Hoje completo quatro meses que coloquei no ar este blog. No começo não foi nada fácil tendo que levar um bom tempo pra passar dos seis acessos-dia nas primeiras semanas pras 130 visitas de anteontem! Já estava pensando que era mais uma furada na minha “carreira” de escritor. Considero que esta se divide em antes e depois deste blog. Peço permissão a vocês pra me justificar.
Fiz muita coisa na vida embora começasse a trabalhar tarde. É que durante minha juventude fui um “rebelde sem causa” e minha família chegou a pensar que eu “não daria pra nada”. Quem me salvou foi o forte movimento do rock dos anos 60, fazendo com que eu me interessasse pelo contrabaixo (só pra ser contra alguma coisa!). Com ele eu iria estudar na Escola de Música da UFBA depois de passar literalmente “no chute” no vestibular.
Integrei orquestras sinfônicas por duas décadas tocando com muita gente. Até então só tinha escrito versões de musica e composições de qualidade discutível. Foi quando cursava a universidade é que comecei a escrever. Já estava com 31 anos e fui recrutado pela AP, uma organização que lutava contra a ditadura e queria o socialismo. Como tinha que apresentar um relatório da situação da área de artes escrevi um documento que intitulei pomposamente de A questão artística, que nem os dirigentes leram.
Até o bolo!
Aquilo, porém, me estimulou a escrever, e não parei mais. Como bom burocrata passei a ser expert em relatórios, convocações e circulares. Logo depois, entretanto, a organização acabou e eu fiquei sozinho no altar, pois a noiva havia fugido. Mas não nos demos por rogado criando outra (mais baiana que outra coisa), tendo eu ajudado a escrever os seus documentos básicos. Como esta também durou pouco acho que ninguém reparou as bobagens que escrevi.
Continuei a escrever coisas intragáveis até o fim da ditadura militar. E isso pouco mudou na “Nova República” sarneysista quando tínhamos uma greve por semana pra fazer. Meus escritos somente melhoraram ao final dos anos 80. Naquela altura o socialismo burocrático fazia agua no Leste Europeu e o PT buscava controlar algumas correntes políticas internas. Foi aí que escrevi contribuições mais pretensiosas pra algumas dúzias de militantes.
Cheguei a escrever dois pequenos livros. No que investiguei o governo de Allende no Chile ultrapassei pela primeira vez a barreira das dezenas pra algumas centenas de leitores. Mas, como o grupo estimulava muito estas iniciativas (para não dizer ao contrário) tive que contar com meus próprios recursos pra editar meus escritos. Minha glória foi quando vi o próprio Zé Dirceu comprar o livro na nossa barraquinha montada na porta do Colégio Dois de Julho em Salvador.
O segundo foi uma espécie de panfleto onde eu queria convencer os outros do “verdadeiro marxismo-leninismo”. Mesmo assim a pequena edição se esgotou rapidamente, acredito que comprada por concorrentes do grupo que eu criticava e alguns desavisados.
Como tinha me tornado exigente com o que escreviam enveredei pelo “caminho científico” passando a dar grande valor à pesquisa. Isto me levou a área de história, ao mestrado e doutorado, na década de 90. A guinada me levou somente a escrever chatos trabalhos acadêmicos, embora tenha quem goste de alguns.
Acreditem que levei quatro anos pra publicar meu próximo livro, fruto de dissertação de mestrado sobre os petroleiros! A “obra” se encontra hoje esgotada, embora ache que isso se deu mais pelo interesse da categoria e por ter muitos amigos. O livro despertou algumas polêmicas. Alguns dos antigos dirigentes do sindicato se sentiram ofendidos pela revelação de erros. De outro lado houve quem se sentisse decepcionado com a “projeção excessiva” dada a aqueles que consideravam pelegos. Foi a minha primeira experiência de ir a fundo nas coisas e comprovei que muitos não estavam preparados para ela.
Logo após me concentraria, durante mais quatro anos, num trabalho descomunal para o doutorado em Recife, o de reconstruir a história da organização que eu tinha participado. Foi um trabalho de doido! Tive que ler 800 documentos e 500 livros, produzindo ao final um documento de quase mil páginas, que tive de reduzir para que pudesse ser lido pelo meu orientador e pela banca examinadora. Até hoje não publiquei minha tese.
Quando acabei passei a gozar do título de doutor em história social empregando-me em várias faculdades privadas. Foi minha época de ganhar dinheiro e viajar pelo mundo que ninguém é de ferro! Não abandonei a “carreira” de escritor, mas agora produzia para publicações científicas “sérias” pra fazer pontos no CNPQ, e vez ou outra, escrevia artigos para os sites de política.
Parecia conformado com esta vidinha quando veio me salvar a Faculdade de Tecnologia e Ciências-FTC. Passei a ser coordenador de educação á distância e, por mais incrível que possa parecer, gerente de vendas! Na época aprendi a dar aula pra milhares de pessoas, mas comprovei também que não há santo que aguente trabalhar como administrador do capital! Não me surpreendi quando fui demitido. Afinal, que empresa pode suportar um cara de esquerda e ainda escritor como gerente?
Aproveitei a ocasião para lançar mais um “livro sério” no mercado, sobre o último vice-rei do Brasil, o oitavo Conde dos Arcos. No entanto, apesar do acesso desse a segmentos nunca sonhados, ainda tenho lá em casa cerca de trezentos exemplares esperando compradores. Vão convencer a Cybele que sou escritor quando a casa está abarrotada de livros não vendidos!
Aproveitei a ocasião para lançar mais um “livro sério” no mercado, sobre o último vice-rei do Brasil, o oitavo Conde dos Arcos. No entanto, apesar do acesso desse a segmentos nunca sonhados, ainda tenho lá em casa cerca de trezentos exemplares esperando compradores. Vão convencer a Cybele que sou escritor quando a casa está abarrotada de livros não vendidos!
Bem, nesta altura do campeonato, minhas relações com a ciência foram estremecidas. Havia voltado pos linhas tortas a escrever pra poucos. Passei a achar que minhas “profundas pesquisas” e teses estavam muito longe dos leitores brasileiros. Cheguei a elaborar alguns projetos “mais amenos”, enviados pra editoras locais e do Sul, tentando realizar pesquisas que não interessam a ninguém. Essas iniciativas me renderam, quando muito, o agradecimento de alguns com a esfarrapada desculpa de que "em outra oportunidade" teriam a satisfação de analisar os meus originais.
Será? Como gosto de Woody Allen...
Cheguei, por fim (depois de trinta e três anos) a conclusão de que devia escrever sobre assuntos que interessam a milhares e que eu tivesse a fim de tratar. Foi aí que comecei a recuperar a minha história política e cultural e percebi que uma parte dela era desportiva. A decisão final de criar um blog pra recuperar a memória da Fonte Nova foi influenciada por dois fatos: a minha aposentadoria da UFBA (concedida em junho do ano passado) e a implosão do estádio da Fonte Nova (acontecida em agosto).
O blog causou uma verdadeira revolução na minha insistência em escrever. Ao completar quatro meses no ar já alcançou mais pessoas do que consegui em mais de três décadas como “escritor”: 4.200. Nesse tempo não só pessoas do Brasil se interessaram por ele. Sou agradecido ao apoio que recebo de interessados dos Estados Unidos e do Reino Unido, que juntos somam 180 acessos. Assim como aos que se encontram em países que fazem parte da lista dos dez primeiros em número de visitantes, como Egito, Portugal, Argentina, Irlanda, Espanha, Eslovênia e Holanda.
Não posso deixar de agradecer aos nossos apoiadores em quase todas as regiões do globo. Recebo visitas da América (México, Canadá, Chile e Uruguai), da Ásia (Cingapura, Índia, Malásia e Japão), da Europa (Grécia, Itália, Alemanha, Dinamarca, Rússia, França, Croácia, Ucrânia e Moldávia) e da África (Angola).
Não atribuo esta audiência a meus escassos talentos de escritor mas sim ao lugar que a Fonte Nova ocupa até hoje no imaginário coletivo. O grande escritor Eduardo Galeano, em seu livro El fútbol a sol y sombra, ao falar dos estádios diz que.
não há nada menos vazio que um estádio vazio. Não há nada menos mudo que as arquibancadas sem ninguém.
Afirma que o Estádio Centenário (onde foi disputada a Copa do Mundo de 1950) suspira de nostalgia pelas glorias do futebol uruguaio. Que o Maracanã segue chorando a derrota brasileira no mundial de 50. Que em Milão o fantasma de Giuseppe Meazza continua marcando gols que fazem vibrar o estádio que leva o seu nome. E que, a final do mundial de 74 ganho pela Alemanha, se joga dia e noite no Estádio Olímpico de Munich.
Desta forma não é nenhuma surpresa que a Fonte Nova tenha sobrevivido na memória dos que a conheceram como um dos maiores templos de esporte. E isto acontece ela se confunde com uma época inesquecível de nossas cidades, antes de serem degradadas pelo capitalismo, com sua violência, crescimento desordenado, indústria cultural e especulação imobiliária.
Neste dia de aniversário agradeço a todos vocês que, mais do que acessar um blog, fazem parte da resistência contra o esquecimento desta que foi fisicamente (o quanto hoje é espiritualmente) um dos maiores patrimônios modernistas da Bahia, e, porque não dizer, do Brasil. É este apoio que me estimula a continuar e a pensar em novos projetos, como a publicação de um livro e a organização de um museu sobre a Fonte Nova.
· Agradeço a inspiração de Eduardo Galeano e as imagens dos blogs: percapeso-ganhefelicidade.blogspot.com,claudiagironblog.terra.com.br,arteacucar.blogspot.com e arcadenoe.sapo.pt.
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