sábado, 19 de março de 2011

Tempo de horror

               Isto aí é fichinha pra época!

Com a publicação de tantos livros sobre o golpe de 64 muita gente tomou conhecimento sobre os acontecimentos políticos de antes, durante e depois desse infausto acontecimento da nossa história. No entanto, pouca gente sabe dos fatos esportivos desses dias.
Jango assumiu no lugar de Jânio em setembro de 1961, após os dez dias que abalaram o Brasil, e com a “solução” parlamentarista. A sua política de sustentação e as contradições entre o presidente e o congresso abriram espaço para as forças populares que conquistaram várias posições, principalmente até o plebiscito que devolveu o presidencialismo.
Após ter, aparentemente, contornado a crise, o presidente enveredou por caminhos econômicos que o isolaram das forças populares abandonando o Plano Trienal. Começa a contagem regressiva de um golpe anunciado por Carlos Lacerda em setembro nos EUA.
                Quem é mais feio Lacerda ou Hulk?
Em janeiro de 1964 professores universitários, liderados por Sobral Pinto, lançam manifesto acusando o governo de complacência em relação à “comunização” do Brasil. Ademar de Barros pede aos cristãos e democratas união contra o perigo comunista num contexto onde o ministro da justiça Abelardo Jurema intensifica as articulações para a reforma constitucional onde prega a reeleição de Jango.
O governador Ildo Menegheti (RS) engrossa o coro da direita denunciando um movimento subversivo programado para ocorrer em janeiro, implicando Brizola, o prefeito de Porto Alegre e deputados da base de Jango. Enquanto isto o governo dá uma no cravo e outra na ferradura.
No dia 11 de janeiro o deputado João Calmon pondera se não é mais prudente que o presidente cumpra o seu mandato pra que não volte como mártir. Alguns dias depois anuncia que “os democratas devem combater os comunistas em qualquer terreno e com qualquer arma”. No outro dia Goulart assina a lei de remessa de lucros. Carlos Lacerda acusa o governo de apertar o cerco contra a Guanabara e o Cardeal Jayme Câmara acusa uma conspiração revolucionária do governo.

No fim de janeiro o presidente da UDN Bilac Pinto “denuncia” que estaria sendo distribuídas armas aos sindicatos de trabalhadores rurais no mês que é criado o Movimento do Rosário da Família pelo padre Peyton.
Fevereiro começa com o Corinthians ganhando do Botafogo num amistoso (vejam lá se havia clima pra amistosos!) por três a dois no dia sete. A quatorze Castelo Branco, na aula inaugural da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, condena o comunismo e adverte os oficiais para seus deveres com o Exército e a pátria. No entanto, mais tarde o presidente é homenageado no 19º aniversário da tomada de Monte Castelo por tropas brasileiras na Itália.
Os gaúchos fazem uma série de promoções esportivas na ocasião. A Portuguesa de Desportos e o Corinthians visitam Porto Alegre. O Inter vence a equipe inspirada nos lusitanos pelo escore mínimo, enquanto o Grêmio empata sem gols.
            Esta tortura não dá nem pra melar!

Quatro dias depois, em 25 de fevereiro, Brizola é impedido de falar em Belo Horizonte no Congresso dos Trabalhadores da América Latina. Antes do mês se encerrar ainda dá tempo pro São Paulo ir á Campinas e derrotar a Ponte Preta, para o Atlético Paranaense visitar Porto Alegre (perdendo de três a zero), e ao Atlético Mineiro viajar pra Governador Valadares onde derrota o Democrata local por dois a um. Pra quem ainda não sabia do golpe este resultado mostrou que a democracia não estava com nada na ocasião!  
Março se inicia com a alta do dólar, quando o presidente autoriza O Banco do Brasil a intervir no Câmbio. O Cruzeiro empata sem gols um amistoso com o América (RJ). No dia sete Jango recebe presente de aniversário de oficiais em Brasília. Para, um dia depois, o Guarany de Campinas vencer os diabos rubros cariocas por dois a um.
Quatro dias depois ocorre o comício direitista no bairro de Bonsucesso, Guanabara, embora só reúna duas mil pessoas. Ao tempo em que em Belém, se trava o clássico local, onde o Paissandu ganha do Remo pela esquisita contagem de cinco a três.

No dia doze o Diário de Notícias-RJ publica uma declaração de diretor da Associação Comercial do estado quer afirma “armai-vos uns aos outros porque nós já estamos armados”. No outro dia o comício da Praça da República com duzentas mil pessoas é televisionado e o presidente se compromete com uma série de reformas populares que envia ao Congresso Nacional reagindo à direita com o pedido de seu impeachment.
Mas outras coisas importantes aconteceram neste dia. O Olaria, por exemplo, achou justamente esta ocasião pra começar uma temporada no Norte e Nordeste, estreando com um empate em dois gols com o Náutico. Dois dias depois jogaria em Campina Grande ganhando do Treze de campinas por dois a zero.
Dia 17 Costa e Silva adere ao golpe e passa a ser sua mais alta liderança militar, e é quando Carlos Lacerda envia carta circular aos governadores conclamando-os a formarem um bloco contra a “guerra revolucionária”. Dois dias depois a direita se assanha ainda mais promovendo uma marcha pela família, com Deus pela Liberdade em São Paulo, onde a farta utilização da máquina pública garante a presença estimada em quinhentas mil pessoas.
Ainda quer pegar o celular?

Dois dias depois é o nosso EC Bahia começa uma excursão a Recife com um empate sem gols contra o Sport. Lacerda passa a fazer abertamente articulações com governadores onde afirma que uma Assembleia Constituinte seria o prenúncio de uma ditadura.
No dia 22 o ministro Silvio Mota manda prender diretores da Associação dos Marinheiros e Fuzileiros navais que haviam comparecido a uma reunião sindical. Enquanto isto o Bahia vence o Náutico (2 X 1), o Olaria chega a Belém (onde empata em um gol contra o “papão do Curuzú”) e o Grêmio vai a Curitiba golear a equipe do mesmo nome por quatro a um. Mais um dia, é realizada em Santos uma marcha semelhante à de São Paulo com a presença de oitenta mil pessoas.
Os marinheiros e fuzileiros se concentram no Sindicato dos Metalúrgicos (RJ) sendo vãs as tentativas de desentocá-los. A crise só acaba no dia 27 com um acordo que passa pela liberdade dos dirigentes, que só saiu após novo clássico paraense onde Remo e Paissandu não tiram o zero do placar.
                      Como agente apanhava!

No dia 29 o Olaria se despede das canchas paraenses empatando em um gol contra o Remo. Em sua saída, porém, é substituído pelo Palmeiras que resolve sair em excursão. Os pernambucanos tem muito a se queixar desta época. Pois além do golpe tiveram que suportar a presença do alvi verde paulista. Imagine que o porco, dois dias antes do golpe, ganhou do Sport por quatro a um e, não contente com isto, enquanto as tropas do general estavam, na estrada, fulminou no Náutico por quatro a zero.
O calendário político ainda verificaria a homenagem de Jango no Automóvel Clube pela Associação dos Sargentos da PMERJ, no dia 30 de março, enquanto oficiais se reúnem no Clube Militar onde fazem dura crítica á CGT.
Na madrugada do outro dia as tropas do general Olympio Mourão Filho marcham de Minas Gerais para o Rio de Janeiro. Durante seu trajeto (não interrompido pelo governo) vão estimulando apoios militares em vários estados.

A CGT e a UNE convocam greve geral no dia primeiro de abril. Mas a greve não chegou ao interior do Paraná, senão o Londrina não perderia pro Jacarezinho de Mogi Guaçu por dois a um. Bem feito pra ele por furar a greve!
A partir daí são feitas prisões de lideranças políticas e sindicais em todos os cantos do país, enquanto Jango tenta conseguir apoio “por cima” pra permanecer no cargo e perambula do Rio para Brasília e para Porto Alegre.
Enquanto viaja, na calada da noite se trama a sua destituição com a declaração do cargo de presidente vago e o empossamento do deputado Ranieri Mazzili numa sessão realizada na madrugada. Ao tempo em que uma nova marcha pela família ocorre na Guanabara com a participação de cerca de um milhão de pessoas.
Voçê quer que tenha imagens da tortura?

Com exceção do Mato grosso, não achei ninguém que tenha se arriscado a jogar nesses dias. No dia quatro de abril (uma sexta feira) encerram-se as greves de resistência, sendo uma das últimas a dos petroleiros da Refinaria de Mataripe na Bahia. Nesse dia uma assembleia do Clube Militar (RJ) exige a cassação de todos os parlamentares que consideram comunistas.
No fim de semana os paraenses fominhas do Remo e Paissandu fizeram outro jogo, agora com o papão perdendo por dois a um. E o EC Bahia iria a Candeias jogar com a seleção do município, vencendo por quatro a zero.
O fim de semana foi um verdadeiro sufoco dadas as medidas que fecharam os bancos. Mais mesmo assim se arranja uma farsa, uma manifestação na porta da casa do general Castelo Branco propondo que assuma a presidência.

                                    Vão levar pra onde?
Consumado o golpe, seus dias posteriores foram uma espécie de “salve-se quem puder” para os militantes que sonhavam por reformas no Brasil. Na segunda feira é editado o Ato Institucional No 2 legalizando prisões e impondo punições a milhares de civis e militares.
E, na terça, sai à lista de cassações que engloba 39 parlamentares e 58 personalidades, ao tempo em que o Bahia arranja um amistoso com o Galícia na Fonte Nova onde os atacantes fizeram greve de gols. Na quarta ocorrem as “eleições” para presidente no Congresso para onde são conduzidos Castelo Branco e José Maria Alkimim.
As universidades são vasculhadas pelo novo AI, regulamentado em 27 de abril. Só no IPM da UNE são indiciadas setecentas pessoas, num tempo em que a ditadura, por não caber mais presos nas instalações militares, apelou para o recurso de trancafiar opositores em navios fundeados perto da costa.

O próximo mês começa com o tricolor jogando com Leônico (1 X 1) e Galícia (2 X 0) na Fonte Nova. Três dias depois, em 13 de maio, o Brasil rompe com Cuba. No dia primeiro de junho baixa a lei anti greve. E, em 22 de julho, o mandato de castelo Branco é prorrogado até 1967, quando se entendeu que o regime tinha vindo pra ficar.
No fim de julho seria organizado o primeiro torneio destes tempos sombrios com a participação de Bahia, Vitória, Galícia e Leônico. Enquanto isto as oposições já encetavam a resistência que iria durar pelo menos duas décadas.

·        Agradeço as contribuições do Almanaque do Futebol Brasileiro, e dos blogs rodolfostenki.blogspot.com,hiperbazar.net,noticias.r7.com,bocadoinferno.com,quadrinhos.wordpress.com e baixakijogos.com.br.  

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