Você pode dizer que eu sou um sonhador
mas eu não sou o único
(Imagine)
Ontem fez trinta anos que foi assassinado o maior de todos os cantores de rock. Pelo menos pra mim. Ele nunca veio ao Brasil, mas Paul McCartney sim, em 1993 e recentemente. Pensei até em ir a São Paulo assisti aos shows no Morumbi em homenagem aos meus velhos tempos de roqueiro nos anos sessenta, mas não tive coragem.
Vivi intensamente a década de 70. Foi nesta década que tomei consciência de mim e do mundo. Que tive meu primeiro emprego, me casei e comecei a fazer política por idealismo. Vivemos as crises do petróleo e do dólar. Presenciamos uma fase de crescimento lento do capitalismo, muito distante dos índices do ciclo anterior, que tinha forçado EUA e URSS a negociar acordos, como os SALT I e II. Havia uma nova divisão internacional do trabalho que também se expressava na independência dos países africanos e na Revolução dos Cravos em Portugal.
Na área cultural se vivia um processo de consolidação da indústria cultural e do entretenimento. Surgiam novas bandas, gêneros musicais e artistas. John Travolta era o rei e Donna Summer era a rainha das discotecas, da dance music. Os Rollings Stones viviam uma fase criativa, e Michael Jackson emplacava seu álbum Off the wall. A TV já era o filtro dos acontecimentos e, através dela, Elvis Presley alcança um bilhão de assistentes num concerto. Mas nada disso era parecido com o que sentíamos pelos Beatles.
Acompanhei o conjunto desde março de 1963 quando lançou o seu primeiro disco. Comprei todos eles. Pelo menos os que foram vendidos na Bahia. Assisti dez vezes a seus filmes "Reis do iê-iê-iê” e “Help”. Tinha a foto de John junto dos outros em minha carteira. Lembro-me como sofri com o fim dos Beatles e que assisti por várias vezes a última vez que tocaram juntos em cima de um telhado de Londres. Outro dia pude voltar a sonhar com aquela época ao assistir os covers do conjunto na promoção que a Companhia da Pizza faz toda última terça feira do mês. Fiquei mas velho, mas não perdi a memória desta época.
Eu estava sonhando com o passado
e meu coração estava batendo apressado,
eu comecei a perder o controle.
(Jealous guy)
Dez anos depois de Paul McCartney declarar o fim dos Beatles encerrávamos no Brasil outra década, agora sob o governo Figueiredo. Salvador sofria uma revolução urbana em função de uma industrialização acelerada que iria cobrar a conta no futuro. Terminávamos os anos 70 vendo o papa aqui em Salvador e com o Vitória, mais uma vez, realizando uma boa atuação no campeonato baiano.
A torcida, porém estava desconfiada. Há sete anos que nosso arquirrival, o Bahia, detinha a hegemonia absoluta no estado. No ano anterior o rubro negro havia sofrido um cruel decepção na partida final do campeonato quando o goleiro Gelson tomou um “frango” antológico num chute Fito que decidiu o jogo.
Naquele tempo o regulamento do campeonato continuava engraçado, mas, desta vez, beneficiou o meu clube. Quem fizesse a final de cada turno levava pontos para a finalíssima. Assim, mesmo perdendo o primeiro turno para o Galícia, se o azulino levou três pontos, nós ficamos com um ponto. No segundo turno fomos “pra cabeças” indo pra final onde ganhamos o título para o Bahia. No entanto o tricolor também levava ponto e poderia oferecer sério perigo nas finais. O Vitória chegava lá com quatro pontos, mas o Galícia tinha três e o Bahia um. Como o campeão só precisava chegar a seis pontos o Vitória jogava apenas por uma vitória simples pra voltar a ser campeão baiano depois de oito anos.
O jogo extra com o Galícia porém, terminou empatado em um a um. O resultado deixava o Bahia longe, mas não nos dava o título. Teríamos que jogar de novo por mais um empate. A federação achou melhor um novo jogo contra os granadeiros para a decisão. A partida desentocou todos os rubro negros de Salvador comparecendo quase cinquenta mil pessoas. O estádio era praticamente rubro negro com a “moqueca” azulina reforçada pelos poucos tricolores que ainda acreditavam no octacampeonato.
O jogo foi muito disputado e o técnico gaúcho Carlos Froner evitava expor o time demasiadamente. Ainda mais que sabia que do lado do time da colônia espanhola estava o experiente treinador Aimoré Moreira. Já estávamos no segundo tempo e, quando esperávamos outro empate, eis que surge um pênalti salvador. Quase que não consigo olhar. Cheguei a me esconder atrás do ombro do meu irmão “Toinho”. Mas não seria nada, Paulo Maurício “não caçou conversa” tirando o zero do placar.
Garantiríamos até o fim o resultado através da máxima “bola no mato que o jogo é de campeonato”. Meu time campeão jogou naquele dia com Bagatini, Paulo Mauricio, Amadeu (Xáxa), Zé Preta e Valder (Marquinhos); Eder Silva, Carlinhos Procópio e Alberto Leguelé; Wilton, Tadeu Macrini e Paulinho.
Comemoramos aquele 23 de novembro pra valer! Havia sido um bom ano, avançáramos na política com vitórias significativas contra o regime nas eleições municipais, e agora o futebol parecia encerrar, vitoriosamente, a década de 70. Mas eis que quinze dias depois o mundo iria revirar. Foi quando cheguei a casa e liguei a televisão que soube do assassinato covarde do meu herói de juventude, John Lennon.
A década não podia se encerrar pior. Era o primeiro beatle que ia embora, o que eu mais gostava, o mais lúcido e coerente. Eu passei ainda alguns anos acompanhando as andanças de sua mulher Yoko Ono. Depois seria a vez de George Harrison morrer de câncer. Tivemos que nos conformar com Ringo (que pouco aparece em público) e Paul McCartney, que salvaria a honra musical da firma. Vocês vão me perdoar, mas passei estes dias triste, e não podia deixar de me lembrar destas coisas que aconteceram no finzinho de 1980.
São trinta anos sem John Lennon, e despeço-me com seus versos de Stand by me:
Quando a noite chegar
e a terra estiver escura
e a lua for à única luz que nos vermos
não, eu não vou ter medo
· Agradeço aos blogs RSSSF Brasil e letras.com, e aos sites lirics007.com e Wikipédia. Sou grato também as imagens dos blogsruimsc.blogspot.com,veja.abril.com.br,bahianoticias.com.br,eil.com, tripadvisor.com.br e sidneyrezende.com.
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