quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Foi numa tarde de domingo!

                             

Danilo Pereira é desportista e professor.

Foi numa tarde de domingo
que alguém perguntando por ela chegou
deixando meu coração tristonho,
enciumado, morrendo de amor.   
Eu falei, eu menti, eu chorei dizendo...

                                                 Jorge Ben

Jorge, seja como Ben ou como Benjor, tem muitas musicas que falam de futebol. A do Fio maravilha, a Umaraúma, e tantas outras. Um artista que ame o futebol não pode deixar sequer de falar dos domingos, o dia consagrado ao futebol, e particularmente de um domingo especial de que falaremos hoje.

Um estádio é muito maior do que seu espaço geográfico, todos tem o tamanho das historias que se  construíram ali dentro, das lagrimas que foram derramadas e dos abraços apertados que ali foram trocados, vou contar a memória de um jogo onde a Fonte Nova foi muito maior do que era, ou do que querem que seja. Neste domingo á tarde ela foi grande, imensa, do tamanho do amor da torcida do EC Bahia.

                                  O pessoal gritou horrores!


É uma das principais memórias que tenho das minhas idas a Fonte Nova e guardo na lembrança até hoje. Fiz esta crônica para dividir com vocês, já que ela permanece viva em minha mente, não pelas arquibancadas cheias, barulhentas, coloridas. Nela não há uma Ladeira da Fonte lotada desde o início da tarde, com as pessoas felizes em meio ao cheiro de cerveja e das camisas à venda.

Não há nem os amigos que só encontro no futebol, nem a tradicional confusão da entrada com os gritos e a energia que vem das arquibancadas. É alí, na inesquecível Fonte Nova, que viveu neste ano a sua primeira morte quando o governo a interditou face o desabamento do trecho das arquibancadas que tirou a vida de sete torcedores. Mas, que seja como for, viveu em 2007 alguns dos mais belos espetáculos dessa terra.

                     Os torcedores estavam assim, largados!

Esse era o primeiro domingo do mês de outubro do ano de 2007, um belo dia de sol que nos convidava a um passeio pela praia e depois nos reservava um espetacular pôr do sol, mas estávamos alí em meio ao sofrimento ainda acreditando que o tricolor se classificaria mesmo que isso parecesse impossível. Muita coisa tinha que acontecer pra que isso desse certo, a começar com o empate entre ABC e Rio Branco, e a terminar com a vitória do Bahia contra o Fast Clube, no jogo daquele dia.

As horas demoraram a passar nesse dia, e o jogo só começou às 18 horas.Parecia penitencia, nunca rezei tanto, nem chamei tanto a Deus com promessas que até hoje são cumpridas. No ônibus, sempre lotado em dias de jogo, desta vez sobravam cadeiras, os poucos que iam tentando explicar o porquê de ir a tal jogo.

O pessoal estava mesmo na praia!


Um deles me disse “é sempre melhor sofrer perto de quem ama”. Falo sofrer mesmo, porque o Bahia vinha dando a sua torcida uma serie de fracassos que tornaram a imensa e feliz nação, então na terceirona,  numa espécie de romeiros penitentes que vagavam pelos estádios a suportar descensos, derrotas fragorosas e todo tipo de humilhação que só quem ama poderia suportar.
Esse ano talvez tenha sido um dos mais tristes da historia do Bahia, o segundo ano na Terceira Divisão do campeonato Brasileiro. E olhem que se iniciou até tranquilamente. Vínhamos como o melhor time, o acesso parecia certo, era só esperar. Chegamos à penúltima fase como o favorito do grupo, empatamos a primeira, vencemos a segunda e a terceira partida, somamos sete pontos. Faltava pouco pra chegar na fase final e a tristeza era rapidamente esquecida, as lagrimas secavam e brotava até mesmo um tímido sorriso. Mais quatro pontos e estaríamos lá.

                                         Até Ele apareceu!

O time vinha de didas nos devolveram a triste realidade que vivíamos, um time que vagava guiado pelas direções ultrapassadas e que tinha perdido todo o seu brilho, nem sua ingênua torcida acreditava mais, restaram poucos com coragem pra ir naquele fim de domingo.
“Todo sofrimento é pouco pra quem ama” . Como se  não bastasse o jogo em si, ainda tínhamos que torcer para que o segundo melhor time do grupo não fazer um gol dentro do seu próprio estádio, fato que até o momento ainda não havia acontecido, enquanto esperávamos uma goleada na Fonte Nova contra o Fast Club. É claro que contávamos com uma ajudazinha da "mala branca".

                               Tinha era torcedor protestando!


Lá dentro vimos um estádio vazio, pessoas rezando em silêncio, solitárias, dividindo uma com as outras a sua própria dor, confortando e sendo confortados. Lá fora poderíamos encontrar em qualquer canto, um radinho ligado com alguém calado do lado, olhar perdido, ouvido atento guiado pelo locutor que ao passar do tempo embargava mais a voz, era só emoção.
O tempo passava e nada de gol. Rolou o intervalo e mais sofrimento. Chegou ao fim do tempo regulamentar o Bahia atacava e nada.  Só aos cinquenta minutos é que o lateral do bahia foi à linha de fundo e cruzou pra Charles botar pra dentro do gol. A essa altura o locutor narrava o que nem ele acreditava, repetindo outras vezes pra se certificar que era verdade embalando aquele inicio de noite.

 
               Só o super-herói Charles pra resolver naquele dia!

Aí não interessou a pequenez do público pois a Fonte Nova se expandiu de tal ponto que coube toda a cidade nela, vendo-se nas ruas um pedaço daquele estádio, que não é só concreto e grama, é um pouco de cada um que perde sua identidade pra ser mais um ponto colorido na arquibancada. Coube um pedaço da Fonte Nova em cada abraço.
Já não se diferenciava cidade e estádio, naquela noite tudo foi uma coisa só, e mesmo na Terceirona, com uma direção que em nada engrandeceu o clube, a torcida provou nunca mudará, é fiel ao seu time  mesmo longe, acredita mesmo sem querer. Nesse doce dia de outubro, a memória mais marcante não ocorreu centro do estádio, mas fora dele.

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