Janeiro em 1865. No entanto, somente nas primeiras décadas do novo século ganhariam maior regularidade. Em 1930, no concurso Miss Universo realizado no Rio de Janeiro, o júri deu a vitória para uma conterrânea, a gaúcha Yolanda Ferreira. No entanto este concurso continuaria não oficial por mais duas décadas.
No Brasil o concurso só é reconhecido oficialmente em 1954 sendo ali reconhecida a beleza das mulheres baianas. Na ocasião, a beleza estonteante da baiana Martha Rocha arrebata os que estavam no Hotel Quitandinha em Petrópolis-RJ conquistando o primeira título de Miss Brasil. O júri do Miss Universo realizado nos EUA deve ter ficado bastante constrangido ao dar o título a uma sua conterrânea, Mirian Stevenson, cabendo à baiana apenas o segundo lugar. Eram tempos de estremecimento nas relações desse país com o Brasil, que neste mesmo ano vai aprovar a Lei 2004 constituindo a PETROBRAS. Um mês depois do concurso o presidente Getúlio Vargas enfia uma bala na cabeça denunciando “decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais”.
Nessa época não assistia o Miss Bahia, só me lembrando da revolta da minha mãe com as tais “duas polegadas a mais” que entraram na mitologia do concurso. Passariam alguns anos para que fôssemos ao concurso no Ginásio Antônio Balbino (“Balbininho”).
Antes que minhas leitoras me chamem de machista devo dizer que só compreenderá o que significaram esses concursos quem viveu na nossa época. É claro que houve sempre quem criticasse o concurso, particularmente chamando a atenção para outras qualidades das mulheres que não o seu aspecto físico.  A ideologia conservadora também era denunciada por grupos internacionais. No entanto, a própria mídia usava seus argumentos para promover o certame.  Com o tempo, o concurso tornou-se um caminho para a ascensão profissional como modelo, atriz ou jornalista.
Naquele tempo ia à família toda. Sentávamos nas arquibancadas e ficávamos durante horas vendo o desfile. O ginásio ficava cheio, inclusive com delegações do interior, todo mundo torcendo por suas candidatas.
Apesar de a mídia divulgar antecipadamente as candidatas nós costumávamos não tomar partida. Preferíamos acompanhar os desfiles de vestido de noite e de maiô (não existia ainda o biquíni). Quando a TV surgiu a Itapoá entrou logo na jogada. Aí fazia entrevista com as candidatas e, inclusive, os próprios jornalistas da emissora trabalhavam como apresentadores do concurso. O que me recordo era das besteiras que diziam. Muitas só tinham beleza e nada mais. Houve uma que demonstrou completo desconhecimento sobre o que era uma pinacoteca. Outra confundiu monumentos baianos. Mas, nesse tempo onde se culpa a imprensa por tudo que acontece, quero dizer que os responsáveis por essas gafes eram os jornalistas que ficavam fazendo perguntas “difíceis”.
Depois do concurso ficávamos aguardando pra ver pela TV Itapoá o Miss Brasil. Na ocasião presenciamos várias “injustiças” com a desclassificação das baianas, mas também de suas seleções entre as melhores.  Isso, entretanto, era logo esquecido com a emoção da vencedora que desfilava acompanhada por musicas tocantes. Confesso que chorei muitas vezes nestas ocasiões, principalmente quando ganhamos.
Os anos 60 foram gloriosos para o Miss Bahia. Ali vimos no “Balbininho” (e não gostamos) a itabunense Maria Olívia Rebouças Cavalcanti destronar várias candidatas da capital e de outros municípios e ganhar o título em 1962. Conquistaria mais tarde o Miss Brasil no Maracanãzinho e ficaria em quinto lugar no Miss Universo. O que lhe faltou na ocasião, sobraria para outra gaúcha, Ieda Maria Vargas, no próximo ano. Mas a sensação mesmo ficaria com Martha Vasconcelos, que vingaria a sua homônima 14 anos depois. Após ganhar de “barbada” o Miss Bahia arrebataria novamente no Maracanãzinho o Miss Brasil, e no Auditorium em Miami Beach o Miss Universo.
Na ocasião o apresentador foi o norte-americano Bob Barker, mas aí a política norte-americana era outra com o continente. Os EUA eram governado por Lyndon Johnson, que havia sido vice de John Kennedy e, apesar de ser do “Partido Democrata”, havia ajudado a derrubar Jango e financiou os primeiros anos da ditadura militar brasileira. A formidável conquista nunca mais foi repetida pelas baianas. Nossa família foi toda pra Avenida Sete ver o desfile em carro aberto onde à outra Martha desfilou acenando para milhares de pessoas.  

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