A “república” no Brasil afirmou que acabou com a monarquia. Mas isso não aconteceu no futebol que, desde que foi criado, os clubes do eixo Rio - São Paulo reivindicaram o “direito de nascença” na região. Assim, os clubes das demais regiões viveram por muito tempo uma verdadeira Era do gelo até que fossem aceitos no circulo fechado da elite do futebol brasileiro. A Bahia sofreu com isto mesmo que o futebol fosse aqui introduzido na mesma época em que surgiu no Rio-São Paulo.
Muitas coisa mostram isso com clareza. Durante certo tempo a seleção “brasileira” só jogou em São Paulo. Só com muita reclamação dos cariocas é que dividiram o bolo, indo jogar também no Rio de Janeiro. Passariam décadas até que fosse convocado um jogador fora deste eixo, Mica do Botafogo baiano em 1923. Nosso estado contaria com a honra de ser o primeiro que a seleção visitou, em 1934, vinte anos depois de começar a existir.
Isto também pode ser observado no intercâmbio desigual entre os clubes das regiões. A primeira visita de equipes do Sul á Bahia só ocorreu após a Primeira Grande Guerra, quando o Botafogo carioca arrasou a seleção baiana no antigo campo do bairro do Rio Vermelho por sete a um!
Veja a desproporção com os baianos!
Nos anos vinte esses clubes só vieram “passear” em Salvador. O Comercial(SP) derrotaria a nossa seleção(2 X 1) e junho de 1920. Um ano depois seria a vez do América carioca e do Vila Isabel(!), que juntos jogaram nove partidas ganhando sete, empatando uma(Seleção baiana 1 X 1 América) e perdendo uma (Combinado Henrique Dias 4 X 1 Vila Isabel).
Em abril de 1923 o Fluminense seria o primeiro clube carioca a jogar no recém construído estádio da Graça. Mica foi convocado porque sua equipe, o Botafogo, conseguiria vencer o pó de arroz(assim como um combinado baiano em que ele jogou)por dois a um. Quanto ao resto foi tombando um a um, os famosos Associação Atlética(3 X 1) e Baiano de Tênis(2 X 0), e o próprio Botafogo(2 X 0), conseguindo o Vitória um empate em um gol.
Quatro anos depois o São Cristóvão nos visitaria. Continuavamos na geladeira, vendo nossos melhores times serem batidos, Ypiranga(2 X 1), Vitória(4 X 1), Combinado de Salvador|(3 X 0), conseguindo á muito custo o Baiano de Tênis obter um empate em três gols.Antes de terminar a década, em maio de 1929 viria o Santos, para ganhar de “Deus e o mundo”. Daria goleadas humilhantes na Associação(8 X 1) e Ypiranga(5 X 2) e venceria o Baiano(4 X 2).
Se daria ao luxo de escalar o time misto pra derrotar o combinado Fluminense-Guarany(5 X 3) e empatar com a seleção baiana em dois gols. Até esta época os baianos tinham jogado vinte e sete partidas contra as equipes do Sul, perdendo vinte, ganhando apenas três e obtido quatro empates.
A agua não estava pra peixe!
A Era do gelo durou por toda a década de trinta. Vieram aqui o Bangu(1930), o Vasco da Gama(1931), o Flamengo(1932), o Andaraí(!), São Cristóvão e o Bandeirantes(!)(1933), a seleção paulista e a seleção brasileira (1934),o Brasil(1935), de novo o São Cristóvão e Botafogo, e o Espanha(1935), voltaram por aqui o Santos e o Vasco(1936), o Corinthians(1936), Madureira, São Paulo Athlétic, Palestra Itália, e mais uma vez o São Cristóvão(1937), mais uma vez Corinthians e Flamengo(1938), e, por último outra vez América e Santos(1939).
A estatística da década é enganadora. Se olharmos os números frios perceberemos uma ampla vantagens dos sulistas, com os baianos sofrendo 59 derrotas, 35 vitórias e quatorze empates. No entanto a coisa é bem pior se tirarmos os inexpressivos Andaraí, São Paulo Athlétic, Madureira, Bandeirantes e Hespanha, da conta, o que reduz as vitórias para apenas 18.
A Era do gelo invadiu os anos quarenta dando a impressão que duraria milhões de anos como sua congênere famosa fez com o planeta. A “sorte” dos baianos é que houve uma guerra que reduziria bastante o intercâmbio. Desta forma só apareceram por aqui Vasco e Bonsucesso(1941)(, Botafogo(1942), o sempre presente São Cristóvão(1944), e, logo que acabou a guerra Corinthians, Fluminense e Internacional(1945), Bangu(1948) e Olaria(1949).
Não dava nem pra se equilibrar!
Os clubes da Bahia só ganharam quatro partidas, perdendo dezenove e empatando dez. O último ano em que só o campo da Graça existia teve ainda por aqui o Atlético Paranaense, o Grêmio, e os cariocas Madureira e Flamengo possibilitando resultados melhores.
A primeira década do novo estádio da Fonte Nova coincidiria com a última da Era do gelo. Novamente o primeiro visitante seria o Fluminense, seguido pelos cariocas América, Bangu, Flamengo, Botafogo, Vasco, Olaria e Madureira, alguns mais de uma vez. Os paulistas do Palmeiras, Santos, Portuguesa, Corinthians, São Paulo e Taubaté. E ainda alguns mais na véspera da inauguração da Fonte Nova. São 37 derrotas, vinte vitórias e vinte empates.
O torcedor ficava gelado!
O seu finzinho foi o início de uma nova condição, possibilitada com o “degelo” que representaram as excursões da dupla BA-VI á Europa e a aderência definitiva ao profissionalismo. O frio do Sul nunca mais assustaria os baianos. Acabara definitivamente a época dos passeios na Fonte Nova, que havia levado quarenta anos, muito menos do que a verdadeira era do gelo.
· Agradeço as informações do Almanaque do Futebol Brasileiro e do Setor de Periódicos Raros da BCE. Sou grato ainda as imagens dos blogs fica-dica.com,tipojosewilker.blogspot.com,downloads.openygroup.com e donodaverdade.com.br.
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