segunda-feira, 11 de julho de 2011

Esperando passar a guerra

           
                                             
O ano em que se iniciou a Primeira Grande Guerra só foi ruim para os outros. Na Bahia, porém, tudo foi bem em matéria de futebol. Pois a guerra aqui havia sido dois anos antes quando os clubes grã-finos se afastaram da liga por não concordar com jogadores “de cor”, por haver no Campo da Pólvora uma torcida mais popular atraída pelo crescimento do esporte, pela existência de uma nova liga dos clubes pequenos, e pelo fato do Campo da Pólvora ser “muito aberto” e o Campo do Rio Vermelho ter acesso péssimo.
No terceiro campeonato baiano, realizado em 1907, os jogos foram transferidos para o segundo para que pudesse ser cobrado ingresso e “selecionar” o público. Criaram as cadeiras, as gerais, os cavaleiros e as carruagens. Embora não fosse brincadeira levar o pessoal para o bairro tendo em vista a precariedade dos transporte.
Dessa forma até que fosse construído o estádio da Graça em 1920 ficou essa pendencia sendo os jogos do Campo da Pólvora muito mais populares. Os clubes que saíram na leva de 1912, entre eles o SC Vitória, só voltaram na animação para a construção do estádio que permitiu unificar o fut6ebol baiano.
                                                    Andar era mesmo de bonde!

Mas em 1914 houve um renascimento de ânimos e foi fundada uma nova liga.  O Ypiranga se filiou à liga dos pequenos e o tradicional Internacional se refiliou, voltando ao convívio da mesma. Imaginem que de todos os lados surgiam clubes, da elite, dos trabalhadores, dos bairros populares e das escolas, sendo fundados os Yankees FC, a Associação Athlética da Bahia, o Caixeral SC, o tradicional Botafogo SC, o São Bento, o Primeiro de Novembro, o Tejo, o Guarany, o Néo-Grego (sic!), etç., etç.
Não dá pra entender pelo Almanaque Esportivo a razão de toda esta animação. Está claro que isto se deve ao crescimento do futebol, mas o que se diz ali foi que isto se deu em razão de uma temporada do navio escola Benjamin Constant (?), mas o que eu acho mesmo é que se deve á solução do conflito político entre o governador e o presidente da Assembleia Legislativa que acabou com a existência de dois governadores, a capital do estado sendo mudada pra Jequié e o bombardeio do Palácio do Governo na Rua Chile.
Vocês não sabem que baiano também briga? Quanto ao Benjamin Constant caiu de quatro para o mais querido, e não conseguiu ganhar nem na revanche que acabou empatada por um gol. Com tanta novidade o campeonato só começou perto do São João com o Fluminense ganhando do Brasileiro por dois a um.
                                        Era um tempo em que homem tinha que ter bigode!

Já o auri negro arrastou uma multidão ao Campo da Pólvora para ver a sua estreia que terminou sem gols contra o mesmo Fluminense. A primeira equipe do clube que tantas glórias deu á Bahia foi á campo com Astrolábio, Turíbio e Albertino; Lelé, Coelho e Spínola; Aloysio Bahia, Carvalho, Macaggi, Pinheiro e Arthur Silva. Mas nesse ano não arranjou nada a não ser no certame de Segundos Times.
O Internacional sagrou-se campeão invicto e levando apenas um gol, do Brasileiro, no jogo em que venceu por dois a um. Mas, nem se pode falar de absurda superioridade pois todas as suas partidas foram vencidas pelo escore mínimo. Seu time tinha como base Nova, Luiz França e Oscar Nova; Elpídio, Trigueiro e Constâncio Diogo; Dermeval Macedo Neves, Álvaro Tosta, José Soares, Pinheiro e Raul Bonfim.
Quanto a Liga Sportiva da Bahia sobreviveu dois anos, organizou campeonatos embora não tenham reconhecimento oficial até hoje! Quanto á animação terminou cedo. É que naquele tempo qualquer juiz ladrão, faltas em campo, ou vaias da torcida terminava em discussão na liga.
                                           Os grânfinos não queriam saber de porrada!

Foi por causa disso que o Guarany abandonou o certame no meio do ano seguinte e o próprio Ypiranga quando terminou o campeonato que o Fluminense conquistou. Seguramente isso se deve as partidas decisivas do mês de setembro quando o auri negro perdeu por dois a zero de seu principal concorrente, e, como os “índios” haviam saído, estes acabaram levando a taça de lambuja.
O campeonato de 1916 foi mais pobre, contando com apenas cinco clubes e sem a presença de Ypiranga e Guarany. Pra complicar a Intendência Municipal proibiu a realização de jogos no lugar de maior afluência de público, o Campo da Pólvora, sob a desculpa de que iria ajardiná-lo. Assim, o jeito foi a liga parar o certame e fazer um contrato com o proprietário do terreno do Rio Vermelho.
O público diminuiu em 90%, em função da dificuldade do transporte e da cobrança de ingressos. No retorno o Botafogo ganhou do Sul América por seis a um com o campo ás moscas. Foi o único título baiano que o República conquistou em sua história, e invicto, com quatro vitórias e quatro empates, graças a ser reforçado com atletas do co-irmão Ypiranga que se omitiu em participar.
                                          Pô, sacanagem bombardear o Palácio Rio Branco!

O Ypiranga, como time popular, só voltaria á liga no ano da revolução russa. O auri negro passou no fio todos os adversários, saindo também invicto e tomando um único gol, do alvi rubro na vitória por três a um, levando a taça oferecida pela Casa Condor. Este ano apresentou como novidade a formação do selecionado baiano. Foi durante as festas de aniversário da cidade de Aracajú, capital do vizinho estado de Sergipe que já fez parte da Capitania da Bahia.
Primeiro foi o República que foi jogar no vizinho estado perdendo pelo escore mínimo daquele selecionado. E, no dia da morte de Tiradentes, os sergipanos vem bater por aqui pra fazerem uma guerra interna contra os baianos. Tiveram uma recepção de primeira. Um trem foi espera-los em Periperi, teve filarmônica tocando, corbeille de flores, sessão solene na embaixada e tudo. Mas na hora do jogo o República não teve dó nem piedade vencendo por sete a zero.
Aí os sergipanos resolveram pedir revanche. A derrota havia sido muito humilhante, mesmo que significasse uma vitória para cada lado. E quem foi enfrenta-los no outro dia foi a própria seleção baiana. Como já tinha apanhado de sete a assistência não foi das melhores. Uma pena não assistir a primeira exibição de nosso selecionado, que venceu por seis a um.

                                               Naquele tempo nem havia Lady Gaga!

Nossa seleção jogou com João Nova, Carapicu e Péricles; Anysio, Artur Coelho e Elpidio; Carlito, Tosta, Oscar Nova, Pernambuco e Franco. Enquanto os sergipanos formaram com Victor, Cravo e Lauro; Jonas, Leite e Dudu; Carneiro, Clóvis, Godofredo, Umberto e Waldemar. O futebol dos vizinhos havia sido desmoralizado, tanto que nem quiseram mais saber de jogos com os baianos por algum tempo.
O último ano da guerra mundial viu continuar as guerrinhas baianas. O campeão República se afastou antes do início do campeonato, ajudando a exculhambar o certame, e o Fluminense quase se retira também alegando “maus costumes” dos torcedores. Mais tarde um jogo entre Ypiranga e Botafogo, ganho pelo primeiro por um a zero, e onde o alvirrubro fez um gol em impedimento, foi absurdamente anulado pela liga que passou por cima de tudo pra ajudar os diabos rubros.
A indisciplina campeava no Rio Vermelho cujas “arquibancadas” estavam de fazer dó. Do arame que cercava o campo do Rio Vermelho nem sinal. Da grama quase nada mais restava, e até a garagem onde os jogadores mudavam a roupa estava pra cair. Os atletas ameaçavam vestir a roupa em campo na vista dos assistentes, inclusive senhoras, que horror!
                           Foi nesta época que se começou a construir o metrô de Salvador!

Culpava-se os juízes por tudo, os jogadores jogavam faltando peças do uniforme, e a porrada rolava solta fazendo inclusive com que os times terminassem os jogos com menos jogadores. A fase sem estádio do futebol baiano vivia seus últimos dias e perdia jogadores até pra Sergipe.
Neste ano bem que se tentou trazer o famoso Palestra Itália pra jogar no estádio. Conversou-se muito, anunciou-se e...nada. Os paulistas nem deram bola pros baianos. Foi se formando um consenso que as coisas não podiam ficar assim. A liga se movimentou realizando um festival pra arrecadação de fundos pra melhorar as condições da prática do futebol.
Este, entretanto, se foi um fracasso financeiro, pelo menos serviu pra alertar a sociedade de que aquele que estava se tornando seu principal esporte poderia ir “pras cucuias”. Neste ano o Ypiranga se sagrou campeão aos “trancos e barrancos” e se começou a pensar em construir um estádio para o futebol da Bahia. Mas isso só viria em 1920, após terminar a guerra na Europa.

·        Agradeço ao Almanaque Esportivo da Bahia (1944) e aos blogs outroladodanoticias.com e cetesquerda.blogspot.com.  

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