quinta-feira, 26 de maio de 2011

O dia do diabo

  
                                                                     Como caíste do céu, ó Lúcifer,
                                                                     tu que ao ponto do dia parecias tão brilhante?
                                                                                                                           Isaías 14:12

Há muita divergência sobre se o diabo merece ou não um dia. O argumento dos demonistas de plantão, no entanto é convincente. Eles dizem que se a Igreja consagra a deus todos os dias porque o pobre não pode ter um diazinho? Lembram ainda que não podemos esquecer que Lúcifer era um anjo da horta do céu. 
Dizem que no início era um querubim da guarda de deus que queria se tornar igual a Ele, aí, e vocês sabem como é a política lá no céu, foi lançado fora do Paraíso. Mas Lúcifer tinha seguidores e a própria Bíblia diz que levou um terço dos anjos com ele, quer dizer esvaziou o céu. Ah miserável, é por isso que vivemos nesta “pendenga” danada neste vale de lágrimas. O inferno teria sido criado pra esses anjos maus. Seria uma espécie de partido que faria oposição a deus pra atentar contra a sua maior criação que seria o ser humano.
Mas Lúcifer e seus seguidores tem muita mágoa da bíblia. Dizem que foi ela que os consideraram espíritos do mal. O pessoal da linha oficial usou o nome de Lucifer em todas as coisas ruins do planeta.  Na Antiguidade foi conhecido como espírito causador de doenças, tragédias e guerras.  E foi na Grécia que lhe deram o apelido de demônio.  Não contentes com isto lhe chamaram de diabo, monaquite, satanás, e outros nomes impublicáveis.
                                                   Ora, o pessoal fica jogando praga!

O negócio já tem milhares de anos e chegou aos nossos dias. Há os que dividem as pessoas nas que são “do bem” e as que são “do mal”. Que consideram que o diabo penetra nas pessoas ruins ou possuídas e inventaram formas de exorcismo para tirá-lo dos corpos. Esse pessoal quis até fazer de Exu (um orixá mensageiro que leva o pedido das filhas de santo) a encarnação do demônio.
A concorrência entre deus e o diabo nos nossos dias é tão grande que a bíblia já lhe destinou três capítulos, o Isaías 14, Ezequiel 28:13-19 e Apocalipse 12:4-12.  Daqui a uns dias não vai falar de outra coisa. Nos dias de hoje Lúcifer pensa que é mais famoso do que deus. Outro dia fez uma gravação para You Tube dizendo que enquanto Hollywood só fez um filme pra Ele, A volta do todo poderoso, e, o de Glauber Rocha fez divide as honras, Deus e o diabo na terra do sol, ele tem centenas, tipo Os guerreiros do Armagedom, O diabo veste Prada, Cinderela, e até a série Supernatural.
                                             Vejam se Jader Barbalho não parece o diabo?

Isso sem contar as diversas sociedades e seitas que o cultuam. E avisa que não adianta taxar 666 de número da besta que já se apossou de outros números. Já tem, até uma cidade, Hell, nos EUA, onde se fazem festas em seu nome. Na Grécia até hoje se comemora o seu nome e são tantas datas que lhe dedicam que ele ainda não escolheu uma. Mas tem predileção pelo 13 de agosto.
                                              E ele ainda queria mandar tudo pro inferno!

Mas o artigo de hoje é para contar a vocês quando o diabo apareceu de público nos estádios baianos. Ele sempre deu preferencias aos “amistosos”, pois esse negócio de respeitar tabelas, jogos marcados com antecedência, para ele são coisas do governo do céu.
Assim, a primeira vez que apareceu foi em agosto de 1932. É que estava marcado um estranho jogo: EC Bahia X Guarda Velha pro dia treze. Ninguém tinha ouvido falar daquele time. Como não existia ainda o Aurélio os torcedores apelaram pros vade-mécum de plantão pra ver se sabiam de alguma coisa, mais nada!
E o pior é que caiu o maior “toró” nesses dias e houve raios e trovoadas. Se fosse só isso era fichinha, pois os baianos estão acostumados a chuva, alagamentos e deslizamentos. O problema é que os cães começaram a morder, e houve incêndios á beça. Parecia que o fogo estava chegando.

                                                    Maryl Streep é o diabo em pessoa!

Aí desconfiaram que pudesse ser armação com o clube tricolor que tinha sido fundado no ano anterior e anteciparam a partida de surpresa para três dias antes. E olha que era armação mesmo. Os anjos (ou demônios?) mandados por Lúcifer invadiram o gramado da Graça, enfiaram a maior goleada que o novo time havia tomado, seis a três, e, não contentes com isso, ainda levaram todos os torcedores presentes para o inferno. Eu só soube da história porque fui pesquisar nos livros secretos do diabo.
Salvador teve sete dias e sete noites de fogo e o diabo ainda incentivou a revolução constitucionalista daquele ano, mas seus seguidores não arranjariam nada sendo derrotados pelo governo do deus Getúlio. A Bahia continuou vivendo sua vidinha com um problema ou outro. Um Estado Novo pra cá, uma guerra pra lá, uns governantes miseráveis (que já estamos acostumados) até que chegou ao fatídico mês de agosto de 1948.
O governador Octávio Mangabeira anunciava a todo mundo que a Bahia iria participar da IV Copa do Mundo (que nenhum país quis, mas que o governo federal organizava pra dois anos depois) pois estava construindo o belo estádio da Fonte Nova. Foi por isso que agosto ficou conhecido como o mês das desgraças. Inadvertidamente, apareceu um time chamado Ypiranga, sem ser amarelo e preto.
                                                              Mas é feio de doer!

Foi logo marcando jogos com os melhores times da época. Os baianos antigamente recebiam os visitantes na maior generosidade. Não é á toa que ficamos conhecidos como a boa terra.  Hoje o capitalismo estragou muito essa maneira de ser mas muita gente continua procedendo assim. Mas voltemos ao tal Ypiranga que disse que era de São Paulo.
E o pior é que ninguém tinha cara de paulista e que começavam os cachorros a uivar e os raios a cair. Até as aguas da baía de todos os santos começaram a se agitar de tal maneira que naqueles dias ninguém saiu pra pescar. Naquele tempo nem tinha celular pra conferir e naquele trambolhão preto demorava muito a informação. Os caras acabaram estreando contra o Vitória e perdendo de três a um.

                                                          Será que o Lucifer posou?

Pronto, aí acabaram as suspeitas! Os baianos pensaram que tinham pegado “o seu”. Era claro que não eram paulistas pra jogar daquela maneira e, quando o tal do Ypiranga pediu revanche ao Vitória, foi motivo de riso nas rodas da Avenida Sete. Mas o que aconteceu naqueles dias foi de arrepiar. Não vi pois só tinha quatro meses de idade, mas minha mãe trancou todas as portas pra proteger a mim e a minha irmã dos trovões e dos seres estranhos que batiam á porta. Mas pouco adiantou pois surgiam monaquites de baixo da cama para puxar nossos pés.

                                                Não era fácil a vida da gente antigamente!

A terra se abriu naqueles dias e engoliu carros na Avenida Vasco da Gama, embora isso não seja novidade em função dos buracos. E surgiram monstros no Dique do Tororó assustando os passageiros dos bondes que passavam por ali. O rubro negro baiano perdeu dos tais paulistas pelo mesmo escore e graças a deus que meu pai não foi ao jogo. Só soubemos do resultado pelo radialista Pérfido Lino Neto mas não sobrou um só torcedor pra contar a história.
                                                                  E tome filme!

Salvador viveria mais nove dias de inferno. O fogo ardia nas ruas, e fazia renascer os vendedores de agua. Até o próprio Quartel do Bombeiros da Baixa dos Sapateiros incendiou. E isso no dia em que o Ypiranga dito paulista ganhou de seu homônimo local pelo extravagante escore de sete a três.
Ninguém mais queria ir aos jogos que ameaçavam acabar com a torcida baiana toda recrutada para os quintos do inferno. As famílias baianas contavam os dias pra eles irem embora. Mas isso aconteceu somente no último dia do mês quando os “paulistas” enfrentaram o EC Bahia. Ninguém foi ao estádio da Graça. Só a Rádio Sociedade, chamada pelos íntimos de PRA-4, colocou um repórter numa casa vizinha que viu as verdadeiras atrocidades que ocorreram por lá.
                                  Botaram Lucifer e seus seguidores pra fora do trio elétrico!

O primeiro atacante do Bahia que ameaçou chutar em gol foi tragado por um buraco que se abriu em campo e que fechou miraculosamente depois. O mesmo destino teve o goleiro que se atreveu a defender uma bola chutada pelos estranhos visitantes. O resultado não podia ser outro do que uma goleada: cinco a zero pro time de Lúcifer. Após a partida Octávio Mangabeira, que não era besta, baixou um decreto exigindo que se colocasse a cruz em todas as portas da cidade, colocando todos os materiais inflamáveis num depósito e chegou ao ponto de proibir o uso de expressões que lembrassem o inferno. Não se pode nem usar mais “que diabo”!
Isso fez com que o diabo demorasse de voltar a aparecer na Bahia. Foi o paraíso para as religiões que esculhambaram o diabo a vontade. Ninguém mais queria ser seguidor de Lúcifer. Até eu, nos anos 60, preferi chamar o conjunto musical que tinha de Os anjos, ao invés de Os demônios.
Mas um dia o próprio sentiu as orelhas coçando de tanto falarem mal dele. E aí surgiu novamente. E olha que desta vez foram os baianos que provocaram. Imaginem que em 1986 foram fazer um jogo logo no dia 13 de agosto, dia consagrado ao diabo! A partida era chinfrim, entre Bahia e Catuense mas antes de ser realizada voltaram aquelas coisas que os antigos conheciam.

                                   Deus e o diabo acertando as coisas da poítica brasileira!

Ainda bem que o diabo só apareceu no dia do jogo da Fonte Nova. Naquele dia as aguas se abriram e o pessoal teve que ir á pé pra ilha de Itaparica. Ainda bem que o governador João Durval mandou trancar os materiais inflamáveis.  Mas não deu certo pois ele mesmo estava inflamado pois Waldir Pires era o favorito na eleição.
O pessoal se precaveu e deixou o estádio ás moscas. O Bahia ganhou de dois a um, mas nunca mais se ouviu falar de seus jogadores ou dos da laranja mecânica, e muito menos das moscas que se arrependeram mortalmente por azucrinarem os diabos na Fonte Nova.
Depois daí só se ouviria falar do diabo na Bahia em 2007, quando o Bahia estava na Terceirona e o Vitória na Segundona. É que não houve quem conseguisse que jogassem no dia 13. A CBF bem que tentou pois não havia conseguido nem uma grana do diabo, mas o tricolor acabou jogando no dia doze e o rubro negro no dia quatorze, foi por isso que os dois ganharam, o Atlético Cajazeirense (alguém conhece?),na Paraíba, por três a zero, e o Gama, no Barradão, por três a um.
O diabo não saiu da toca, e tomara que fique por lá, vade retro!

·         Agradeço ao Almanaque do Futebol Brasileiro e aos sites público. pt, Bola na área, Wikipédia e Futipédia, e aos blogs setimodia.worpress.com,  historiadocinemabrasileiro.com.br e castanheirabarros.homesteqad.com.

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