segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Política, alistamento militar e perda do tricampeonato

1966 foi um ano de lutas estudantis na Bahia. No caminho de minha casa não tinha como não ver os movimentos dos quais participavam inclusive colegas baderneiros entrando Neles, em sua maioria sem saber o que estavam fazendo. Para alguns, entretanto, foi à antessala de uma consciência politica.

Eu completava 18 anos e ainda estava mais pra “bater um baba” e jogar botão. No entanto, era um ano importante para um rapaz que alcançava a maioridade e teria que servir ao Exército e votar pela primeira vez.

Servir constituía uma demonstração de “civismo” que estava longe de me interessar. Assim, procurei me informar com amigos sobre como driblar a exigência obtendo a informação de que pessoas com deficiência física não eram convocados. No dia em que fui me apresentar tomei uns óculos emprestado e compareci ao Forte de São Pedro. Entrei na fila do primeiro andar e já arranjei logo problema com um oficial. É que, como a fila estava grande, peguei uma cadeira pra sentar acompanhando a fila enquanto esta andava e fui severamente repreendido.

Ao chegar a minha vez tive que tirar toda a roupa sendo examinado fisicamente. Na ocasião me pediram para tirar os óculos e ler algumas coisas o que aproveitei para mostrar dificuldades exagerando os meus problemas de visão. Depois foi só esperar o resultado e sair pro abraço. Foi à rejeição mais comemorada que tive, por “insuficiência física temporária para o serviço militar, podendo exercer atividades civis”.

Apesar de satisfeito com o diagnostico, me intrigou uma linha do documento, a que dizia que em caso de convocação deveria apresentar-me imediatamente. Apesar da preocupação a dúvida foi dirimida por meu pai que me disse isto normal e que eu não me preocupasse, pois não seria convocado. Algum tempo depois cheguei a me perguntar se ele realmente havia ficado satisfeito com a “solução”. Afinal ele era oficial da reserva do CPOR e pode ter pensado que o Exército podia ter-me “consertado”.

No futebol tínhamos superado há pouco tempo o boicote da imprensa ao nosso futebol. A razão foi o espancamento do jornalista Cléo Meirelles, atribuído ao mando do então presidente do Vitória Raimundo Rocha Pires, o “Pirinho”. Na época o jornal A Tarde chegou a divulgar que teria sido invadido por pistoleiros. Assim, as rádios não transmitiam os jogos, nem os jornais os divulgavam sendo a única forma de acompanhá-los o comparecimento ao estádio ou lendo o Esporte Jornal. Neste ano o Vitória se sagraria “bi”, em abril, jogando com o Botafogo (já ouviu falar, pois existiu e ganhou sete campeonatos!). O título foi obtido no “sufoco” após dois empates de 0 x 0, e ao vencer a última partida por 1 x 0 (gol de pênalti batido por Tinho).

Acompanhei o processo de definição da seleção brasileira que parecia democrático, contemplando jogadores de vários estados ao invés do costume de só convocá-los no eixo Rio-São Paulo. No entanto, na “hora h” dos 45 convocados 42 pertenciam ao eixo Rio-São Paulo, não ficando ninguém da Bahia. O que resultou foi um fiasco, um caso raro da nossa seleção morrer já na primeira fase onde só conseguiu ganhar da Bulgária. Para culminar, um episódio tragicômico no fim do ano, o roubo da própria Taça Jules Rimet.

No início de 1967 chegaria o cruzeiro novo. No carnaval já contaríamos com o Clube de Regatas Itapagipe, que inauguraria a sua sede. Foi um dos anos onde houve mais “gritos”, no Tororó, Macaúbas, Liberdade e Uruguai. A Mudança do Garcia já começa a ganhar corpo numa festa onde aparece o Bloco do Barão e os Corujas.

Ninguém deixou de reparar na posse do novo prefeito de Salvador, inclusive por seu temperamento polemico e chegado á mídia: Antônio Carlos Magalhães. Começaria um longo reinado desta sombria figura que, intermitentemente, percorreria quatro décadas de minha vida, onde governaria o estado por duas vezes e ocuparia a presidência da ELETROBRAS durante a ditadura, e, sobrevivendo ao seu fim, ainda voltaria a ser governador e ocuparia os cargos de ministro das comunicações e presidente do Senado.

Em função das paixões muito a gosto da Bahia, só com sua morte é que os analistas passaram a analisar o projeto de fôlego que aqui implantou com seus epígonos, junto e contra diversos segmentos das classes- dominantes, que lhe permitiu, inclusive, cooptar diversos intelectuais e universitários que tiveram a veleidade no passado de atuarem no campo da esquerda.

O Vitória neste ano conseguiria a “façanha” de perder o tricampeonato numa melhor de quatro pontos contra a Associação Desportiva Leônico. Eu fui assistir as três partidas. Na primeira perdemos por dois a zero, na segunda ganhamos de dois a um e, na terceira, quando esperávamos o inédito título de tricampeão, perdemos novamente por dois a um gols de Bassu de pênalti para o Vitória e do carrasco Zé Reis para nosso adversário. Para se ter uma ideia de como aquele esperava o título o juiz Clinamurti França teve que parar algumas vezes o jogo em função do goleiro Gomes se encontrar rezando.

Em meados do ano o marechal Castelo Branco morreria em estranho acidente aéreo no Ceará e uma nova constituição passaria a vigorar no país que, com outros decretos, priorizaria o ensino privado e, promoveria uma reforma universitária sob a influência de modelos norte-americanos. Mas eu e meu irmão “Toínho” estávamos mais preocupados com o inicio do Campeonato Baiano quando iriamos estrear uma enorme bandeira que confeccionamos. A mesma era amarrada em um cano de dois metros de altura, e era a maior entre as levadas pela torcida.

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