Chico Buarque e o MPB-4 cantando "Roda viva"
Fiquei muito chateado com o futebol após as finais do campeonato baiano de 1966. Assim, assisti a poucos jogos do campeonato de 1967. Além do mais parecia ser ano do Galícia que estava “matando a pau” quando se realizaram o FIC e o Festival da Record.
Durante o primeiro eu vibraria com a música Travessia de Milton Nascimento e Fernando Brandt que perderia para Sá e Guarabira ficando em segundo lugar. Chico Buarque concorria com Carolina obtendo um modesto terceiro lugar, merecendo críticas da esquerda uma postura de quem “fica na janela vendo o tempo passar”.
Mas a sensação mesmo estava guardada para festival da Record que passou a ser o principal palco de disputa dos artistas. Neste ano havia ficado impressionado com o álbum dos Beatles Sargent Peppers Lonely Hearts Club Band. Para mim aquilo parecia ser o máximo em matéria musical. Estávamos ás vésperas das megamanifestações estudantis e do início da montagem da guerrilha urbana.
Garrincha ainda jogava, que saudade!
Na época os festivais já eram verdadeiros espetáculos. Realizados na antevéspera da instalação da indústria musical do país (quando as atuais estrelas da MPB ainda estavam em ascensão) reproduziam a concorrência entre as gravadoras e havia verdadeiras claques pró e contra as músicas apresentadas. Havia também um clima de novela onde se buscava fabricar nos cantores o mocinho, a heroína e o vilão. Mas isto eu penso hoje, pois no festival chorei durante a interpretação de Roda viva pelo autor Chico Buarque com o MPB-4, musica que considerava que deveria ter ganhado.
Me lembro que Gilberto Gil cantou a formidável Domingo no parque com o inesquecível conjunto Os mutantes. Da polêmica em torno da atitude de Sergio Ricardo que, ao interpretar a música Beto bom de bola, jogou o violão no público. A atitude foi debitada as vaias, mas eu, que já entendia um pouquinho de música, achei que se deveu também ao fato de perder o tom. De que fiquei chateado com o júri em função da musica Cantador (Dori Caymmi e Nelson Motta) interpretada por Elis Regina, no lograr classificação.
Pouco antes dos festivais de 1967, durante uma apresentação de uma orquestra sinfônica em São Paulo, houve a invasão do palco por um grupo de músicos, entre eles o arranjador Rogerio Duprat fazendo um discurso contra as formas musicais tradicionais.
Conseguem reconhecer Bethania e Gal?
Foi nesta ocasião que ocorreria o tumulto durante a apresentação de É proibido proibir interpretada por Caetano Veloso e os Beach Boys. Aconteceu de tudo, vaias, aplausos. Em certo momento Caetano virou as costas para o público que reagiu fazendo o mesmo. Era um momento decisivo para musica brasileira que já presenciava o início do movimento tropicalista. Na música como na política não havia mais espaço para o intermediário. Era “calça de veludo ou bunda de fora”.
A revolução cultural proposta por Caetano de derrubar as prateleiras, as estantes, as estátuas, as vidraças, louças e livros não encontraram eco. Seu discurso, no entanto, ficaria eternizado pela mídia, quanto ao outro, mais direto, só seria “enunciado” no ano seguinte, por Geraldo Vandré. Não gostei da colocação final do festival que deu a Ponteio, de Edu Lobo e Capinam o primeiro lugar, embora apreciasse o prêmio de melhor interprete para Elis Regina.
Começo então um namoro com o tropicalismo, que foi tão breve como o movimento, um ano. Este gênero apareceu pra mim como uma síntese entre os dois gêneros com os quais me debatia ao fim dos anos 60, o rock das guitarras e as harmonias elaboradas da Bossa Nova.
Ó minha amada Elis Regina!
As letras simples, sempre falando sobre temas do cotidiano, versus as letras elaboradas. Repercussão especial me causou musicas como Lunik 9, Onde Andarás Lindonéia e Baby, não por coincidência, todas relacionando letra e harmonia elaboradas a ricas e românticas melodias.
Eu voltaria ao estádio nas decisões do campeonato de 1967. Na ocasião, porém, empatarem Bahia e Galícia nas finais do segundo turno. Aí o dirigente Osório Vilas Boas engabelou o pessoal do Galícia enchendo-lhes os olhos com a renda que poderia ganhar com vários jogos. Resultado: o tricolor ganhou o turno e o campeonato, inclusive com a minha presença num dia de semana á noite sob a arbitragem de Armando Marques.
Foi uma das poucas vezes que sentei na “geral” e o Bahia havia feito um gol com China e manteve o escore até que houve um pênalti escandaloso não marcado por este juiz. Depois ele disse que “não iria atrapalhar a festa da torcida do Bahia”!
O prefeito que França Teixeira chamava de "Pelé branco das construções"
Logo depois teve a I Bienal do samba, que apresentou a vitória da musica Lapinha, de Baden Powell e Paulo Cesar Pinheiro. Eu passava cada vez mais a admirar a intérprete Elis Regina. Desta vez o Galícia tinha aprendido. No certame de 1968 perderia muito pouco, só me lembro uma, para o Conquista por quatro a um. Seu centro avante Carlinhos foi o artilheiro de um campeonato que acabou no mesmo ano, em setembro, com um empate sem gols contra o Fluminense.
Três meses depois ocorreria o novo festival da Record. Eu não gostaria mais uma vez do julgamento, pois Tomzé ganharia com a musica São Paulo, meu amor. Achava que haviam canções melhores, incluindo Divino maravilhoso de Caetano e Gil.
Na verdade só houve um festival da Record que concordei com o resultado, o último realizado em 1969 onde ganhou a música Sinal fechado de Paulinho da Viola. Na contramão da esquerda ficaria com o rumoroso resultado da parte nacional do FIC que deu o primeiro lugar a Sabiá, de Chico e Tom Jobim, cantada pelo Quarteto em Cy, enquanto o Maracanzinho apoiava em massa Pra não dizer que não falei de flores de Geraldo Vandré, assim como no ano posterior deste festival onde ganharia Cantiga por Luciana de Paulinho Tapajós e Edmundo Souto.
Enquanto isto o pau "cantava"
No FIC tomaria o partido de Sabiá, particularmente em função de Vandré apresentar uma melodia bastante inferior as anteriores. Sob a admirável interpretação de Chico Buarque e do Quarteto em Cy, era escapista:
Vou voltar
sei que ainda vou voltar
para o meu lugar.
Foi lá, é ainda lá.
que eu hei de ouvir
cantar uma sabiá.
Vou voltar
sei que ainda vou voltar.
Vou deitar na sombra
de uma palmeira
que já não há
colher a flor
que já não dá (...).
Sei que o amor existe
eu não sou mais triste
e que a nova vida
já vai chegar
e que a solidão vai se acabar.
A indiscrição de Robert Kennedy pra aparecer com Pelé no meio do banho no Maracanã(1965). Vejam o sabão e a toalha do "rei".
Já a musica de Vandré era um verdadeiro chamado á luta apontando inclusive contra quem lutar os militares. Mas eu ainda não estava preparado para atender a esse chamado.
Explico, é que durante toda a Era dos festivais o que “fazia a minha cabeça” eram a qualidade musical e o romantismo das interpretações de Taiguara, MPB-4, Jair Rodrigues e do Quarteto em Cy.
Minha participação nos festivais foi tardia, assim como foi tardia a entrada neste clima por parte dos empresários de comunicação do estado. Algumas instituições localizadas já vinham fazendo festivais de pequena monta, como era o caso da Associação Athlética do Banco do Brasil. Os próprios festivais nacionais inscreviam compositores em todos os estados onde se transmitia o festival, como a Bahia.
Foi no ano de 1969. Nesta época o campeonato “não deu nem graça”. Caetano e Gil foram para o exílio e o Fluminense armou um time de primeira categoria e foi levando todo mundo de roldão ganhando o certame por antecipação em novembro, exatamente contra o Vitória, pelo escore mínimo. Na Bahia o modelo de festival promovido por um grupo de comunicação iniciou-se nesta época, mas eu não seria classificado.
O governador Luiz Viana Filho
Em 1970 o campeonato voltaria a ser jogado na Graça, o Vitória estava muito ruim e o Bahia decidiu o título ganhando “de bandeja” o Itabuna. Eu quase não assistiria aos jogos. Ainda existia festivais nacionais, mas haviam perdido o clima depois da edição do AI- 5. O estádio da Fonte Nova estava construindo o se anel superior que ficaria pronto em março de 1971. Mas o recém-criado Campeonato Brasileiro não teria a participação do EC Vitória.
E foi neste ano que eu “jogaria pesado” no I Festival Nordestino da Musica popular Brasileira inscrevendo três músicas, classificando duas. Na ocasião se inscrevem 120 músicas de dezenas de compositores. A lista de classificados saiu no jornal A Tarde, na coluna de Lázaro Guimarães ocasionando alegria lá em casa. Afinal de contas a família me via obter sucesso em alguma coisa!
Minha musica A nova metrópole não podia deixar de ter a minha velha paixão pelo futebol. Cantei e preparei o arranjo da composição vestido com a camisa do E.C. Vitória(oferecida pelo dirigente do clube Benedito Luz), grandes painéis de Salvador, a presença de máquinas de datilografia no palco, e a execução de ruídos urbanos pelo conjunto musical. Foi uma novidade no evento, mas, embora tenha chamado a atenção do júri e dos músicos presentes, não foi classificada. Acho que foi uma das primeiras vezes que foi apresentada na televisão da Bahia uma composição onde a melodia perdia o protagonismo para o clima musical.
Eu no violão e minha irmã Maria Helena defendendo musica no festival
No II Festival Nordestino, realizado no ano posterior, eu não inscreveria músicas, pois fui convidado para tocar na orquestra do festival acompanhando as composições selecionadas. Na época, as três primeiras colocadas eram classificadas para a grande final nordestina em Recife onde fariam parte de um disco. Neste ano, porém, a organização decidiu dar um carro ao primeiro colocado. Neste ano, porém, o meu rubro negro já estava participando do primeiro campeonato brasileiro.
· Agradeço aos sites Era dos festivais, RSSSF Brasil, Wikipédia e Granadeiros Azulinos. Sou grato também as imagens dos blogs cincomeiasete.blogspot.com,televisao.uol.com.br,liga.cit.br,copa2014.org.ba e eleandroalonso.blogspot.com.
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