quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

O dia da mentira na Fonte Nova



Existem várias versões sobre a origem do dia da mentira. Uns dizem que nasceu do festival de Hilária na Roma antiga, outros da mudança absolutista do calendário na França, e há quem procura nos países de língua inglesa a explicação para o all fools day (dia de todos os bobos). Mas, independente onde e quando tenha surgido a data sempre foi um convite a gozação popular.
Muitas da maiores mentiras desse dia vieram da mídia. Foi o sisudo canal britânico BBC  que inventou que o famoso relógio Big Ben iria distribuir uma versão digital, ou que havia sido descoberta uma plantação de espaguete. Outro veículo, o The Guardian, criou uma ilha no Oceano Pacífico como lugar ideal para passar as férias. E ainda houve quem inventasse que o Brasil não participaria da Copa do Mundo, que a África do Sul havia comprado Moçambique, etc. Nos dias de hoje, apesar da brincadeira ter diminuído, a internet é que mais apela enchendo de notícias falsas a web para que “caiamos” na mentira.
O Brasil tem um povo bem humorado e a brincadeira logo “pegou”. Algumas histórias ficaram famosas como a datação do golpe de 64 como “primeiro de abril”. Desde quando eu era pequeno as brincadeiras “rolavam soltas” lá em casa. Até minha mãe participava. A intenção era pegar os amigos distraídos para soltar a mentira.
O futebol não escapou das influências deste dia, particularmente na medida em que o meio futebolístico é sensível a todo tipo de superstições, e, sabe como é que é, não se devia provocar os maus espíritos...E assim se evitou por muito tempo programar jogos para este dia.
Foi um tempo em que os campeonatos do Rio e São Paulo começavam em maio, e, quando era antecipado para abril, a abertura se dava após o dia fatídico. Os primeiros jogos de seus certames demoraram  mais de sessenta anos, quando se arriscaram a realizar uma rodada em 1972. Nesse dia, estranhamente, os jogos foram excepcionalmente duros, ganhando o Botafogo pelo escore mínimo do Bonsucesso, e o Fluminense e São Cristóvão do Bangu e Madureira por dois a um. Flamengo, Vasco, América e outros clubes preferiram jogar no outro dia...Depois desta experiência voltariam a pular a data, pelo menos até 1979, quando se verificaria outra rodada duríssima, onde somente o Vasco conseguiria ganhar bem.
No final dos anos 80 parece que perderam o medo. Em 1987 nova rodada seria feita sem resultados estranhos. Mas, dois anos depois, o América, em jogo isolado, conseguiria perder para o Nova Cidade (sic!), vice lanterna do certame daquele ano, por um a zero. No outro ano, e por cinco vezes na década de 90, novas rodadas sem maiores problemas.  O futebol carioca entraria assim no novo milênio parecendo que tinha afastado o azar, demonstrado por outros resultados vitoriosos em certames nacionais.
                                                         Acharam a estátua do rei Pelé!
Assim, em 2007, foi programada uma rodada que incluía, pela primeira vez, um clássico carioca: Botafogo X Vasco da Gama. Na ocasião daria o clube da estrela solitária por dois a zero. Mas a surpresa viria para o clube pó de arroz que, ao perder neste dia para o Americano pelo escore mínimo, deu adeus a classificação para as finais do turno.   
Os paulistas são mais dados ao risco. Decidiram enfrentar o dia fatídico apenas três décadas depois de começarem seu campeonato. Organizaram uma rodada em 1º de abril de 1934, embora sem contar com todos os clubes. Nesse dia coisas estranhas ocorreram que certamente muita gente não acreditaria. O São Paulo enfiou 9 X 1 na equipe do Syrio, e o Palestra Itália 7 X 1 no Ypiranga. O resultado descartou nova experiência por dez anos, quando voltaria a ser tentada em jogo solitário, onde se verificou nova goleada arrasadora: São Paulo 8 X 2 São Paulo Railway! Os resultados devem ter contado com a boa vontade do tricolor paulista. Tanto que no ano seguinte programaram uma rodada do certame para primeiro de abril. Mas as goleadas estavam longe de acabar, verificando-se coisas como o Santos levar de 4 X 1 do Ypiranga e o Palmeiras enfiar 5 X 0 no Jabaquara.
A data tinha virado símbolo de azar e, só voltaria a ser utilizada quase trinta anos depois, em 1973, embora só com clubes considerados “pequenos”. Quatro anos depois depetiriam a dose com o “importante” jogo Noroeste 0 X 2 São Bento de Sorocaba. O receio só chegaria ao fim no final da década de 80. Na ocasião, o Palmeiras desafiaria os fantasmas sozinho, empatando com o XV de Piracicaba no tempo normal sem gols deixando o ponto extra para os pênaltis. O primeiro grande clássico seria organizado em 1990, num dia de rodada completa com onze jogos, envolvendo o primeiro clássico: Palmeiras X Corinthians. Os times, porém, não conseguiriam fazer gol.
Nos anos 90 por quatro vezes os paulistas jogariam em 1º de abril. Em 1993 o “timão” conseguiria a façanha de tomar três gols do Marília, que ainda não havia feito isto com ninguém, arrancando-lhe ponto precioso no certame. Um ano depois o Palmeiras voltaria a jogar solitariamente ganhando bem do Guarani(4 X 2). No próximo certame seriam programadas três partidas, que registrariam placares apertados. Finalmente, fechando o século, uma rodada sem maiores surpresas. 
No novo milênio os clubes paulistas declararam que haviam espantado a superstição. No entanto colocavam pra “boi de piranha” o Palmeiras. A situação deixaria mal o alvi verde do Parque Antártica que, em 2001, perderia do Santos por três a um, cinco anos depois do Rio Branco em casa por dois a zero, e, em 2007, do São Paulo por três a um. 
A Bahia sempre esteve na linha de frente em matéria de superstição. Não dizem que se macumba valesse no futebol os jogos por aqui terminariam empatados?  Aqui o campeonato local não fugiu da regra, começando já nos meses de abril/maio, mas só após o primeiro de abril. Os campos da Pólvora, do Rio Vermelho e da Graça nunca viram partidas do certame neste dia. Caberia então á Fonte Nova quebrar esta tradição, 74 anos depois do início do certame.
Em 1979 o Bahia era hexacampeão e lutava pelo maior feito da sua história local, o heptacampeonato. No dia 1º de abril houve enfim uma rodada dupla, envolvendo na preliminar Botafogo e Galícia, e na principal, Bahia e Leônico. Naquele dia todo mundo pensou que estávamos pregando uma mentira, pois o “moleque travesso” venceria o todo poderoso tricolor por dois a um. Nesse dia nem precisou inventar mentiras pois a própria realidade nos ultrapassou!


Oito anos se passariam antes que os dirigentes esportivos arriscassem outra experiência. O Bahia caminhava para outro campeonato e ganharia o jogo contra o Botafogo pelo escore mínimo. Mas, no complemento da rodada dupla, seria a vez do Vitória entrar em uma “fria”, que ninguém acreditou, perdendo para o Galícia pelo mesmo escore.
Em 1990 o dia da mentira envolveria o próprio BA-VI. O jogo foi programado em função de só servir pra consolidar as suas classificações para a fase final do turno. O Bahia havia ganho o primeiro turno e estava na liderança do segundo junto com o Fluminense de Feira de Santana. Nesse dia, no entanto, as bruxas jogaram por nós, registrando a vitória do rubro negro por dois a um. Mais uma vez o pessoal lá em casa pensou que era brincadeira!
Após esse dia se passaria muito tempo sem que marcassem jogos no dia primeiro de abril. E quando o fizeram foi num período lúgubre. Foi em 2007 e teimaram em organizar uma rodada do certame baiano quando, na Fonte Nova, o EC Bahia ganharia do Ipitanga por três a dois. Poderiam passar muito bem sem essa provocação. Menos de oito meses depois o castigo viria a cavalo quando, num jogo Bahia 0 X 0 Vila Nova(GO) desabaria um pedaço do estádio ocasionando a morte de sete torcedores.

·         Agradeço as informações dos blogs Granadeiros Azulinos, RSSSF Brasil e futipédia.globo.com. Sou grato ainda as imagens dos blogsthewatchdog-blog.blogspot.com, semprebahia.com, serumdeficiente.wordpress.com, mbarbosaextraextra.blogspot.com e reacaoambiental.com.br.

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