segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Osório, a imprensa e os bastidores da decisão da I Taça Brasil (I)


             Paul Newman interpretando a vida de Billy The Kid no filme Um de nós dois morrerá

A primeira competição continental de clubes foi a que reuniu clubes da Europa em 1955. Nas bandas de cá foi proposta por Brasil e Chile em 1958 no 29º Congresso da Confederação Sul Americana de Futebol realizado no Rio de Janeiro, quando a entidade era presidida pelo brasileiro José Ramos de Freitas. Os detalhes do certame, entretanto, só ficaram prontos no próximo congresso da CSF, em Buenos Aires, quando o certame foi aprovado com a participação dos campeões de cada país para ter início a partir do próximo ano. Na oportunidade assume a presidência o uruguaio Férmin Sorhueta.,
Definido o certame teria que ser corrigida uma situação que colocava o Brasil atrás de parte importantes dos países praticantes do futebol, a da inexistência de um campeonato brasileiro. Para se ter uma ideia de tal situação, a Argentina possuía seu campeonato de profissionais desde 1931 e o Uruguai a imitaria no ano seguinte. O Chile, desde 1933, iniciara a competição no amadorismo.
A proposta teria ainda que ser negociada com os grandes clubes da época que demorariam pra se adaptar as tendências do futebol mundial. Havia há certo tempo o lucrativo Torneio Rio-São Paulo e esses, além de seus campeonatos estaduais, tinham á sua disposição o mercado de excursões nacionais e internacionais. Foi por isto que a proposta apresentada pelo Brasil, com o apoio do Chile, só contemplou o campeão de cada país.

         Bahia campeão da I Taça Brasil(1959)          

O jeito foi criar uma “taça” onde só participassem os campeões estaduais e que atendesse a hierarquia entre os estados brasileiros. Desta maneira foram criadas três fases antes das finais, se prevendo a entrada dos campeões mineiro e gaúcho na segunda, e dos cariocas e paulistas apenas na terceira. Quanto aos demais estados teriam que “ralar” desde a fase preliminar.
O certame ocorreu “a toque de caixa”. O congresso da CSF terminou em março de 1959 e, cinco meses depois já começava a I Taça Brasil. Somente 16 estados apostaram no certame que começariam em 23 de agosto com o EC Bahia, campeão baiano de 1958, goleando o CSA em Maceió por cinco a zero. Como não havia na ocasião a eliminação sumária por diferença de gols, houve necessidade de outra partida na Fonte Nova, uma semana depois, onde o tricolor triunfou por dois a zero, gols de Marito e Léo.
A fase “preliminar” estava superada, pegando os baianos agora o Ceará enquanto entravam Grêmio e Atlético Mineiro no certame. O Bahia jogaria duas semanas depois novamente fora de casa. Mas as coisas seriam muito difíceis contra os cearenses, contra quem o empate sem gols em Fortaleza obrigaria a vitória na Fonte Nova. Como o torneio ainda não havia caído nas graças do povo compareceram duas semanas depois por volta de onze mil pessoas para ver novo empate entre baianos e cearenses, agora por dois gols. Novo jogo 48 horas após e novo empate, agora por um gol, com menos gente ainda no estádio. Desta vez, porém, Léo iria classificar o esquadrão de aço na prorrogação.
O ponteiro Marito carrega a taça conquistada

A dinâmica do primeiro certame era devezenquandária, com a próxima fase só acontecendo um mês depois. A 27 de outubro entraram em campo baianos e pernambucanos, registrando-se novos percalços. Na Fonte Nova haveria uma difícil vitória tricolor por três tentos a dois, gols de Biriba, Ari e Marito.  Mas uma surpresa esperava os baianos em Recife três dias depois, quando o leão da ilha ferido esmaga o esquadrão de aço por seis a zero.
Por sorte do Bahia ainda não havia sido criado o saldo de gols, dessa maneira, o trabalho de bastidores feito pelo presidente Osório Vilas Boas, o técnico Geninho e outros, apelando para os brios dos jogadores, pode reverter favoravelmente a difícil situação. Um dia após o Dia dos finados, quando o próprio placar der dois dias antes havia permanecido esquecido pelo responsável, ocorre uma vitória heroica do tricolor por dois a zero, graças aos gols de Léo e Biriba.
O EC Bahia passara por três fases chegando as finais com Vasco da Gama, Grêmio e Santos. Dois dias após a autodenominada proclamação da república começariam os confrontos onde paulistas e cariocas jogariam dentro de casa. O Santos ganharia do Grêmio por quatro a um, e poucos dias mais tarde garantiria sua presença na final com um empate sem gols em Porto Alegre. Quanto ao tricolor estrearia de forma sensacional em 19 de novembro derrotando os cruzmaltinos no Rio de Janeiro pelo escore mínimo com tento assinalado por Alencar no início do segundo tempo.
                                         O vereador e presidente tricolor Osório Vilas Boas
Até então, o torneio nacional de clubes mostrava uma problema em relação ao Campeonato Brasileiro de Seleções. É que neste havia o interesse de todas as torcidas que acompanhavam a seleção de seu estado, muitas vezes integrada por jogadores dos clubes detentores das maiores torcidas. Seja por sua novidade ou por esta limitação o certo é que somente nesta fase acorreu um público maior aos estádios. Isto se registrou primeiramente na Bahia quando o estádio lotou (tinha capacidade para umas 35.000 pessoas na época) em 24 de novembro pra assistir a segunda partida entre Bahia e Vasco.
Parecia que se repetiria o feito da seleção baiana de 24 anos atrás quando Ari, faltando apenas 17 minutos pra terminar, empatou o jogo, mas Delem imediatamente daria números finais ao marcador ao favor do Vasco. Já sem o mesmo público, mas com mais de 25.000 torcedores presentes, o tricolor tornaria realidade este desejo ao derrotar o Vasco pelo mesmo marcador da primeira partida, agora com um gol de Léo.
Desseseis dias depois os dois times entrariam em campo em Vila Belmiro pra decidir a Taça Brasil. O gol de Pelé abrindo o marcador aos quinze minutos parecia acabar o sonho baiano que, entretanto, continuaria com o empate do ponteiro Biriba ainda em meados do primeiro tempo. Que dizer da heroica “virada” conseguida por Alencar aos 12 minutos do segundo tempo? O recuo tricolor porém possibilitaria o empate dos santistas quando o jogo já passava dos trinta minutos. Agora a pressão dos comandados de Pelé seria infernal só dando pra atuar nos contra ataques, e foi em um desses que novamente Alencar se consagraria como herói da partida ao no último minuto fazer o gol da vitória.
                                                               A desmoralizada CBD
Demoraria vinte dias para a segunda partida. Os baianos teriam que esperar passar o natal para, na véspera do réveillon voltarem a ganhar um título nacional, agora no profissionalismo. No apagar das luzes de 1959 a Fonte Nova novamente lotaria pra ver...o tricolor deixar escapar o título dentro de casa ao ser derrotado pelo Santos por dois a zero com gols da dupla Coutinho e Pelé no segundo tempo. O “bicho” da vitória peixeira foi de trezentos mil cruzeiros.
É aí que começa a nossa história dos bastidores da decisão. É que o regulamento previa que a partida final se desse uma semana depois, no caso seis de janeiro do novo ano. Mas o time santista alegou compromissos pra não aparecer. Na verdade havia uma questão de fundo no procedimento, o receio de um fracasso financeiro no Maracanã, aonde estava programada a última partida. Na ocasião o seu técnico Lula chegou a propor que os dois clubes fossem proclamados campeões. E, segundo o Diário de Notícias (1/1/1960) o presidente Osório Vilas Boas teria aceitado o oferecimento. No entanto, mais tarde o clube começou a cobrar a falta santista no jogo do dia seis.
O superintendente Amado Monteiro do tricolor chegou a viajar para reivindicar o cumprimento do protocolo neste sentido entre a CBD, o Santos e o Bahia. Na oportunidade afirmou que “se não der proporá a proclamação dos dois campeões”. Mas o time peixeiro acabaria não concordando com a proposta. Acredito que a própria CBD não daria o “sinal verde" pois restaria intocada a questão da representação do Brasil na primeira edição da Taça Libertadores da América.

                                  Pelé, estaria na seleção paulista mas não na final da taça
Nesta época a seleção baiana do técnico Bengalinha estrearia no Campeonato Brasileiro de Seleções ganhando da Seleção capixaba por três a zero em meio a uma guerra de datas entre o “peixe” e o esquadrão de aço estimulada pela CBD. O Santos propõe 13 ou 14 de janeiro mas não seria aceito pelo tricolor que considerava que tinha direito a indicar a outra data já que o Santos não havia comparecido no dia seis.
O mundo continuava a rodar e Bahia e Santos não se acertavam. O tricolor, porém, não se descuidava de sua preparação. Em 10 de janeiro jogaria no certame baiano contra o São Cristóvão ganhando por dois a um. Dois dias depois promoveria um grande amistoso contra o Flamengo, onde sairia derrotado por três a um, numa renda que atingiu 412.560 cruzeiros. Entre um e outro jogo os baianos “fechariam o caixão” dos capixabas empatando sem gols fora de casa.
Nesta ocasião um rumoroso escândalo envolveria o futebol da Bahia. É que haveriam eleições para a FBDT em fevereiro e, no auge dos ânimos exaltados, o presidente da federação, o coronel Bendocchi Alves, agrediu Moacyr Nery, então tesoureiro da Associação baiana dos Cronistas Deportivos-ABCD. A imprensa local porém, apesar de agitar muito o episódio, não iria às últimas consequências coimo faria cinco anos depois no episódio Ney Ferreira. Em 15 de janeiro divulgaria em manchete da página esportiva a sessão do Tribunal de Justiça Desportiva “Sessão extra para julgar Bendocchi”.
                                       A antiga Fonte Nova veria o primeiro título nacional
Quatro dias depois a Seleção baiana enfrentaria a Seleção Paulista na Fonte Nova apanhando pelo mesmo escore que os santistas aplicaram nos tricolores com dois gols do ponteiro esquerdo Pepe. E, no dia 24 de janeiro, os baianos passariam por uma das maiores vergonhas de toda a sua história, ao serem eliminados do campeonato Brasileiro de Seleções por sete a um no Pacaembu. Mas o DN preferiu colocar no outro dia na primeira página o convite de3 Juscelino para que João Goulart integrasse a chapa presidencial de Lott. Todos esses fatos faziam com que a imprensa baiana ficasse cada vez mais apreensiva com a final da I Taça Brasil.
O coronel Bendocchi antecipa a eleição para a véspera e elege-se no dia primeiro de fevereiro merecendo a manchete esportiva do DN:
Clubes amadores reelegem o coronel!
O jornal ainda observa que o candidato de oposição não compareceu e que os escrutinadores foram os presidentes da dupla BA-VI, Osório Vilas Boas e Ney Ferreira. Mais alguns dias e a própria CBD “mete o bedelho” na decisão que não teria entendimento dos finalistas. É o tempo em que os cinemas Aliança, Rio Vermelho e Itapagipe, estão passando o filme Um de nós dois morrerá com Paul Newman. A data também não consegue entendimento e a própria CBD não faz muita questão deixando a coisa pra quando terminar o Torneio Rio-São Paulo, que na verdade era o “verdadeiro campeonato” nos olhos da entidade.
                                      (CONTINUA AMANHÃ)

·         Agradeço as informações do Setor de Periódicos Raros da Biblioteca Central do Estado, do site da Confederação Sul-Americana de Futebol, do Wikipédia e do Blog do Marcão.  Agradeço ainda as imagens do site interfilmes.com e dos blogs: globoesporte.globo.com,arquivologo.worpress.com,esporte.uol.com.br e fmfantasyretrofantasy.blogspot.com.












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