terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Sessenta anos da inauguração da Fonte Nova (II)


                               Praça Municipal nos anos 50
Afinal chegou o tão esperado dia 28, de inauguração do estádio. A primeira contradição é o público. O Diário de Notícias dá 30.000 e o Estado da Bahia 25.000. Mas como só havia 14.000 lugares sentados como chegaram a estes números? Vi uma foto das “populares” e percebi que além de haver muita gente em pé a encosta estava cheia de gente. Mas isto é suficiente pra ter mais dez a quinze mil pessoas? Um número mais real talvez fosse de 20 a, no máximo, 25.000 pessoas.
Para o Estado da Bahia o desfile atrasou bastante, pois divulgou o horário de 14h45min. Imagine-se com que “luz” devem ter jogado a final entre Bahia e Ypiranga. Vinham em frente os juízes da federação. A frente dos clubes vinhas suas madrinhas portando o estandarte da agremiação. Após dar uma volta na pista pararam em frente à tribuna de honra onde esperaram a chegada do governador. Minutos depois este entrava no estádio sob aclamação dos presentes. Depois de descerrar a placa se dirigiu á tribuna de honra onde, ao som do hino nacional, hasteou o pavilhão nacional. Tinha sempre ao seu lado o presidente da FBDT que, por sinal, iria ter eleições alguns dias depois.
Em seguida os clubes reiniciaram o desfile. A ordem foi Guarani, Botafogo, São Cristóvão, Bahia, Galícia, Vitória e Ypiranga.  Durante a caminhada uma faixa dos jogadores alvi rubros dizia “ao grande desportista Dr. Octávio Mangabeira grata homenagem do Botafogo EC”. Após a caminhada foram se dirigindo para o túnel. Logo após entrou o pessoal que iria atuar no primeiro jogo. Na ocasião coube ao governador dar o primeiro chute na bola. Nesse dia o delegado da presidência foi Francisco Pimentel e os médicos que trabalharam no estádio foram Eduardo Baiana (que, mais tarde, foi meu colega na UFBA), Fernando Marques Lima, Heitor Passo Cunha e Aníbal Figueiredo.
O primeiro jogo, como é público e notório, foi Botafogo e Guarani. A partida foi decidida em tempo normal graças ao primeiro gol do estádio, do alvi rubro Antônio. O juiz foi Antônio Bernardo (o mesmo que apitaria a final) e os bandeiras seriam Osvaldo do Rosário e Fernando Aristides. Logo depois entraria no gramado o histórico Zuza Ferreira (que teria trazido a bola para a Bahia) para dar a saída do jogo Ypiranga e São Cristóvão. A partida registraria empate no tempo normal tendo que ser adotada pela primeira vez o recurso dos corners (escanteios) para classificar o auri negro por quatro a zero.
                                                           Praça da Sé nos anos 50
O terceiro jogo, Vitória e Galícia, foi decidido em tempo normal com um gol e três escanteios contra um escanteio. Ai então entrou o Bahia no certame jogando e ganhando o Botafogo, vencedor do primeiro jogo por dois a zero, gols de Alfredo e Elias.  No quinto jogo, Vitória X Ypiranga, ficou tudo empatado, zero a zero no tempo normal e em um a um nos escanteios. Deveria ir para a disputa de pênalti como estava no regulamento, certo? Errado, aqui é a Bahia onde se dá um jeito nas coisas! Assim, o juiz Osvaldo Souza deu uma “prorrogação” de dez minutos quando ocorreu mais um escanteio para o Ypiranga que só deste jeito eliminou o Vitória.
Já iluminados praticamente pela luz do sol é que foram para a final Bahia e Ypiranga. O time canário foi logo pra cima. Logo aos dez minutos obteria o primeiro gol através de Antônio Mário. Mais um tempo e Raimundinho faria o segundo. Para o Estado da Bahia passaram a se exibir subestimando o adversário e fazendo um treino de luxo. Os jogadores do Bahia então encararam a reação como ponto de honra. E, cinco minutos antes do intervalo, Teco tomou a bola de Raimundinho e passou para Alfredo marcar o primeiro gol tricolor.
O segundo tempo começou na mesma toada. Agora era o Bahia que ia pra frente e, numa bola mal atrasada para o goleiro Zeca que saiu do gol, Alfredo retribuiria o passe dando agora pra Teco marcar o gol de empate. A torcida fez o resto. Agora era vez do esquadrão de aço dar show. A situação irritava o Ypiranga que deu duas faltas seguidas dentro da área. Na primeira o juiz não marcou o pênalti, mas na segunda não teve jeito, pois Sabino ”estupida e acintosamente” meteria os pés no peito do atacante do tricolor o que consumaria a “virada” para três a dois. Ao final a torcida invadiria de novo o campo, agora pra carregar a equipe do Bahia que formaria com Nadinho, Pernambuco e Toti; Neves, Giba e Chiquinho; Teco, Jereco, Alfredo, Juca e Elias.
                                                   Equipe do EC Bahia campeã em 1952
Após o jogo enquanto o Diário de Noticias informaria os fatos positivos o Estado da Bahia faria várias criticas. A se depreender do jornal por pouco não teria ocorrido tragédia semelhante às de 1971 e 2007. Havia poucos policiais, a imprensa não conseguiu trabalhar em função dos torcedores ficarem na frente dos espaços destinados a ela, e os torcedores invadiram o campo diversas vezes.
Dois dias depois era inaugurado o Hotel da Bahia e, logo depois, começaria o corte dos operários que trabalharam na Fonte Nova ainda antes do carnaval, onde a parte de rua foi tida pelo Estado da Bahia como uma “grande decepção”. No dia doze de fevereiro o jornal entrevistaria o engenheiro Nilton Simas sobre a situação da Fonte Nova. Este diria, entre outras coisas, que o governo gastou doze milhões de cruzeiros na construção e que precisaria de mais vinte e cinco milhões para o estádio ficar totalmente pronto com uma capacidade de 30.000 torcedores sentados e 40.000 se ficassem em pé.
O engenheiro foi um dos responsáveis por não permitir que abrisse de novo o estádio pra jogar de qualquer jeito. O campeonato teve que começar na Graça. No dia oito de abril se jogou seu torneio início, ganho novamente pelo tricolor, agora numa final com o EC Vitória. Os clubes pressionavam mas Nilton Simas resistia.  Quem se der ao trabalho de acompanhar os jornais daquele ano verá que o estádio só reabriu mediante muita pressão política.  
O Campeonato Baiano só viu ali dois jogos, até sua decisão, entre Vitória e Ypiranga foi realizada no Campo da Graça. Quatro meses depois de “inaugurado”, reabria a três de junho para Um novo Bahia X Ypiranga que daria por volta de 140 mil cruzeiros de renda. Vinte e um dias depois ocorreria ali o seu primeiro BA-VI, em pleno São João (sic!), naturalmente, um fracasso de público, que trouxe para as bilheterias uma renda em torno de setenta mil cruzeiros.  No outro dia o Diário de Notícias reconheceria que “a praça não está em condições de servir de palco a jogos de importância”.

A própria temporada do Fluminense (RJ) que se iniciaria no fim desse mês se daria na Graça, com exceção do jogo em que venceria por dois a zero o Bahia, pois seria dado um “jeitinho” pra fazer a partida na Fonte Nova. Em julho o estádio reabriria de novo para um quadrangular com a presença da Portuguesa de Desportos que jogaria contra Vitória, Bahia e Ypiranga, sendo a primeira equipe de fora do estado que se apresentaria no estádio. 
Em seis de setembro o Diário de Notícias informa que a Fonte Nova só estará pronta em dezembro, e que se espera os dez milhões prometidos para a intensificação das obras. No momento a capacidade seria de treze mil pessoas sentadas. Ou seja, em termos de capacidade, não havia nenhuma mudança substancial desde a “inauguração”. Essas informações estão a indicar que aconteceu com a Fonte Nova o mesmo problema de nossa velha cultura política, onde as obras que passam de um governo para o outro contam com sérias dificuldades de serem tocadas. No caso do estádio tinha ainda um agravante, o de ter o nome do governador anterior, um político que ainda se mantinha em evidência. Será que foi por isto que durante o governo de Regis Pacheco organizariam torneios em sua homenagem?
No entanto, o reconhecimento do DN pouco adiantou. Os cronistas, através da ABCD pressionaram pra fazer a sua festa de confraternização que acabou sendo realizada ali em setembro num estádio ás moscas. Tiveram a coragem de colocar as equipes do Vitória, Bahia, Galícia e Ypiranga com nomes de personalidades que se intentava homenagear. Quanto às obras perdurariam por anos. O estádio não ficaria pronto nem para a decisão do campeonato daquele ano entre Vitória e Ypiranga. Ainda no início da década de 60, época de grandes disputas da Taça Brasil, a sua capacidade não ultrapassava 35.000 pessoas.
*  Agradeço as imagens aos blogs sosumulas.blogspot.com, skycrepercity.com, ec.ypiranga.zip.net e museudentu.org.br. 

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