terça-feira, 16 de novembro de 2010

As últimas carteiras da Fonte Nova




Na Fonte Nova muita gente tinha carteira. Jornalistas, cronistas e radialistas tinham. O pessoal das cadeiras cativas tinha. Permissionários de cantinas e box e ambulantes também tinham. Ainda havia muitos outros casos. Por exemplo, os deficientes físicos entravam com carteirinha e, até as crianças, a usavam pra não se perder no estádio.
Pude consultar recentemente listas de portadores, e cópias das próprias carteiras expedidas em 2007, o último ano em que o estádio funcionou. Verifiquei que havia ali 27 cantinas e quatro boxes. Mais de dois terços das concessões foram publicados no Diário Oficial do Estado em 2005, ficando o restante para 2006. O preço das cantinas oscilava entre 112,00 e 408,00. Havia apenas um caso onde o permissionário pagava 63,75, e apenas dois com valores superiores a 400,00. Os preços do Box eram mais baratos, oscilando entre 28 e 34,00. As mulheres constituíam a grande maioria dos concessionários, ocupando quase dois terços das cantinas e ¾ dos boxes.
                                                                         
A entrada para as cadeiras cativas exigia também carteirinha. Outrora vendidas em quantidades, no último ano da Fonte Nova tinham ficado reduzidas a apenas onze titulares. O número é, por coincidência, equivalente a um time de futebol, embora a maioria dos contratos (seis) pertencesse às mesmas famílias: Gusmão (duas), Oliveira Simões (duas) e Goldstein (duas). As demais eram de Francisco Matos Lima, Humberto de Cerqueira Fraga, Paulo Eduardo Amaral Tavares, Eduardo Antônio Gonçalves Ramos e Humberto Luiz Pereira Pinto.
Uma extensa relação de pessoal de imprensa tinha carteira para os dois estacionamentos, que se situavam um na área interna e outro na área externa da Vila Olímpica.  A relação da ABCD é constituída de 54 nomes, veículos e até programas.  A capital do estado concentra a imensa maioria. Há um programa, (Resenha de olho na bola da Rádio Gospel), 37 vagas nominais de radialistas, cronistas e jornalistas, e oito veículos, respectivamente, as TVs Bahia, TVE, Aratu e Record, a Rádio Cristal, e os jornais Correio da Bahia, A Tarde e Tribuna da Bahia. Para o interior do estado sobram apenas oito vagas, duas para as rádios Sociedade e Subaé (Feira de Santana), uma para a Rádio Rural (Camaçari) e cinco vagas intituladas genericamente de “interior”. 
Entre os portadores de carteirinhas há nomes conhecidos como os de Mário Freitas, Paulo Cerqueira, Djalma Costa Lino, Fernando Cabús, Ivanildo Fontes, Silvio Mendes, Paulo Jackson, Jorge Sanmartin, Raniére Alves, Martinho Lélis de Santana, Manuel Messias, Wellington Cerqueira, Thiago Mastroianni e Jorge Alan, além do ex-jogador Eliseu Godoy, do ex-juiz Wilson Lago e do praticante de artes marciais Ivo Rangel. 

Por último, chama a atenção o número de ambulantes que trabalhavam na Fonte Nova com renovação efetuada a cada ano. A implosão recente tem mais esta aguda repercussão social. Fica evidente que as demais opções (Barradão e Pituaçu) não absorveram uma demanda tão grande deixando exata categoria, literalmente, “no olho da rua”. São 595 vendedores com carteirinha. Quatorze não foram buscar esse instrumento de identificação, de modo que trabalharam efetivamente 549 nas arquibancadas, 26 nas cadeiras cativas, e seis na arquibancada especial no ano de 2007.
Aqui a relação entre homens e mulheres é diametralmente oposta à verificada entre os permissionários. São 436 homens (73,3%) e 140 mulheres (23, 5%) trabalhando como ambulantes, sendo que não conseguimos identificar 19(3,2%) em função de fotografias desfocadas e nomes unissex.
Podem também ser percebidas as mercadorias mais procuradas pelos torcedores. Entre essas ganha disparado a agua mineral com 133 ambulantes cadastrados. Se formos considerar um grupo itens como “sucos” (12), “água de coco” (12), “laranja” (7), “limonada” (3), “agua mineral/agua de coco” (1), “agua mineral/amendoim” (1), “salgados/agua” (1), “laranja/amendoim” (1) e “agua” (1), teremos um total de 172 pessoas trabalhando com líquidos, o que equivale a trinta por cento do total.  Há ainda outros ambulantes trabalhando com produtos frios, como sorvete (53), picolé (35) e sorvete Kibon/Sorvane (5). Assim, se fizermos nova agregação, voltados para o combate ao calor, encontraremos 265 ambulantes (46%).
Um segundo bloco é voltado exatamente para o contrário, a venda de produtos quentes, o que se justifica particularmente nos dias mais frios, e é por natureza bem mais reduzido. Encontramos aqui café/chocolate (8), café (7), café/cigarros (2), num total de 17 ambulantes. Um terceiro bloco é constituído de “alimentos”, com inúmeros itens. Há amendoim (70), pipoca (64), roleta de cana (36), e mais difusamente, frutas (2), pipoca/amendoim (1), churrascos (1), algodão doce (1) e sanduíches (1). Chama a nossa atenção ofícios tradicionais como os lanches/salgados (57), as “baianas” de acarajé (26) e os baleiros (24). O último bloco, além de conter o item “cigarros” (5), “diversos” (1) e “fitas para torcida” (1), apresenta atividades inusitadas como “confecções” (2) e “brinquedos” (1). 
Se retirarmos os ambulantes que não foram pegar as carteiras, temos 645 frequentadores regulares do estádio com carteirinha. A estas devem ainda ser acrescentadas, as carteiras de estudantes, as dos deficientes físicos, crianças e outras categorias profissionais, somando vários milhares, e chegando aos borbotões as bilheterias e portões do estádio nos dias dos grandes jogos. Imaginem a dificuldade para os pobres dos porteiros da Fonte Nova fiscalizá-las!

* Agradeço a Ana Célia Paim e Júlmário Grisi da SUDESB pela consulta aos seguintes documentos: Relação dos concessionários de cantinas e boxes, Cadeiras cativas-Contratos em vigor, Estacionamento imprensa/vigência 2007(ABCD) e Licenças para vendedor ambulante. Sou grato também as imagens dos blogs midiaesporte.blogspot.com, aditivocultural.blogspot.com e bastidoresdoradio.com.

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