sábado, 6 de agosto de 2011

O vil metal


       
                                                             Dinheiro na mão é vendaval,
                                                             é vendaval na vida de um sonhador.
                                                             Quanta gente aí se engana
                                                              e cái da cama com a ilusão que sonhou.
                                                                                                Paulinho da Viola
                                                           
O professor universitário de crítico de cinema André Setaro assombrou o mundinho baiano ao colocar na Face book um anúncio onde pedia dinheiro sob a alegação de que estava passando fome. Imagino o que deve ter chovido em sua caixa de indignações. Naturalmente, não de sua situação ou oferecendo ajuda, mas para censurá-lo por ter a coragem de colocar as coisas do vil metal em público.
Eu mesmo tive o desprazer de escutá-las.
- Mas um professor universitário se expondo assim. Isso é um absurdo!
                                                      Agente passa o maior "miserê!

Tudo isso por Setaro ter tido coragem de dizer que o rei está nu! Quer dizer, o professor universitário pode passar fome, desde que não confesse isso a ninguém! O comportamento faz parte do faz de conta que vivemos no Brasil. Só o pessoal que vive fora pensa que estamos bem.
Nos anos 90 convenceram a classe média a sustentar esse modelo que faliu nos EUA e que Lula continuou. Estimula-se o consumo de automóveis, apartamentos e eletrodomésticos. Tudo sustentado em dívidas com o cartão de crédito. O cara não tem dinheiro e entra num circulo vicioso sem fim, quando acaba um começa a pagar outro. Quarenta por cento da população está endividada.
As cidades passaram a ser insustentáveis com as construtoras metendo a mão em todos os terrenos para servir à especulação imobiliária. O transito virou um inferno com tantos carros. Quase que não há mais sinal da antiga Salvador. No fim do ano que vem teremos quase um milhão de carros numa cidade totalmente despreparada para essa situação. Não há mais nenhum horário sem engarrafamento, a educação e a saúde vão de mal a pior e as vias públicas estão totalmente degradadas.
                                                Não adianta chorar Junior é isso mesmo!

Mas vamos reconhecer uma coisa na atuação de nossos governantes, eles realmente conseguiram democratizar a insegurança: hoje qualquer um pode ser assaltado, sofrer uma “saidinha bancária”, ser sequestrado ou receber uma bala perdida. Esta semana, até o progresso dos bueiros que ameaçam explodir chegou a Salvador.
Nós aqui em casa entendemos perfeitamente a queixa de Setaro, ainda mais que também somos sofredores públicos. O dinheiro que recebo da UFBA vai embora em cinco dias. São 2.000,00 de Imposto de Renda (em função de ter tido maus contadores), 1.500,00 de planos de saúde, 500,00 de condomínio, 650,00 da empregada e 700,00 pra ajudar meu velho pai. Os 1.500,00 que sobram tenho que guardar pra alimentação e transporte.

Posso dizer, com muito orgulho, que sou um gigolô, sobrevivo no dia a dia com o dinheiro que minha mulher ganha e que vai colocando no meu bolso quando vou á rua. Só não estou na situação de Setaro porque ainda tomo taxis (usando o desconto de 20% da Chame Taxi e da Salvador Taxi), vamos aos sábados ao cinema e comemoramos os aniversários em restaurantes.
E depois ainda falam mal do DIEESE, que está mais do que certo ao calcular o salário mínimo para os brasileiros sobreviverem. Posso falar de cátedra, quem não ganha pelo menos 4.000,00 no Brasil está passando fome! É claro que a turma do contra ataca nesta hora e quer reduzir minhas despesas e as do Setaro.
Afinal, porque ele vendeu o apartamento e gasta 1.100,00 de aluguel? Nós pelo menos temos apê próprio. Se não fosse isso estaríamos encostando no Z-4. É, realmente Setaro poderia ir morar em Valéria ou em Sussuarana, ou invadir um prédio do Programa Minha casa, minha vida. Pelo menos não iria pagar aluguel ou condomínio!
                                                                Adeus Veneza!

Quanto a mim poderiam dizer que não tenho nada que ajudar meu pai de 89 anos. Aliás, devia deixar que ele, como engenheiro que não se preocupou com o futuro, vivesse do salário mínimo de 545,00 que lhe paga o INSS. Se morresse até que o país economizaria pra gastar no Ministério dos Transportes.
Setaro poderia se casar e arranjar uma mulher que sustentasse a casa! Concordo que gasta muito com o plano de saúde. Podia contratar um cacete armado, cortar procedimentos, limitar-se a um hospital, o escambau. Por que fica exigindo assistência média de qualidade?  Aliás de quem é a culpa, dele ou da ANS que, chova ou faça sol, reajusta todo ano o plano destas pobres empresas? Recentemente, esta vetusta agência anunciou novos procedimentos a que os planos estarão obrigados. Pobre do Setaro vai passar mais fome pois é aumento na certa!
                    Quero ver quem vai ser o próximo a pedir dinheiro no Face Book, Cid Teixeira?

Empregada? Ora meu caro, na Europa ninguém tem maise se casam com brasileiras e africanas pra arranjar cama, mesa e roupa lavada. Só que há uma diferença, enquanto lá elas ganham mil euros só no emprego de “esposa potiche”, como o filme, aqui elas ficam mesmo é com 230 euros e pagos em real. Não vou nem falar que lá trabalham oito horas e aqui de sol a sol.
Sei que muitos vão objetar que eu e Setaro estamos comendo muito. Que é que eu posso fazer? Venho de família italiana onde fui criado com mainha dizendo
Coma coma figlio que te fa bene, coma coma pra engordar!
Sei que quem não tem grana comemora aniversário no botequim da esquina, e tenho que deixar de usar taxi e aderir de vez ao excelente serviço de ônibus de Salvador.
                                 Não adianta fazer essa cara Neto Coruja, o que digo é verdade!

Mas não posso encerrar este artigo sem uma mensagem auspiciosa, um final feliz que nos foi legado pela cultura Hollywoodiana, do qual a classe média tanto gosta. Não sei o Setaro mas estou perto de reduzir meus gastos. Quando o metrô estiver pronto (lá por 2050) vou poder reduzir meus gastos e, aliás, estou me aproximando da idade onde “desfrutarei” de redução de Imposto de Renda.
Acho que isso vai evitar que um dia desses vocês vejam o meu nome na Face book pedindo ajuda e reclamando como Elis Regina:
                                     Hoje eu sei que quem me deu a ideia 
                                     de uma nova consciência e juventude  
                                     está em casa guardado por Deus
                                      e contando o vil metal.  
                                                               

Nenhum comentário:

Postar um comentário