Não há nenhuma novidade na existência de times de futebol ligados a empresas. Isto sempre houve desde o início do esporte. Teve time ligado a fábricas, ao comércio e a empresas urbanas. Por isso não é nada de extraordinário que eles surgissem na Bahia. Aqui no estado até hoje funciona a Catuense e, na capital, teve o da Antártica, o Auto Bahia, o Circular e o da SMTC.
O transporte público moderno tem sua origem na França do Século XVII quando o matemático Blaise Pascal obteve concessão para explorar carruagens. Na Bahia, chegou um pouco depois... duzentos anos, quando se estabeleceu a criação de companhias de ônibus ou gondolas. A adoção da palavra “ônibus” para designar este tipo de transporte surgiu perto desta época na cidade de Nantes. Conta-se que ali havia um sistema de diligências públicas. Para chamar a atenção do público usuário, um dono de loja colocou um letreiro com o trocadilho Omnês onibus. A primeira palavra correspondendo a seu nome e a segunda a palavra latina “para todos”. Olhe que naquela época ainda não se falava de jogo do bicho. Aí a expressão pegou.
Na Bahia também houve disputa para a concessão de linhas, onde parece que o negociante mais sério era mesmo Antônio Francisco de Lacerda. Tanto que acabou também implantando um elevador para ligar as duas partes da cidade que, enquanto não mudarem o seu nome para um político de ocasião, vai continuar se chamando de Elevador Lacerda.
A energia elétrica dinamizaria os transportes urbanos. Em Salvador, no finzinho do século XIX durante a República, seria inaugurada a primeira linha de bondes elétricos. No início do novo século o espólio da antiga Companhia de Transportes Urbanos e da empresa Lacerda & Irmãos passaria para o patrimônio da Linha Circular Carris da Bahia.
Já vi publicações falando muito bem desta empresa e das inovações que promoveu no transporte público em Salvador. No entanto, se fosse assim porque teria ocorrido o “quebra-bonde” de 1930? Só “insuflado” pela revolução daquele ano? Embora eu não seja estudioso do assunto o que posso dizer é que os bondes prestavam um serviço útil, mas discutível e acabariam sendo substituídos aos poucos, principalmente entre os anos 50 e 60.
Quando eu me entendi por gente já era esta época. Peguei ainda os bondes, mas não mais no tempo em que eles eram uma sensação e os estudantes iam para os pontos pra ver o “lance” do tornozelo das meninas subindo neles. No meu tempo já estavam tirando os trilhos e os fios que conduziram os bondes por muito tempo. Peguei assim os anos da SMTC.
Esta foi o Serviço Municipal de Transportes Coletivos criado por lei do prefeito Hélio Machado de 1955, que encampou a Linha Circular passando o seu patrimônio para a nova empresa. Esta já começou “por cima” e atuou em muita coisa na cidade, inclusive no nosso futebol. O time da SMTC teve uma passagem relâmpago na primeira divisão, em 1966. Eu me lembro dele. Embora eu o tenha visto jogar apenas uma vez contra o EC Vitória.
Naquele tempo tinha completado 18 anos e meu clube estava disputando um campeonato em busca de seu primeiro “tri” que acabou não vindo. É que foi o único ano em que o Leônico (lembram-se?) armou um timaço onde pontificavam Armandinho, Zé Reis, Gajé, Biguá e outros, e nos derrotou nas finais. Mas deixem isto pra lá, vamos voltar a Associação Atlética SMTC!
O time só subiu para a primeira divisão porque voltaram a fazer o certame de acesso no ano anterior. Mesmo assim acho que ficou em segundo ou terceiro lugar. Como não poderia deixar de ser fez uma campanha vexatória ficando reduzido a uma carroceria de ônibus. O campeonato ocorreu em meio a uma crise. O primeiro turno foi disputado no campo da Graça, e por causa disto clubes como o Bahia, Leônico, Galícia e Fluminense não aceitaram participar. Isso favoreceu o SMTC que até que não foi tão mal nas quatro partidas que disputou. Estreou perdendo pro Ypiranga por dois a zero. Logo depois outra derrota, agora contra o Botafogo, por 2 X 1, com Meruca fazendo o primeiro gol da empresa, digo, do clube. Alguns dias depois obteria uma história vitória contra o finado Guarany, e de goleada (4 X 1), num dia que merece ser lembrado, 18 de junho de 1966. O time se lambuzou com tantos gols. Joelsinho fez dois. Edinho um e o “goleador” Meruca completou o placar. Pra azar (ou sorte?) do SMTC dois de seus jogos foram cancelados, contra o São Cristóvão e o Estrela de Março, em consideração ao futebol. O time ficou em quinto lugar, graças às desistências, ficando só abaixo dele o Guarany e o Estrela de Março.
Até então jogava naquele campo acanhado de arquibancadas de madeira e contra poucos clubes. No entanto, no segundo semestre tudo mudou com a passagem do certame para a Fonte Nova. Aí o SMTC pegou um baralho errado. Seus jogadores pisaram pela primeira vez aquele gigantesco estádio contra o Galícia. No entanto, o nervosismo dos jogadores pode ser contornado, pois não havia praticamente ninguém pra ver sua derrota por um à zero. A falta de gente se repetiria também no próximo jogo onde empataria com o Botafogo a zero.
À medida que o público ia crescendo aumentava o vexame do time do transporte, como por exemplo, quando tomou de quatro a dois do Ypiranga. Ai, porém “brilharia” Jackson não deixando que o time morresse de zero. A solidão no estádio o ajudaria a enfrentar ao todo poderoso Leônico conseguindo perder somente por um a zero. Logo depois o SMTC desandaria, caindo de quatro perante o Fluminense e de seis para o Bahia e, até o Guarany, que havia conseguido ganhar no primeiro turno, lhe aplicaria 4 X 2. Salvou-se na ocasião os jogadores Floriano e Edinho que anotaram os gols.
A empresa não aceitaria esta situação, apertando o time. O que será que foi tratado na ocasião? Será que todos seriam empregados como cobradores e motoristas? Iriam dar manutenção nos veículos? A ameaça surtiria efeito embora não salvasse o time da guilhotina. Nas proximidades do carnaval, assisti o SMTC perder do Vitória na Fonte Nova por dois a um. Foi um dos maiores públicos para o qual o time do transporte jogou. Na oportunidade Itamar, que havia decidido o título em 1964 contra o Bahia faria nossos dois gols, contra um de Gil (quem era?).
Logo depois conseguiria um heroico empate contra o São Cristóvão a zero, e, se despediria da primeira divisão num dia histórico. Nove meses após a vitória contra o Guarany no campo da Graça, esmagaria o “poderoso” Estrela de Março por 4 X 1 no dia 19 de março de 1967. Jackson seria comentado em todas as garagens e pontos de ônibus. É que ele fez três gols, completando o score o “famoso” Gil. É claro que a façanha não entrou no Guiness, particularmente porque o Vitória havia dado de dez e o Fluminense de nove neste adversário no campeonato.
No segundo turno ficaria em penúltimo lugar. Só o Estrela de Março o salvaria de segurar a lanterna. Quando divulgaram a colocação final do campeonato lá estava o SMTC em décimo lugar com apenas seis pontos ganhos. Na sua única participação no campeonato havia conseguido duas vitórias, dois empates e dez derrotas. Fez 14 gols e tomou 30. Se desta conta retirarmos os jogos contra os times fraquíssimos do Estrela de Março, São Cristóvão e Guarany, seu ataque se reduziria a apenas quatro gols, um contra o Botafogo, dois contra o Ypiranga e um... exatamente contra o meu EC Vitória.
Leônico, campeão baiano de 1966
Neste ano, a federação ficou com pena do torcedor, fazendo descer três para a segunda divisão. Há polêmicas sobre a participação posterior da empresa no acesso. Há quem diga que estaria presente nos próximos dois anos e quem o ache só em 1968. O certo é que sumiu! Nunca mais voltaria. A empresa acabou em 1979 transferindo seu patrimônio para a recém-criada TRANSUR. O seu final evitaria a tragédia de vermos de novo o time da SMTC.
· Agradeço as informações e imagens aos sites classicalbuses.fotopages.com, seutransporte.com. br, infoescola.com, www2. dbd.puc-rio.br, gersanweb.com, set. salvador. ba. gov.br,granadeiros.com e ao blog adleonico.com.br.
O SMTC virou Esporte Clube Monte Líbano que disputou a 1ª Divisão em 1970 sendo rebaixado.
ResponderExcluirO clube usava o simbolo da empresa?
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